Há festa na floresta. Pesquisadores e ambientalistas celebram os primeiros registros fotográficos da onça-parda (Puma concolor) na costa da Região Metropolitana do Rio de Janeiro. A parda ou suçuarana era considerada extinta há mais de um século na área litorânea onde foi flagrada por armadilhas fotográficas. Mas agora há certeza de que a onça ainda vive de frente para o mar, nas florestas do Refúgio da Vida Silvestre de Maricá (Revimar). E ela não está sozinha. Além da onça-parda, as armadilhas fotográficas instaladas pela unidade de conservação municipal flagraram o gato-maracajá (Leopardus wiedii), um dos animais mais belos da fauna brasileira. Esse felino selvagem pouco maior que um gato doméstico se parece com uma miniatura de onça-pintada e também era considerado extinto na região costeira, seu antigo habitat.
Tanto a suçuarana quanto o maracajá historicamente gostavam de morar perto do mar. Mas, após serem caçados, perseguidos e expulsos de seu habitat por séculos, eles hoje resistem somente em fragmentos montanhosos, e se pensava que haviam desaparecido das áreas costeiras.
— É uma excelente notícia descobrir que espécies tão importantes e ameaçadas da Mata Atlântica ainda resistem perto do mar. São animais espetaculares, patrimônios do país e merecem toda a proteção —afirma o biólogo Izar Aximoff, especialista em felinos, convidado pela direção da unidade de conservação a estudar o local.
Aximoff afirma que podem haver mais animais. Há certeza da existência de dois maracajás, e o biólogo estima que também vivam no refúgio duas onças, embora apenas uma tenha sido fotografada.
Ele salienta que, embora os remanescentes da Mata Atlântica e sua fauna estejam sob imensa pressão em todo o Brasil, a zona costeira é pouco pesquisada, principalmente devido à falta de recursos. Por isso, diz, iniciativas como a do refúgio de vida silvestre são tão importantes e podem trazer mais boas notícias.
— A região que se estende do Parque Estadual da Pedra Branca ao Revimar, até Ponta Negra, pertence a uma unidade geoambiental conhecida como Maciços Costeiros, são mais de 100 quilômetros de faixa litorânea. Toda ela precisa ser melhor pesquisada. Tão perto da metrópole e, ainda assim, com lacunas de estudos — ressalta Aximoff.
Em 2020, uma câmera de segurança do Sítio Burle Marx, em Guaratiba, no município do Rio de Janeiro, captou a imagem de um animal que se pensa ser uma suçuarana, mas o registro nunca pode ser comprovado. A imagem tinha pouca resolução, e o animal não mais apareceu. Aximoff diz que a onça de Guaratiba continua a ser procurada. Ela pode ser uma sobrevivente ou ter sido uma visitante esporádica.
A gestora das unidades de conservação de Maricá, Marcia Freitas, celebra a presença da onça e do maracajá. Freitas instalou as armadilhas fotográficas em 2020. Sonhava em comprovar os relatos de moradores, que há cerca de uma década falavam de avistamentos da onça-parda.
A suçuarana, o segundo maior felino do Brasil, menor apenas que a onça-pintada, não se deixava flagrar com facilidade. Mas em setembro de 2021, a equipe do Revimar conseguiu finalmente captá-la em foto e vídeo.
—Ficamos muito felizes. Nossa apreensão maior é que com a caça, esses felinos merecem a nossa admiração e proteção. Há dez anos essa onça deve estar por aqui e sempre teve uma convivência de harmonia com a comunidade, jamais trouxe perigo. A presença da onça é motivo para alegria e orgulho — destaca Freitas.
Ela tem razão. O ser humano é que é uma ameaça para as onças e os demais felinos silvestres. Ele destrói sua casa, a floresta, e os caça por prazer ou temor infundado. Não existe em toda a América do Sul qualquer registro de ataque de onça-parda a seres humanos. Nas palavras do naturalista do início do século XX Armando Magalhães Corrêa, a suçuarana é “muito medrosa”. Essa onça de olhos verdes é, na verdade, parente mais próxima do gato doméstico do que da onça-pintada.
O Revimar tem nove mil hectares, mais do que o dobro do Parque Nacional da Tijuca, e se estende por 25% do território de Maricá. É maior do que municípios como Búzios e Belfort Roxo, por exemplo.