Todo torcedor do Palmeiras certamente guarda um carinho especial pelo lateral-direito Fabiano Leismann. Afinal, ele foi o responsável pelo gol do título do Campeonato Brasileiro de 2016, anotado sobre a Chapecoense, além de ter feito também outro tento histórico do Verdão: o da vitória por 3 a 2 sobre o Peñarol, pela Conmebol Libertadores de 2017, aos 54 minutos (sim, 54!) do 2º tempo.
Hoje com 29 anos, o catarinense está jogando pelo Aris, equipe tradicional da Grécia, dando sequência à sua aventura no futebol europeu, que já teve passagens por Boavista, de Portugal, e Denizlispor, da Turquia, nas últimas temporadas.
A mudança para o “Velho Continente” aconteceu em 2019, após Fabiano retornar ao Palmeiras de um período de empréstimo no qual fez sucesso no Internacional. Uma conversa “olho no olho” com Luiz Felipe Scolari, então técnico palestrino, vez o lateral (que também atua como zagueiro) perceber que era a hora de respirar novos ares no futebol.
“Por ter feito uma boa temporada por empréstimo no Inter, eu queria ter continuado lá, mas acabou não dando certo. Eu achava que seria importante para a minha carreira. Mas voltei ao Palmeiras e continuei treinando forte, apesar de não ter oportunidades”, lembrou o atleta, em entrevista ao ESPN.com.br.
“No meio de 2019, eu fui para Portugal jogar no Boavista, porque via que era um mercado que poderia abrir várias portas para mim. O treinador do Palmeiras na época era o Felipão. Ele e o (auxiliar) Paulo Turra me falaram que seria muito bom eu ir para Portugal e fazer sucesso lá”, contou.
“Eles foram bem diretos comigo e disseram que não iriam dificultar em momento algum (a saída para a Europa). Era um mercado bom e resolvi aproveitar a oportunidade. E foi uma escolha muito boa ir para a Europa aos 28 anos, em um campeonato muito disputado. Aprendi muito lá, pois é muito diferente do Brasil. A intensidade dos treinos e jogos era muito grande, e o futebol era muito tático”, explicou.
Em uma temporada pelo Boavista, Fabiano realizou 28 partidas, contribuindo com duas assistências. Na sequência, vieram várias outras propostas de clubes europeus, e ele acabou escolhendo atuar pelo Denilizpor, da Turquia, por um motivo bastante curioso.
A equipe turca vinha sendo treinada pelo ex-meio-campista croata Robert Prosinecki, que nasceu na Alemanha e só se mudou para a então Iugoslávia quando tinha 10 anos. Por isso, ele fala alemão fluente… Assim como Fabiano, que foi criado em uma pequena cidade de 6 mil habitantes de colonização alemã e fala o idioma teutônico.
“Um ano depois de chegar ao Boavista, eu fui para a Turquia. Tinha também ofertas da França e da Suíça, mas optei pela Turquia porque o treinador falava alemão e espanhol. Ele me ligou por conversa de vídeo e mostrou que a equipe tinha jogadores portugueses, colombianos, chilenos. A oferta me interessou pelo fato do treinador me querer. No fim, era o Robert Prosinecki, que jogou por Real Madrid, Barcelona e vários outros times grandes. A gente falava em alemão, não teve qualquer problema. A Turquia tem um idioma muito difícil, mas, com o Prosinecki não tinha problema. Isso pesou na minha escolha”, relatou.
“Eu não lembrava dele jogando, pois eu era criança, mas todos sempre me falaram que ele era um atleta de muita qualidade. Foi uma experiência ótima trabalhar com ele. Nos treinos ele pedia para a gente trabalhar da mesma forma que íamos jogar e exigia muita qualidade no passe. Quando alguém tentava fazer algo muito absurdo, ele parava o treino na hora e pedia o mais simples (risos). Exigia sempre muito dos atletas”, salientou.
“Nesse time também tinha o zagueiro Subotic, ídolo do Borussia Dortmund. Eu falo um dialeto do alemão diferente do dele, então a gente tinha um pouco de dificuldade para comunicar, mas dava para manter um diálogo. Depois, aprendi inglês e resolveu de vez qualquer problema”, complementou.
No Denizlispor, Fabiano fez muito sucesso, disputando quase todas as partidas da temporada e atraindo a atenção de outros mercados na sequência.
“Apareceu a chance de vir jogar na Grécia, com um contrato de três anos no Aris. É um clube de torcida apaixonada e que briga na parte da frente da tabela, com muitos jogadores de qualidade”, exaltou.
