A distância não é mais empecilho para os gêmeos fotógrafos cearenses Tomaz e Gabriel, que se reencontraram por meio de uma fotografia, em junho deste ano, após de 23 anos separados e sem notícias um do outro. Depois de uma saga que levou Tomaz até o município de Uberaba, em Minas Gerais, para reencontrar o irmão, os dois decidiram morar juntos. A viagem só de ida do fortalezense está prevista para a próxima segunda-feira (14).
Os 21 dias de convívio dos quais eles desfrutaram no primeiro semestre deste ano foram decisivos para a mudança. “Tive uma vivência totalmente diferente da vivência de um mero turista. Aos poucos, fui entrando no mundo dele, conhecendo amigos, conhecendo a cidade em si. Das coisas que mais me atraíram nela foram suas cachoeiras, o povo muito acolhedor e a possibilidade de estar mais próximo dos estados do Sudeste”, relata Tomaz.
Em Minas, Gabriel e a esposa Carol Polato partilham o mesmo sentimento. O tempo que os três passaram juntos representou uma realização antes imprevista. “Ter ele ao nosso lado, e ver os nossos amigos abraçando ele me fez sentir paz e grande felicidade. Era meu sonho ter ele comigo, darmos risadas, estar na presença dos amigos com a companhia dele, foi um sentimento que eu nunca tive”, conta Gabriel.
Com isso, a despedida tornou-se ainda mais difícil. “Quando éramos criança, a gente não tinha a noção de como era doloroso. Naquela época, o sentimento instintivo falava por isso. Mas, depois de adulto, ver essa separação acontecer é horrível”, explica Tomaz. Por isso mesmo, ele encontrou total apoio da família do Ceará para embarcar na nova aventura.
Planejamento
O plano agora é recuperar o tempo perdido. Tomaz, que até mês passado era funcionário do Museu da Fotografia Fortaleza, deve trabalhar, em Minas Gerais, com a cobertura fotográfica de eventos, uma de suas especialidades na área, e também com ensaios. Ele idealiza também a abertura de um estúdio.
Os irmãos acalentam ainda o desejo de morarem em Curitiba, mas isso só se concretizará após a formatura em Psicologia da esposa de Gabriel, prevista para 2021.
Em Uberaba, os mineiros aguardam o cearense com o sentimento de casa cheia, de preenchimento. “Ele é uma pessoa de luz e essa luz vai nos ajudar a enxergar e fazer com que sejamos pessoas cada vez melhores. Alguém para sorrir conosco, para compartilhar os momentos difíceis, para evoluir com a gente, era tudo o que nós precisávamos. E não poderia ser outra pessoa melhor senão o irmão gêmeo que eu sempre sonhei em ter ao meu lado”, comemora Gabriel.
Já Tomaz, que até junho sentia-se perdido, agora, se encontrou. E incentiva aqueles que buscam o mesmo. “Existe algo muito forte na gemelaridade, nós sentimos a existência um do outro. Isso foi fundamental para que pudéssemos nos encontrar. Mas, seja em qualquer situação, se há um sentimento e uma força para essa busca, nunca a abandone. A vida nos traz porquês que muitas vezes não conseguimos entender, mas, o tempo se encarrega de resolver”.
A vida em fotografias
“Desde a primeira foto que eu tirei aqui, nessas árvores, eu vi que a fotografia poderia ser uma coisa diferente na minha vida. Podia ser uma forma de eu demonstrar talvez um sentimento”, relata Gabriel sobre o Parque das Barrigudas, em Uberaba.
A infância dele, como a de quase todo mundo, está guardada em fotos. A do Tomaz também, em Fortaleza, a 2,6 mil quilômetros de Uberaba. “Quando eu estava com angústia, eu usava a fotografia pra dar vazão à angústia e me expressar”, afirma Tomaz.
“Desde os 14 anos ele é muito dedicado a fotos. Eu comprei uma câmera pra ele, ele ficou batendo foto, ele ia pra aniversário pra filmar, pra casamento pra filmar…”, conta a mãe de Tomaz, Socorro Maranhão.
“Desde que eu conheço o Tomaz — isso faz uns três anos –, tudo que ele faz na vida dele tem relação com a fotografia, ele tem uma maneira de se conectar com o mundo, com as pessoas, com o trabalho, com o que for através da fotografia”, diz a amiga Kely Pereira.
Atualmente Tomaz trabalha no Museu de Fotografia de Fortaleza. Entre outras coisas, ele acompanha projetos e faz produção das exposições. Circulando pelo museu, ele convive com cerca de duas mil obras de grandes fotógrafos do Brasil e do mundo. Mas ele teve a vida mudada por uma pequena foto caseira, velha e desbotada.
