Atualmente técnico do Grêmio, Renato Gaúcho por muito pouco não foi jogador do São Paulo, adversário na semifinal da Copa do Brasil, nesta quarta-feira, às 21h30 (de Brasília).
A história começou em fevereiro de 1997, quando o atacante decidiu ficar no Rio de Janeiro e não se apresentou ao Fluminense para a pré-temporada em Caxambu, no sul de Minas Gerais, devido a uma dívida do clube carioca. Nisso, a Federação Paulista de Futebol (FPF) passou a tratar diretamente com o jogador, com 34 anos.
“Com o tempo vai se criando uma história que não é verdadeira. Foi algo simples. Começou com uma ação da Federação Paulista de Futebol para promover o Paulistão de 97. Ela ia doar por um temporada um grande jogador disponível no mercado para cada grande time e pagar os salários”, explicou Fernando Casal de Rey, presidente do São Paulo à época, ao ESPN.com.br.
O ex-dirigente diz que o clube era contra a iniciativa no começo, mas mudou de ideia por causa da insistência do presidente Eduardo José Farah, da FPF.
“Seria deselegante sermos os únicos que não queriam. Eu disse que estávamos com o time organizado e o treinador [Muricy Ramalho] não ia querer um jogador que poderia até desagregar. Aí, ele ofereceu o Renato, que além de tudo é um grande marqueteiro e ia movimentar. Ele fez esse pedido de que seria uma deselegância, que não teria problema. Caso não desse certo, o custo para o clube seria zero”, disse.
Após a competição, o São Paulo poderia continuar com o jogador, mas teria que arcar com os custos.
“Eu falei que tudo bem, mas ele não é obrigado a ser escalado. O Farah disse que não tinha problema, o lance seria promover a chegada dele em São Paulo que geraria uma certa curiosidade”.
Renato, que estava se recuperando de uma cirurgia no joelho direito que o afastou do futebol por dez meses, chegou ao Tricolor com ampla cobertura da mídia. Antes da apresentação, ele tomou um café com o presidente do clube, que deixou claro em uma conversa educada as condições que estava aceitando o negócio. A pedido do cartola da federação, o clube promoveu uma recepção no Morumbi com direito a coquetel para os jornalistas.
Até então tudo parecia normal. Apesar de não ter ainda assinado contrato com a federação – o salário combinado era de R$ 80 mil por mês – ou ter feito exames médicos, Renato foi apresentado como reforço e recebeu o número 7, que pertencia ao colombiano Aristizábal no Estadual. O primeiro indício de que a situação estava estranha foi quando o jogador apenas segurou a camisa no peito e optou por não vesti-la.
Durante as respostas da entrevista coletiva, o atacante afirmou que só assinaria o contrato após passar por todos os exames e estar em condições de jogo. Disse que teve ofertas de Atlético-MG e Flamengo, mas escolheu o São Paulo e não teria problemas para se adaptar a capital paulista. Contou que estava com o joelho recuperado e poderia jogar normalmente.
“O evento teve uma repercussão interessante na hora. E o Renato ficou de se apresentar no dia seguinte para começar os exames médicos e todo procedimento para ser jogador do São Paulo. Ele estava sem jogar e vinha treinando na praia, eu acho. Terminou todo mundo bem”, contou Casal de Rey.
O jogador ainda confirmou que o Fluminense fez uma nova oferta para que ficasse nas Laranjeiras. Isso ligou o sinal de alerta no clube do Morumbi. “Vou buscar minhas coisas e volto na segunda ou terça-feira”, se limitou a dizer Renato durante o evento.
Fato é que ele nunca mais retornou nem sequer deu satisfações ao São Paulo.
“Pensamos que teria algum contratempo ou com a mudança do Rio para São Paulo. Depois, fomos procurar saber o que tinha acontecido. E vimos a manchete: ‘Renato se apresenta no Fluminense para assinar novo contrato’ (risos). Simples assim. Eu liguei para a federação, que achou um absurdo [a atitude de Renato]. Disse que eles tinham que cobrar algo dele ou esquecer o assunto, o São Paulo não tinha nada a ver com isso. A gente participou para não ser o diferente ou desmancha prazeres da iniciativa. Havia um certo desgaste anterior com a federação”, explicou Casal de Rey.
O clube das Laranjeiras prometeu quitar as dívidas com o atacante, que reclamava cerca de R$ 1,3 milhão em atrasados. De volta, Renato Gaúcho sofreu com lesões nos meses seguintes e se transferiu ao Flamengo, durante o Campeonato Brasileiro.
“Os jogadores do Rio algumas vezes se adaptam mal em São Paulo porque a vida é completamente diferente. Ainda mais para ele que tinha o lance de praia, futevôlei. Ele era um ídolo, talvez aqui não fosse tanto. Eu até entendo o Renato, mas ele teve uma atitude desse naipe. Ele simplesmente não falou nada e não apareceu”.
“Para a gente o assunto encerrou e não procurei o Renato porque ele não fazia parte dos nossos planos. O perfil dele não era o nosso. Tentamos colaborar com a federação porque o campeonato precisava de promoção. Foi uma tentativa e não deu certo”.
De acordo com Fernando Casal de Rey, a situação ficou em aberto. Os jornais da época relataram que o São Paulo quis contratar Edmundo, mas no fim fechou com outro jogador.
“Farah falou para escolher alguém. Eu pedi um tempo para pensar e me interessou o Carlos Miguel [campeão da Libertadores pelo Grêmio em 95], que estava no Sporting [em janeiro de 1998]. O Farah topou nos ajudar e disse que não teria ter um décimo da badalação do outro, mas era o que tinham. Ele deu muito certo, foi campeão paulista em 1998 e foi muito útil. Tanto é que o contratamos depois”, disse.
Apesar de não ter recebido qualquer tipo de satisfação, Casal de Rey garante não ter mágoa de Renato.
“Pena que não foi para frente poderia ter isso até bom como promoção para o campeonato. Ele ainda jogava futebol razoavelmente bem, não como nos áureos tempos, mas nunca desaprendeu. Não foi uma marca negativa”, finalizou.