“Estou jogando com o Dênis, ex-goleiro do São Paulo, com o Lucas Sasha [ex-Corinthians] e vários argentinos, como Iturbe e Bertoglio, além do Mitroglou. É uma equipe de qualidade e de torcida intensa. Eles são apaixonados e exigem bastante da gente, mas esse clima faz uma diferença muito grande. É muito bom ter os estádios cheios outra vez. Além disso, a cidade é muito bonita para morar. A Grécia é linda de visitar e trazer a família. Vou tentar retribuir a confiança em campo sempre da melhor maneira possível, e esperamos colher bons frutos na temporada”, discursou.
O lateral-direito, aliás, teve a chance de retornar ao futebol brasileiro após a passagem pela Turquia, mas optou por seguir na Europa.
“Alguns times do Brasil tiveram interesse em mim, mas deixei bem claro que tinha vontade de continuar na Europa depois de duas boas temporadas aqui, era minha escolha pessoal e profissional. Quando veio essa chance do Aris, falei com meus empresários e disse que era o que eu queria, aí demos sequência. Meu estilo de jogo casa bem com a Europa, e estou muito motivado com esse novo desafio”, afirmou.
A chegada ao Palmeiras
Fabiano foi contratado pelo Palmeiras em 2016, em uma grande troca de atletas com o Cruzeiro. Sua chegada foi um pedido do técnico Cuca, que queria reforçar a ala direita, posição bastante carente no Palestra Itália no período – tanto é que o volante Jean atuava improvisado no setor na maioria das vezes.
“Na época eu fui um pedido do Cuca, que queria ter um lateral com características mais defensivas. Na Chapecoense, eu também já tinha atuado até como zagueiro, então encaixava bem. O Alexandre Mattos tinha me contratado no Cruzeiro, então foi tudo muito rápido, e eu fui emprestado em 2016 ao Palmeiras”, relembrou.
Logo que chegou ao novo clube, o jogador foi surpreendido com a forte “previsão” de Cuca, que falou publicamente que o Verdão seria campeão do Brasileiro naquele ano.
“Eu cheguei ao Palmeiras me recuperando de lesão. O time estava em Atibaia fazendo uma intertemporada porque tinha sido eliminado do Paulista. O Cuca disse de cara que a gente seria campeão brasileiro e foi meio que um choque. Sabíamos a responsabilidade que era vestir a camisa alviverde, sabíamos a cobrança e sabíamos que não seria fácil. Nosso grupo estava em formação, mas tínhamos uma confiança muito grande do treinador. Além disso, o elenco era bom, com uma mescla de vencedores, como Zé Roberto, Fernando Prass, Jean e Edu Dracena, outros querendo seu espaço e alguns jovens muito bons também”, exaltou.
Entre os garotos, o lateral destaca especialmente o atacante Gabriel Jesus, que fez um grande Brasileirão e foi vendido ao Manchester City logo após o título.
“Era um garoto que tinha subido da base e já estava há algum tempo no profissional. Na época, ele ainda era visto como promessa, mas, nos treinos, já dava para notar a diferença que ele fazia e a qualidade que tinha. Era muito dedicado e esforçado, e possuía uma força física absurda para a idade dele. A impulsão era ótima, e o um-contra-um dele na velocidade era fatal”, recordou.
“Além disso, ele atuava tanto como ponta ou centroavante, e isso ajudou muito e fez a diferença no decorrer do campeonato. Ele dava muito trabalho às defesas adversárias e se dedicava mais e mais a cada treino. O Jesus ainda nos ajudava muito na fase defensiva, se dedicava 100%. A gente sabia que, com aquela personalidade, aquela qualidade e aquele desejo de vencer, ele iria brilhar no futebol europeu logo depois. Já era possível ver nos treinos e jogos. Ele fez uma diferença enorme naquele ano”, observou.
Fabiano entrou em sete partidas do Campeonato Brasileiro e ficou muito marcado pelo único gol que marcou, na penúltima rodada, contra a Chapecoense, seu ex-clube.
Afinal, o tento garantiu a conquista do título nacional pelo Palmeiras, acabando com um jejum de mais de duas décadas na competição.
“Quis o destino que meu gol fosse contra a Chape, time pelo qual tive passagem muito bonita, com dois acessos e uma conquista de Estadual. Em 2014, fui o 3º melhor lateral do Brasileirão jogando lá. Por tudo isso, já seria um jogo especial contra eles. Mas esse, por valer o título do Brasileiro, era ainda mais”, relembrou.