Início da busca
Os cearenses Tomaz e Gabriel foram separados ainda bebês, já que a mãe biológica, moradora da periferia de Fortaleza, não tinha condições de criá-los. O primeiro foi entregue a Maria do Socorro aos 15 dias de vida. O segundo, levado com sete meses por uma família de Uberaba, em Minas Gerais. Desde então, não se viram mais.
A mãe adotiva revelou a Tomaz sobre a adoção quando ele tinha cinco anos, falando, inclusive, sobre a existência do irmão gêmeo. A esperança do encontro surgiu aos 16, após a mãe biológica entregar-lhe uma fotografia do primeiro aniversário de Gabriel com a família mineira.
“Aí ele entrou em busca do irmão, mas, inclusive, não teve sucesso. Ele passou muito tempo procurando Gabriel, mas não encontrava. Ele chorava bastante, muitas noites, eu acordava, e ele estava chorando”, lembra Maria.
A foto do aniversário de um ano do irmão, adotado em Uberaba, foi entregue há sete anos pela mãe biológica dos meninos. “Ela deu a foto do Gabriel pra ele. Aí ele entrou em busca do irmão dele”, conta a mãe, Socorro.
“Eu também fui criado sempre sabendo que eu era adotado e que eu tinha um irmão gêmeo”, esclarece Gabriel. O que Gabriel não sabia era que Tomaz procurava por ele, buscando nas redes sociais por sete anos, sem sucesso. Até que no início deste mês Tomaz percebeu que tinha outra pista para achar o irmão.
“Eu já sentia muita falta, mas no dia primeiro de junho foi marcante, essa falta foi mais dolorosa. Passei mal, senti muita angústia e lembrei que na foto que eu tinha recebido tinha o nome da mãe dele. Encontrei o perfil deles no dia primeiro, mas não entrei logo em contato porque me vieram várias questões: se ele sabe, se a mãe tinha contado.”
“Fui passando e olhando as fotos até que encontrei uma foto dele. Nossa, era eu! Eu olhei e disse: ‘Meu Deus! Sou eu’.” Depois disso, Tomaz contou a descoberta para familiares e amigos, e foi em busca de entrar em contato com o irmão gêmeo.
O reencontro
Por meio de redes sociais, ele enviou uma mensagem a Gabriel: “Nasci em 1997 e, aos 15 dias de vida, fui separado de um ser que faz parte de mim. A minha vida foi por uma busca.” Eles passaram então a se falar todo dia pela internet, ainda separados por 2,6 mil quilômetros de distância. Mas Tomaz ainda tinha planos para reduzir essa distância.
A Carol, mulher do Gabriel, e o Tomaz tinham combinado tudo com um terceiro fotógrafo, para promover um encontro surpresa. “Ele mandou uma mensagem pro Gabriel dizendo que tinha um trabalho fotográfico pra receber uma pessoa lá no aeroporto. E o Gabriel acreditou nessa história. Então pra ele, ele estava [indo ao aeroporto, onde encontrou o irmão] a trabalho”, explica Carol.
Eles se encontraram na noite de quarta-feira (24), no aeroporto de Uberlância. “Na hora em que eu vi ele, parecia que eu estava numa montanha russa. Deu um frio na barriga! Abracei ele, dei o abraço que eu sempre sonhei em dar no meu irmão, desde criança, desde a infância.”
No dia seguinte ao primeiro encontro dos gêmeos, dona Vanda, a mãe do Gabriel, recebe Tomaz, o outro aniversariante do dia. Os dois irmãos têm finalmente a primeira festa de aniversário juntos. O encontro repercutiu pela cidade de Uberaba.
Durante a festa e comemoração, Tomaz pensou ainda em outra pessoa, que não estava presente, a mãe biológica. “O ato de ela me entregar pra adoção foi um ato heroico, um ato de uma mãe que realmente ama o filho, que quer ver ele bem. Ela entregou o próprio filho pra ele poder sobreviver.”
Separados durante 23 anos, eles agora se divertem juntos, com direito a andar com as roupas, os óculos e as máscaras iguais, como os gêmeos costumam fazer numa infância que os dois não tiveram.
“Todo mundo tem um sonho material, um sonho de alcançar, objetivos, mas esse sonho que eu tinha de conhecer meu irmão gêmeo está muito além disso”, diz Gabriel.
“Eu encontrei aquilo que me fazia falta a vida inteira, que era ter ele, poder conhecer, eu me sinto completamente realizado, aos 23 anos de idade. O que eu mais consigo falar nesse momento é que eu me sinto realizado”, responde Tomaz.