Com a produção do cacau, veio também um sonho: montar uma fábrica de chocolate dentro da Terra Indígena Sete de Setembro, em Rondônia. No início, segundo o cacique José Mapiranemé Suruí, o objetivo era conseguir uma renda básica, mas atualmente a missão é gerar mais empregos entre os indígenas com o comércio do chocolate — feito a partir do cacau cultivado pelo povo Paiter Suruí.
A produção de 5 mil pés de cacau acontece na aldeia Apoena Meirelles, da etnia Paiter Suruí. O cacique José Mapiranemé Suruí conta que a expectativa é aumentar a produção para 30 mil pés. Ele destaca que para isso, é preciso investimento, principalmente no plantio de mudas, em um projeto de irrigação e na construção de uma estufa maior para armazenar as amêndoas depois da colheita.
Com a irrigação, ele estima que cada pé, que hoje produz em média 2,5 kg de cacau, passe a produzir 4 kg.
O primeiro lote de chocolate produzido com o cacau cultivado na área aconteceu em 2021 e, segundo o cacique, habilitou o produto para ser comercializado. O chocolate com 70% de teor de cacau, não possui leite, açúcar, glúten e gorduras ruins.
José Mapiranemé Suruí atribui a alta qualidade do chocolate às técnicas de manejo que aprendeu em curso gratuito oferecido pelo Estado e ao aperfeiçoamento delas. “A técnica de fermentação da amêndoa é muito importante para obtermos esse resultado”, explica.
A Terra Indígena Sete de Setembro, onde vivem os Paiter Suruí está localizada na divisa entre estados, ao norte do município de Cacoal (RO) até o município de Aripuanã (MT).
Fonte de chocolate
O cacique conta que em 2014, após visitar uma aldeia vizinha, decidiu iniciar a plantação de cacau. À época, plantou cerca de 3 mil mudas, mas a queimada que atingiu a região no ano seguinte destruiu praticamente toda a lavoura, restando apenas 300 pés no local.
“Isso me desanimou e abandonei a ideia. Não cuidei mais. Daí o pessoal de uma ONG foi na minha casa e se interessou pelo cacau e eu voltei a cuidar. Teve também um empresário que chegou na comunidade, orientou, falou que compensava produzir cacau. Por isso, eu comecei a cuidar daqueles 300 pés que haviam restado”.
O líder indígena diz que colheu, fermentou e secou o cacau colhido e conseguiu obter 90 kg do alimento.
“Ele [empresário] falou que a fermentação resultou em chocolate 70% e me incentivou a plantar mais. Mandou uma amostra do chocolate que ele fez com o cacau e hoje estou cada vez mais interessado em trabalhar com isso. Esse ano já plantei 6 mil mudas”, afirmou o cacique.
A ideia de montar a fábrica de chocolate dentro da aldeia é eliminar os atravessadores, que, segundo o cacique, compram o produto por R$ 6 o quilo enquanto poderiam vender por R$ 30, a partir da comercialização por meio de uma cooperativa.
“Meu sonho é ter uma fábrica de chocolate aqui na reserva. Hoje temos uns 25 produtores de cacau no povo Suruí, mas precisamos ter apoio para realizar esse sonho. Penso que seria bom para todo o povo Suruí, em geral”, diz o cacique.
A advogada Cássia Souza Lourenço, destaca a importância da criação de uma cooperativa de produtores de cacau, que ficaria responsável por administrar toda a estrutura.
“Por meio da cooperativa, os indígenas terão mais autonomia sobre o negócio e vão poder expandir, inclusive com a exportação dos produtos, como já acontece com a castanha-do-Brasil que já é comercializada em outros países”, explica.
O cacau
O cacau da Terra Indígena Sete de Setembro é colhido por famílias do povo Paiter Suruí e vem de uma “jovem agrofloresta”, uma forma de produzir recuperando o meio ambiente. É a união dos conhecimentos dos povos originários com a ciência do manejo do cacau e o processo para conseguir amêndoas de qualidade.
O cacau é um fruto nativo amazônico, no Brasil a produção acontece principalmente em Rondônia, Pará, Bahia e Espírito Santo. Segundo a Associação Nacional das Indústrias Processadoras de Cacau (AIPC), no país o cultivo é feito, geralmente, junto a áreas próximas de cupuaçu, banana e floresta nativa, em um tipo de produção conhecida como Sistema Agroflorestal (SAF).