“A gente sabia que seríamos campeões com uma vitória. A semana foi toda diferente, a gente trabalhou muito a parte mental, pois sabíamos que teríamos que estar focados. O Cuca sempre gostava de ensaiar jogadas, e toda semana ele bolava alguma diferente. Ele sempre deixava claro ao grupo que, para a gente ser mais competitivo, era importante ter jogadas ensaiadas que fizessem a diferença”, contou.
E foi justamente em uma das jogadas boladas por Cuca que saiu o gol de Fabiano, batendo da entrada da área para encobrir o goleiro Danilo.
“A jogada do nosso gol foi uma que a gente sempre trabalhava. Havia variações, e a bola poderia ter ido para os outros atletas que estavam na área. Mas eu estava no lugar certo na hora certa e aproveitei. Esse gol nos deu o título e ficará marcado para sempre na minha história e também dentro do clube, que não vencia o Brasileiro há 22 anos”, festejou.
“Tive uma passagem bonita pelo Palmeiras e consegui ajudar a escrever a história lá. Depois do jogo, todo mundo me abraçou e me deu os parabéns pelo gol. Ficamos todos muito felizes de ser campeões com a camisa do Palestra”, celebrou.
O gol heróico fez Fabiano ir de “ilustre desconhecido” a “ídolo instantâneo” entre os torcedores alviverdes.
“Mudou muito minha relação com a torcida depois do gol. Jamais imaginei que as coisas mudariam tanto. Quando eu cheguei ao Palmeiras, não tive muitas oportunidades, até porque o Jean estava muito bem, mas, nas oito rodadas finais, eu entrei bastante. Passei a ser bastante utilizado e procurava fazer sempre o meu melhor, porque as chances estava aparecendo, e eu sabia que precisava estar pronto para quando precisassem de mim”, relatou.
“Depois do gol do título, assim que eu saía na rua ou ia ao shopping ou a algum restaurante, imediatamente vinha alguém comentar comigo sobre o lance. É algo que vai ficar para sempre marcado para mim. Aonde quer que eu fosse recebia o carinho dos torcedores e tirava muitas fotos. Até mesmo em férias fora do Brasil ou quando joguei em Portugal as pessoas vinham falar comigo, pois a torcida do Palmeiras é enorme e esta´espalhada pelo mundo inteiro”, salientou.
O gol contra o Peñarol
Em 2017, Fabiano ganhou muita moral com o técnico Eduardo Baptista, que chegou para substituir Cuca, e atuou bastante, principalmente no início da temporada.
Ele ficaria marcado por fazer o gol da emocinante vitória por 3 a 2 sobre o Peñarol, no Allianz Parque, pela fase de grupos, em uma cabeçada histórica aos 54 do 2º tempo.
“Foi um dos gols mais marcantes da minha carreira, porque foi depois de quase 10 minutos de acréscimo! A gente sabia que dentro de casa precisava da vitória de qualquer jeito, porque Libertadores é sempre difícil. Aquela partida foi muito complicada, pois eles catimbaram muito. Além disso, o Dudu tinha sido expulso e estávamos com um jogador a menos”, lembrou.
“Aos 53 do 2º tempo, o goleiro deles fez uma defesaça e mandou a bola para o escanteio. A gente sabia que seria o último ataque da partida. Aí veio o cruzamento da esquerda, eu subi e fiz o gol no lance seguite. Foi algo muito marcante para todos nós”, emocionou-se.
A comemoração dos torcedores foi intensa e é recordada até hoje por Fabiano.
“O Allianz Parque explodiu! Os torcedores enlouqueceram, e todo o time comemorou muito comigo. Sabíamos que era um jogo decisivo, e vencer em casa na Libertadores é sempre fundamental. Além disso, na partida já tinha acontecido muita coisa, muita catimba deles, e isso mexe demais com o emocional dos atletas”, explicou.
O Palmeiras ainda faria mais um jogo memorável contra o Peñarol neste Libertadores, vencendo por 3 a 2 de virada em Montevidéu, após sair perdendo por 2 a 0.
A partida ficou marcada pela briga feroz ocorrida entre os atletas dentro de campo, e que quase terminou em tragédia depois que torcedores ameaçaram invadir o gramado e o setor ocupado pelos visitantes nas arquibancadas.
“Na 2ª partida, eu fui cortado do banco de reservas, então vi pouca coisa. A gente desceu para o vestiário antes do jogo terminar, então eu nem vi como começou a briga. Quando chegamos ao vestiário, acompanhamos a confusão pela TV. Foram momentos muito tensos. Mas, depois, tudo se acalmou, e para ir embora do estádio foi até tranquilo”, finalizou.