MPF pede condenação de delegado acusado de sequestrar ex-oficial da Marinha durante a ditadura militar, em 1971

Caso a Justiça aceite o pedido, esta poderá ser a primeira vez que um ex-agente da ditadura militar é condenado no Brasil pela perseguição política no período.

Memorial da Resistência/ Divulgação

Prédio onde funcionou o Dops, em São Paulo

O Ministério Público Federal (MPF) em São Paulo apresentou à Justiça as alegações finais que reforçam o pedido de condenação do delegado Carlos Alberto Augusto pelo sequestro durante a ditadura militar do ex-fuzileiro naval Edgar de Aquino Duarte, desaparecido desde 1971.

Caso a 9ª Vara Criminal Federal de São Paulo aceite a recomendação, esta poderá ser a primeira vez que um ex-agente da ditadura militar é condenado no Brasil pela perseguição política no período.

Carlos Alberto Augusto foi delegado do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) Carlos Alberto Augusto, sob o comando de Sérgio Fleury.

Segundo o MPF, das 48 denúncias oferecidas nos últimos anos contra integrantes de órgãos da repressão, apenas três resultaram na instauração de ações penais.

Até 2015, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, ex-comandante do Destacamento de Operações de Informações do II Exército (DOI-Codi) em São Paulo, também respondia pelo crime contra Duarte, mas deixou ser réu na ação após seu falecimento.

O mesmo ocorreu com o ex-delegado Alcides Singillo, que morreu em 2019 e, por isso, foi excluído do rol de acusados. O caso teve ainda a participação de outras pessoas que, em 2012, quando o MPF ofereceu a denúncia, permaneciam não identificadas ou também já haviam falecido, entre elas o ex-delegado Sérgio Paranhos Fleury.

O MPF afirma que o desaparecimento de Duarte enquadra-se na categoria de crimes contra a humanidade, “uma vez que ocorreu no contexto do ataque sistemático e generalizado que o Estado empreendeu contra a população brasileira durante a ditadura militar”.

“Não cabe anistia aos autores do delito. O Brasil já foi condenado duas vezes pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) por deixar de investigar e punir os agentes envolvidos em crimes políticos cometidos no período.”

Sequestro

A promotoria afirma que Duarte foi preso no dia 13 de junho de 1971, sem qualquer ordem judicial que embasasse a ação. Segundo o MFP, ele trabalhava, à época, como corretor da Bolsa de Valores de São Paulo e já não tinha nenhum vínculo com grupos de oposição à ditadura. Expulso da Marinha em 1964 em decorrência do Ato Institucional nº 1, ele havia deixado a militância política desde que retornara do exílio, em 1968.

O ex-fuzileiro naval teria entrado no radar das autoridades após ter seu nome citado no depoimento de José Anselmo dos Santos. Preso dias antes de Duarte, o Cabo Anselmo hospedava-se no apartamento do ex-colega de Marinha e viria a se tornar um agente infiltrado dos órgãos de repressão, sob supervisão de Carlos Alberto Augusto.

O MPF afirma que Augusto participou diretamente da ação que resultou na prisão de Duarte e sua condução ao DOI-Codi. A detenção foi mantida sem comunicação judicial pelos dois anos seguintes.

Neste período, a vítima teria sido sucessivamente transferida entre a unidade comandada por Ustra e o Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo (Deops/SP), onde Augusto e Singillo integravam a equipe de Fleury. Duarte foi visto por testemunhas pela última vez em junho de 1973.

Sem provas ou registro de seu óbito nem informações sobre seu paradeiro, o ex-oficial da Marinha permanece formalmente sequestrado até hoje.

Aumento da pena

O MPF pede que Carlos Alberto Augusto seja condenado por sequestro qualificado, e que a pena seja cumprida em regime fechado, sem a concessão de benefícios. Além da prisão, há também o pedido para que Augusto seja punido com a perda do cargo de delegado.

“Possuindo ao seu lado todo o aparato estatal, e fazendo mau uso dessa estrutura que deveria ser voltada à defesa dos cidadãos, o acusado agiu como se estivesse acima da lei, da sociedade e da vida humana, motivo pelo qual o aumento da pena em virtude da ação delitiva se faz necessário. Fazendo parte de um grupo de sádicos predadores, a aplicação da lei não pode ser branda”, afirmou o procurador da República Andrey Borges de Mendonça, autor da manifestação do MPF.

Fonte: G1

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