O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) determinou que uma criança de 8 anos, adotada há seis, seja devolvida à avó paterna. A decisão, já em segunda instância, foi no dia 20 de novembro. A família adotiva entrou com recurso, que será julgado no dia 11 de fevereiro de 2021.
Enquanto isso, a criança, que terá a identidade revelada, continua morando com o casal que a adotou em 2014.
De um lado, a família adotiva, representada pela advogada Larissa Jardim, disse que, na época dos trâmites para adoção, várias denúncias foram feitas contra a família biológica e esses seriam os motivos para que a criança fosse para o acolhimento.
“Eram no sentido de negligência, maus-tratos, mãe usava drogas ilícitas e álcool. A criança não era bem alimentada, condição precária de higiene. A mãe a expunha a homens aos quais ela se relacionava. Deixava a criança sozinha com eles. A avó chegou a dizer, na época, que era até melhor ela ser adotada porque não estava bem cuidada”, contou a advogada.
Ainda segundo a advogada, o pai biológico da criança foi condenado pelo homicídio do próprio pai. “Homicídio torpe, por motivo de herança”, disse a advogada.
De outro lado, a avó paterna da criança, que propôs a ação de guarda em 2015, contou que, mesmo no período em que a menina morava em um abrigo, ela nunca deixou de ir visitá-la. A intenção, disse ela, era “mostrar que a vovó estava com ela para sempre”.
A avó da criança, de 62 anos, mora sozinha em uma cidade na Região Central de Minas Gerais. A reportagem não vai divulgar o nome dela nem o local onde mora para manter o anonimato da menina.
“Estou morrendo de saudade, ela é tudo o que tenho. Minha única neta. Quero ela aqui em casa, no quartinho que já está pronto esperando ela chegar. Enquanto eu não conseguir, não terei sossego”, contou a idosa.
O Tribunal de Justiça de Minas Gerais informou apenas que os processos envolvendo crianças e adolescentes são protegidos por segredo de Justiça.
‘Justiça foi injusta’
Segundo a idosa, desde que a neta foi adotada, há seis anos, as duas nunca mais se encontraram.
“Essa adoção foi de um jeito estranho, nunca nem vi esse casal, nunca me deixaram ver a menina, perdi contato completamente. Desde o início eu procuro meus direitos para ter minha neta de volta”, disse a avó, para quem “a Justiça foi injusta”.
“Todo mundo sabia que eu queria a menina, sou responsável. Justiça foi injusta. Ela é doida comigo, tenho certeza. Só quero minha neta”, disse ao G1.
O pai da menina está em liberdade e, segundo a aposentada, ele mora em outra casa e, não teria condições de cuidar da filha. “Ele falou para o advogado que passa a guarda pra mim sem problemas”.
A avó não deu detalhes sobre a mãe da criança. Disse apenas quem ela “sumiu”. O que ainda se mantém presente é a saudade da neta:
“Minha neta é meu coração. Quando era bem pequena ela ficava muito aqui em casa, dava banho nela, comidinha. Ela é tudo para mim”, disse a avó.
‘Precisamos ser fortes’
“Eu também vou lutar. Precisamos ser fortes”, foi assim que a menina de 8 anos respondeu à mãe adotiva quando soube da possibilidade de ser devolvida para a avó biológica, segundo a advogada que representa a família, Larissa Jardim. Elas estavam em uma apresentação de balé quando a advogada ligou para os pais e deu a notícia.
A família não quis dar entrevista, mas, segundo a advogada, desde 2015 eles vivem na insegurança.
“O registro de nascimento da garotinha ainda tem o nome dos pais biológicos, então toda essa espera foi de muita expectativa para decisão final para que, aos olhos da lei, ela seja reconhecida como filha deles”, disse a advogada.
Larissa contou ainda que a família está indignada com a decisão da Justiça, mas “se apega na fé”.
“É uma família linda, de muita fé, a menina é totalmente adaptada, muito amada. Muito comunicativa, muito querida pelos avós, pelos tios. Ela realmente é filha do casal em todos os sentidos da palavra”, defendeu a advogada.
Controvérsias da decisão
A presidente da Comissão da Adoção do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), advogada Silvana do Monte Moreira, criticou a decisão do Tribunal de Justiça porque, segundo ela, não teria seguido as orientações do Sistema Nacional de Adoção, vinculado ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
“Precisamos que o judiciário deixe de privilegiar laços de sangue e passe a cumprir o artigo 227 da Constituição Federal. A revogação da guarda e retirada imediata da criança da família adotiva, a única que conhece e onde é cuidada, para ser entregue à avó paterna após seis anos, a desconsidera como sujeito de direito e a trata como objeto do biologismo”, disse Silvana.