‘Não há evidência de imunidade de rebanho no Brasil’, afirma braço latino-americano da OMS

O braço latino-americano da Organização Mundial da Saúde (OMS) afirmou nessa terça-feira (14) que “não há nenhuma evidência de que a imunidade de rebanho possa ter sido atingida em qualquer parte do Brasil”.

A chamada imunidade de rebanho ocorre quando o percentual de pessoas imunes ao vírus em uma dada população é tão alto que impede que a doença siga circulando.

A afirmação foi feita por Marcos Espinal, diretor do departamento de doenças contagiosas da Organização Pan-americana de Saúde (Opas), da OMS, em resposta a um questionamento da BBC News Brasil.

Nos últimos dias, epidemiologistas e novos estudos passaram a sugerir a possibilidade de imunidade coletiva como explicação para a redução sustentada de novos casos de Covid-19 em áreas como São Paulo e Manaus, que sofreram com surtos graves de coronavírus e têm vivenciado momentos de reabertura e maior circulação de pessoas sem novos picos da doença.

“Em Manaus, o número de casos subiu rapidamente, não foram adotadas medidas drásticas de isolamento social, os mortos foram enterrados em valas comuns no pico, e logo em seguida o número de casos diminuiu. Qual a causa dessa rápida queda do número de infectados em Manaus? Teria a cidade atingido a imunidade de rebanho? Um modelo matemático demonstra que isso pode ter ocorrido, e talvez esteja ocorrendo em cidades como São Paulo”, escreveu o biólogo Fernando Reinach em sua coluna no jornal “O Estado de S. Paulo” no sábado.

De acordo com Espinal, seria necessário que algo entre 50% e 80% da população tivesse desenvolvido anticorpos contra Covid-19 para que a possibilidade fosse aventada.

Hoje, a OMS trabalha com uma taxa de prevalência de anticorpos em cerca de 14% da população da capital do Amazonas e pouco mais de 3% em São Paulo.

Imunidade de rebanho em xeque

Espinal questionou ainda o próprio conceito de imunidade de rebanho. “Os estudos mais recentes mostram que os anticorpos necessários para caracterizar imunidade de rebanho, aqueles que podem realmente destruir a doença, começam a desaparecer depois de três meses que a pessoa teve a infecção”, afirmou o diretor da Opas.

Especialistas ainda não sabem se, em contato com o vírus novamente, o corpo humano retomaria a produção dessas células de combate ao patógeno ou se a pessoa infectada antes pelo novo coronavírus poderia desenvolver um novo quadro de covid-19 no futuro.

Novas evidências indicam que o comportamento do novo coronavírus se assemelha mais ao do vírus da gripe, em que o infectado não desenvolve imunidade definitiva contra a doença. Uma nova infecção poderia ocorrer poucos meses mais tarde.

Indígenas 5 vezes mais atingidos

A Opas aproveitou para criticar, indiretamente, abordagem do governo brasileiro em relação à pandemia.

“Temos visto que mesmo em países que não tomaram medidas severas contra o coronavírus, como a Suécia, a prevalência de anticorpos é de 7%. Não é uma abordagem que recomendamos, porque o custo humano, social e econômico é muito alto”, disse Espinal.

Em coletiva de imprensa nessa terça-feira, a equipe latino-americana da OMS qualificou a região como “novo epicentro do coronavírus” no mundo e destacou que o continente é o segundo em números de casos e mortes, atrás apenas da Europa, onde a infecção começou meses antes.

De acordo com os especialistas, os grandes centros urbanos, como São Paulo, associados à desigualdade social vista nas favelas e áreas mais vulneráveis transformaram a América Latina em ambiente ideal para a propagação do novo coronavírus.

Carissa Etienne, diretora geral da Opas, citou os grupos indígenas brasileiros como exemplo da gravidade da situação. Segundo ela, eles têm sido atingidos com cinco vezes mais severidade do que a média da população do Brasil, que é o segundo país com mais casos da doença no mundo.

O tema tem gerado tensão entre os Poderes no Brasil. No sábado, o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes afirmou que as Forças Armadas estão se associando a um “genocídio”, ao comentar o modo como o Ministério da Saúde tem lidado com o assunto.

A pasta é comandado por Eduardo Pazuello, um general da ativa. Em nota, o Ministério da Defesa chamou a afirmação de Gilmar de “leviana”. E o vice-presidente Hamilton Mourão, general da reserva, cobrou um pedido de desculpas do ministro.

Fonte: BBC

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