Não é novidade que políticos que posam em Brasília como aliados de Jair Bolsonaro farão jogo duplo na campanha deste ano e, em suas bases eleitorais, pedirão votos para Lula.
O fenômeno é esperado especialmente no Nordeste, onde figuras de partidos do Centrão, como o Progressistas do todo-poderoso ministro Ciro Nogueira, da Casa Civil, estarão no palanque do candidato do PT.
Alguns casos não são tão explícitos, mas dão a medida de como será a traição na corrida presidencial. Um encontro político realizado em março no sertão de Pernambuco registra uma dessas situações.
O senador pernambucano Fernando Bezerra Coelho, do MDB, líder do governo Bolsonaro no Senado até o fim do ano passado, foi à cidade de Serrita para pedir votos para seus dois filhos – Miguel Coelho, pré-candidato a governador, e Fernando Bezerra Filho, candidato a deputado federal, ambos pelo União Brasil.
A certa altura, o anfitrião do encontro, um ex-prefeito que havia reunido em sua casa dezenas de lideranças da região, bradou ao microfone: “O federal vocês já sabem que é Fernandinho, né? O governador, já sabem que é Miguel, né? E o presidente, vocês já sabem que é o presidente Lula, né? Votar contra Lula é votar contra o Nordeste. O Nordeste não pode ser contra si próprio, né? (…) Agora vamos votar fechado (sic) em Lula para poder ele voltar à Presidência”.
Ao fundo do discurso, entre aplausos calorosos, é possível ouvir um grito empolgado de “fora Bolsonaro”.
A reação de Bezerra é um tanto constrangida. Ele não aplaude, mas balança a cabeça em sinal de aprovação. Seus filhos, Miguel Coelho e Fernando Filho, o Fernandinho, não são tão comedidos. Em momentos diferentes, eles batem palmas para a ode a Lula. Pouco antes, o próprio senador havia discursado, mas evitou falar da disputa nacional. Limitou-se a pedir apoio para os filhos.
Detalhe: Fernando Bezerra Coelho é um dos campeões de emendas do orçamento secreto, distribuído por Bolsonaro para aliados de olho nos votos que a dinheirama pode render pelo país afora — nas visitas ao interior de Pernambuco, por sinal, o senador tem aparecido ao volante de tratores e máquinas compradas com verba das emendas. Como se percebe, em certos casos o efeito pretendido pelo Palácio do Planalto pode ser exatamente o oposto.
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