O ministro da Economia, Paulo Guedes, entrega nesta terça-feira (21) ao Congresso a primeira parte da proposta de reforma tributária do governo, conforme havia antecipado na semana passada.
A previsão é que o próprio Guedes e o secretário da Receita Federal, José Tostes, compareçam ao Congresso no início da tarde para fazer a entrega da proposta aos presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
O projeto é a primeira “etapa” das mudanças a serem indicadas pelo governo para o sistema tributário brasileiro, considerado complexo demais por investidores internacionais.
Nessa etapa, a intenção é unificar os dois tributos federais sobre o consumo, PIS e Cofins, criando um Imposto de Valor Agregado (IVA) federal.
A alíquota do IVA federal deve ficar entre 11% e 12%, segundo as simulações. Essa unificação não requer mudanças na Constituição Federal e, por isso, tem uma tramitação mais fácil no Congresso.
A proposta da área econômica também mantém a base de arrecadação estável. Com isso, não atende ao pleito de ceder parte da receita desses impostos a estados e municípios.
Mais adiante, o governo deve propor novas mudanças no sistema tributário, englobando:
o Imposto Sobre Produtos Industriais (IPI), também incidente nas compras de bens e serviços. Ele deve ser tratado em outra fase da proposta e virar um imposto seletivo – que incide apenas em produtos específicos.
mudanças no Imposto de Renda;
retorno da taxação sobre a distribuição de lucros e dividendos
criação de um tributo sobre o comércio e os pagamentos em meio eletrônico, similar à extinta CPMF para desonerar a folha de pagamentos.
Esses pontos, que já foram levantados pela equipe econômica e debatidos em público nas últimas semanas, só serão levados ao Congresso na proposta seguinte, após o fim da pandemia.
Sem emenda constitucional
Para não esbarrar na Constituição Federal, o IVA a ser proposto terá de ficar restrito à arrecadação federal, sem mexer no Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS, estadual) e no Imposto sobre Serviços (ISS, municipal).
A unificação desses tributos só poderia ser feita com uma proposta de Emenda à Constituição (PEC), que exige quórum elevado para aprovação no Congresso. Mudanças mais simples podem ser feitas por projetos de lei ordinária ou complementar, ou por medidas provisórias.
Projetos de lei precisam ser aprovados por maioria simples, na Câmara e no Senado. Medidas provisórias têm vigência imediata, assim que publicadas, mas depois precisam ser confirmadas por ambas as Casas, também por maioria simples.
Já as propostas de emenda à constituição (PECs) precisam passar por dois turnos de votação na Câmara e Senado, com aprovação por três quintos dos parlamentares.
Manutenção da receita
A intenção do Ministério da Economia nessa primeira fase da reforma é manter intacta a base de arrecadação, conforme já informaram a assessora especial do Ministério da Economia, Vanessa Canado, e o secretário da Receita Federal, José Barroso Tostes Neto.
Com isso, a área econômica indicou que não aceitará a proposta dos secretários estaduais de Fazenda, encaminhada em setembro do ano passado ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), de que o governo federal reduza sua fatia na arrecadação da tributação sobre o consumo, com consequente aumento da parcela dos entes da federação.
O governo propôs, por outro lado, transferir mais recursos do petróleo aos estados e municípios.
Em novembro do ano passado, Vanessa Canado tinha afirmado que não é competência da União lidar com os tributos dos estados e municípios. E que, por isso, o governo não enviaria uma proposta envolvendo tributos estaduais e municipais sobre consumo.
Reforma difícil
Diferentes governos tentaram, sem sucesso, fazer a reforma tributária nas últimas décadas, focados principalmente na tributação sobre o consumo. As tentativas esbarraram em resistências regionais, partidárias e de diferentes setores produtivos, todos representados no Congresso Nacional.
A simplificação da cobrança de impostos é considerada por especialistas como fundamental para a retomada do crescimento econômico.
Analistas e investidores reclamam do elevado número de tributos e da complexidade do sistema tributário brasileiro, e avaliam que isso afasta investimentos. No caso do ICMS estadual, por exemplo, há 27 diferentes legislações vigentes no país.
Relatório “Doing Business” do Banco Mundial, de 2019, mostra que, entre 190 países no mundo, o Brasil manteve a 184ª posição no critério “pagamento de impostos”.
O Brasil continua sendo o país onde as empresas gastam mais tempo para calcular e pagar impostos: 1.958 horas por ano em média. Na Bolívia, que ocupa o penúltimo lugar, são 1.025 horas por ano. Na Argentina, o tempo médio é de 311,5 horas/ano. Já no México, o número cai para 240,5 horas/ano.
Tramitação no Congresso
A área econômica avalia que esse novo IVA federal sobre o consumo será compatível com as PECs em discussão no Congresso Nacional.
Isso significa que, se houver a posterior unificação com os impostos estaduais e municipais, o IVA poderá ser incorporado. Se não, pode seguir separado dos tributos estaduais (num modelo chamado “IVA dual”).
Atualmente, há duas propostas sendo discutidas pelo Congresso Nacional, na comissão especial da reforma tributária, formada por deputados e senadores. A proposta do governo também será enviada para essa comissão.
A primeira, de autoria do economista Bernard Appy, do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), prevê a substituição de cinco tributos (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) por um só, o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).
A segunda, tramitando no Senado, do ex-deputado Luiz Carlos Hauly, que prevê a substituição de nove impostos por um e cria um imposto seletivo.
Os textos em discussão no Congresso Nacional, assim como a proposta do governo federal, não reduzem a forte concentração da taxação sobre o consumo dos brasileiros, o que penaliza a parcela mais pobre da população.
Atualmente, a carga tributária brasileira sobre o consumo está bem acima da média da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o clube dos países ricos. Está também acima da carga vigente nos Estados Unidos.