“Eu senti que, sei lá, eu iria morrer naquele dia. Ele estava com o joelho e eu já comecei a ficar sem ar. Comecei a gritar socorro, mas minha voz não saía porque ele estava em cima de mim”.
O relato é de Katlinara Vitória da Silva Alexandre, de 18 anos. Ela é a jovem que aparece em um vídeo sendo imobilizada por policiais militares com um bebê no colo em Itabira, na Região Central de Minas Gerais. Além do filho, ela também estava acompanhada do namorado e do enteado, de 7 anos.
O caso, que ganhou repercussão após a as imagens da abordagem viralizarem na internet, será apurado pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e pela própria Polícia Militar (PM).
“Eu sinceramente me sinto angustiada e assustada, pela forma que eu fui abordada. Eu ainda estou com o meu corpo dolorido pela forma que o policial me tratou. Os meninos também estão bem assustados, que eu acho que é o fato maior”, disse, em entrevista ao g1 nesta terça-feira (9).
O vídeo mostra quando dois policiais jogaram a jovem no chão. Ela estava com o filho no colo e o enteado ao redor, que viu tudo. Um dos policiais usou o joelho para imobilizá-la. A criança maior se desespera e se agarra ao policial, pedindo que pare. Depois disso, o PM empurra o menino.
Um grupo também pede que os policiais parem. Neste momento, segundo testemunhas, os militares apontaram armas pra quem se manifestava no local.
Uma mulher coloca uma sacola para acomodar a cabeça da jovem e pega o filho dela. Em seguida, a jovem tem os braços imobilizados para trás, depois é erguida e levada para viatura.
Ouvida e liberada
A PM de Itabira disse que na mochila de Ketlinara tinha uma arma e com o companheiro dela, que não aparece nas imagens, 4 munições calibre 32. A polícia também afirmou que ela teria usado a criança como escudo para evitar a apreensão.
Entretanto, a jovem afirma que, no momento da abordagem, não sabia que o namorado tinha colocado a arma na bolsa dela e diz que só tomou conhecimento disso após a prisão.
“Então, se eu tivesse visto alguma coisa, com certeza eu iria simplesmente entregar, mas, como eu não sabia que ele tinha feito isso, como é que eu poderia entregar um pertence pessoal meu?”, questionou.
A jovem e o companheiro foram presos em flagrante. Ela foi liberada após ser ouvida na delegacia. O rapaz também foi liberado, mas após pagamento de fiança.
Ação de PMs é investigada
O comandante do policiamento na cidade disse que foi instaurado um procedimento para apurar melhor o que aconteceu e esclarecer os fatos e que somente depois vai decidir o destino dos policiais envolvidos.
O Ministério Público anunciou a abertura de um Procedimento Investigatório Criminal (PIC). Segundo o procurador-geral de Justiça, Jarbas Soares, o Ministério Público tem “o dever funcional de apurar as condutas dos militares que prenderam, de forma violenta, uma senhora com as crianças no colo”.
“Hoje, isso aconteceu comigo, uma dona de casa, mãe de um filho. E amanhã? Amanhã pode acontecer com qualquer um. Porque julgar é muito fácil. A sociedade ama julgar a próximo sem saber das coisas. Mas a gente tem que tomar cuidado nisso. Porque hoje a gente julga e, amanhã, a gente não sabe o que vai acontecer com o próximo”, desabafou.
Protesto
Moradores de Itabira e integrantes de movimentos sociais fizeram um protesto nesta segunda-feira (8) contra a conduta dos policiais militares.
Com cartazes e palavras de ordem, eles se mobilizaram na mesma avenida onde a ação policial aconteceu. Durante o protesto, os manifestantes compararam a ação no interior do estado ao caso George Floyd, que ocorreu nos Estados Unidos.
“Não queremos morte como a Floyd em Itabira”, dizia um dos cartazes.
O que diz a Polícia Militar
Leia a nota na íntegra:
“A Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG) esclarece que no início da noite dessa sexta-feira (05/11/21), na cidade de Itabira, região Central de Minas, realizou a prisão em flagrante de um casal por porte ilegal de arma de fogo e munições.
Durante a abordagem foram apreendidas quatro munições calibre .32 com o homem. Para impedir a apreensão da arma de fogo que estava consigo, a mulher se agarrou a uma criança, usando-a como escudo humano e se recusando a largá-la.
Além da arma de fogo e das munições, uma touca ninja também foi apreendida com o casal.
Sobre a atuação policial, a PMMG esclarece ainda que os fatos serão apurados pela instituição em procedimento administrativo”.