O Senado aprovou nesta sexta-feira (3) o projeto que flexibiliza algumas relações jurídicas privadas durante a crise do coronavírus. O texto foi analisado em sessão virtual e segue para a Câmara dos Deputados.
A proposta proíbe decisões de despejo liminares (provisórias) até 30 de outubro. A proibição só valerá para ações protocoladas a partir de 20 de março deste ano, quando foi decretado estado de calamidade pública no Brasil.
O texto proíbe o despejo apenas no início do processo, por força de decisão provisória. Desta forma, o despejo segue permitido em caso de decisão definitiva, na conclusão da ação.
“Nesse momento atual de restrição de circulação de pessoas, fica muito difícil que uma pessoa seja desalojada e consiga um outro local para alugar”, justificou a senadora Simone Tebet (MDB-MS), relatora do projeto.
A ação de despejo consiste na retirada, pelo proprietário, do inquilino do imóvel onde mora ou trabalha, motivado por alguns fatos, entre os quais a falta de pagamento do aluguel.
Hoje, a desocupação é permitida, dentro de 15 dias, nos cenários descritos a seguir. Caso o projeto vire lei, durante a crise do coronavírus, este despejo não poderá acontecer mesmo:
- com o descumprimento do acordo assinado por escrito e fechado entre o proprietário e o inquilino;
- em caso de demissão ou extinção do contrato de trabalho quando o aluguel do imóvel é vinculado ao emprego;
- se o sublocatário (aquele que aluga do primeiro inquilino e não diretamente do proprietário) permanecer no imóvel após a extinção do contrato;
- se, a partir da saída de algum fiador do negócio, o locatário não apresentar nova garantia dentro de 30 dias;
- caso termine o prazo de aluguel estabelecido no contrato de imóveis não residenciais, como o de estabelecimentos comerciais, por exemplo. Isso vale para contratos em que o imóvel seria retomado pelo dono em até 30 dias;
- no caso de não pagamento do aluguel, cujo contrato não possua nenhuma das seguintes garantias: caução (pagamento de alugueis adiantados), fiança, seguro de fiança e uso de fundos de investimento como garantia do pagamento.
A suspensão do despejo não está autorizada nas demais situações, como, por exemplo, locação para temporada para prática de lazer; retomada do imóvel após fim do contrato, para uso do proprietário, de seu companheiro ou dependente; e realização de obras aprovadas pelo poder público.
“O locador poderá retomar o imóvel nas hipóteses em que ele necessitar do imóvel para uso próprio ou familiar bem como nos casos de obras públicas ou de locação profissional”, esclareceu Tebet.
Inicialmente, o projeto, de autoria do senador Antonio Anastasia (PSD-MG), previa que se o inquilino fosse demitido ou sofresse uma redução do salário, ele poderia adiar o pagamento do aluguel em sete meses. As parcelas seriam negociadas e pagas a partir de 30 de outubro, na data do vencimento, com um acréscimo de 20% do valor mensal. Este trecho foi retirado pela relatora.
Motoristas de aplicativo
Uma emenda (sugestão de mudança no projeto) do senador Fabiano Contarato (Rede-ES) foi aprovada por 49 votos a 27 e passou a integrar o texto que seguirá para análise dos deputados.
De acordo com a emenda, durante o período da epidemia, as empresas de transporte por aplicativo, têm de reduzir 15% do lucro sobre o valor da corrida.
Essa diferença será repassada ao motorista. Caso queira, a empresa poderá aumentar este percentual em benefício do profissional. Segundo a proposta, não será permitido aumento do preço da viagem na tentativa de compensar a nova regra.
A novidade, pelo texto, também valerá para aplicativos de delivery de alimentos e de outorgas de táxi. Então, se atualmente a empresa retém 25% do valor da corrida ou do serviço prestado, passará a ficar somente com 10%. Os 15% restantes vão para o profissional que efetua e entrega.
“Tais motoristas têm sofrido adicionalmente, pois continuam a atuar independentemente das orientações de isolamento social. Estão sujeitos, portanto, a uma maior possibilidade de contaminação, haja vista a quantidade de corridas que perfazem ao longo dos dias. A mesma ideia é aplicável aos motoristas de aplicativos de entrega de comidas, remédios e afins e aos taxistas, que continuam precisando pagar suas licenças para rodagem”, explicou Contarato.
Atualmente, o Código de Defesa do Consumidor determina que o cliente pode desistir, dentro de uma semana, da compra de produto feita pela internet ou pelo telefone, de maneira remota. Esse prazo pode começar a valer a partir da assinatura do contrato ou do recebimento do produto ou serviço.
O projeto esclarece que este prazo não valerá para entrega a domicílio, conhecida como delivery, de produtos perecíveis, como comida, e também de medicamentos.
De acordo com a proposta, segue garantido o direito do consumidor de desistir da mercadoria se essa apresentar algum defeito, na hora em que receber o pedido.
Outros pontos
O projeto também:
- prorroga o mandato do síndico até o fim de outubro. Dá poder a ele para proibir festas e restringir a utilização de áreas comuns do condomínio para evitar a disseminação do coronavírus;
- regula assembleias virtuais em empresas e condomínios;
- restringe a contagem de tempo por usucapião para aquisição de imóveis;
- congela prazos de abertura e conclusão dos processos familiares de sucessão, partilha e inventários;
- determina prisão domiciliar para devedor de pensão alimentícia.