A aposentada Maria do Socorro Oliveira, 87, decidiu, há quatro anos, ingressar na Educação de Jovens e Adultos (EJA), em uma escola municipal de Fortaleza, para aprender a ler e escrever.
O machismo sofrido por parte do pai e, depois, do próprio companheiro privou a aposentada, durante 83 anos, de ter acesso à alfabetização. “Meu pai… A gente tinha era que trabalhar no roçado e tratando de animal, no interior, pra ajudar ele. Quando vim pra capital, foi pra trabalhar nas casas. Não podia estudar. No dia de me casar, só faltei morrer de vergonha: porque meu marido sabia ler e escrever, e eu fui botar o dedo”, relembra, referindo-se à assinatura por meio de impressão digital. A partir dali, seria o esposo o obstáculo ao letramento.
Liberdade
Aprender a ler e a escrever, então, foi sinônimo de liberdade. Em 2016, dois anos após a morte do marido, Maria do Socorro procurou a Escola Municipal José de Alencar, na periferia da capital cearense, no intuito de ocupar, nas noites de segunda a sexta-feira, uma das carteiras ocupadas pelas próprios filhos, quando pequenos. Era preciso saber juntar as letras e sílabas para compor os capítulos finais da própria história.
“Quando eu pedia pra estudar, meu marido dizia ‘não, Maria, tem que ficar é aqui mais as crianças, cuidar do comércio aqui fora’. Fiquei triste, mas não falei mais. Só que quando ele faleceu, eu vim.” Em 2020, ela completa quatro anos como estudante da instituição pública, com o mesmo brilho nos olhos do primeiro dia em que vestiu o uniforme e saiu com os livros embaixo do braço, rumo às aulas.
Caminhada difícil
O percurso, contudo, não tem sido fácil: para permanecer na sala de aula, a aposentada precisou driblar a perda de memória causada por um traumatismo craniano que sofreu. A causa foi uma queda durante os cuidados com um dos filhos, que tem esquizofrenia.
Depois disso, vieram as consequências de uma cirurgia para corrigir problemas na visão. Os olhos lacrimejam até hoje. Mas, segundo ela, “a força de vontade” foi maior que as barreiras.
“Eu quase não vinha mais estudar, ficava triste porque não me lembrava mais das coisas. Mas os próprios alunos tudim me dá valor. Eu não tenho vergonha de jeito nenhum, não tô estudando porque quero trabalho nem dinheiro. Tô estudando porque tenho vontade. Meu maior sonho é de aprender”, finaliza Maria do Socorro, com a sabedoria da experiência e uma curiosidade que transcende o tempo.