O ministro da Economia, Paulo Guedes, voltou a defender a venda de praias no país, nesta terça-feira (27), afirmando que há “má gestão” sobre o tema.
Guedes concedeu entrevista ao Flow Podcast e, ao comentar o assunto, disse que poderia ser possível arrecadar US$ 1 bilhão com a venda de uma praia “numa área importante”.
“Tem trilhões de ativos mal-usados. Por exemplo, tem um grupo de fora que quer comprar uma praia numa região importante do Brasil. Quer pagar US$ 1 bilhão. Aí você chega lá e pergunta: ‘Vem cá, vamos fazer o leilão dessa praia?’. Não, não pode. ‘Por quê?’. ‘Isso é da Marinha’”, declarou o ministro.
“Você fala assim: ‘E quanto é que a gente recebe por isso aí?’. ‘A gente pinta lá o quartel deles uma vez por ano, lá, a gente pinta’. Pô, como é que pode um negócio desse? É mal gerido o troço, não é de ninguém. Quando é do governo, não é de ninguém”, prosseguiu.
O Artigo 20 da Constituição estabelece que as praias, assim como as ilhas, integram a lista de bens da União.
E a Lei 7.661 afirma que “as praias são bens públicos de uso comum do povo, sendo assegurado, sempre, livre e franco acesso a elas e ao mar, em qualquer direção e sentido, ressalvados os trechos considerados de interesse de segurança nacional ou incluídos em áreas protegidas por legislação específica”.
Uma venda ou concessão do espaço, portanto, não teriam respaldo jurídico. Seriam necessárias mudanças na lei em vigor e na Constituição, o que dependeria de aprovação do Congresso Nacional, segundo Marcus Lins, advogado responsável pela área de direito imobiliário do escritório Baptista & Vasconcelos Advogados Associados.
A situação é diferente da cessão onerosa de ilhas, por exemplo. Uma concessão de ilha pressupõe que o ente privado faça a manutenção e preservação do local — não há venda. As praias de ilhas também devem ter o direito de acesso assegurado, mas a forma da concessão pode acabar por restringir esse acesso, avalia Lins.
“As ilhas concedidas, seja através de aluguel, cessão ou aforamento, serão de uso do contratante, mas os termos serão delineados pela União. O objetivo principal é sua manutenção e preservação. A questão de eventual uso por terceiro, sem autorização do particular, pode gerar polêmica.”
Na semana passada, o leilão de uma ilha inteira por R$ 23 milhões, em Ubatuba, no litoral norte de São Paulo, foi encerrado sem receber nenhum lance.
Daniela Akamine, especialista em direito imobiliário, diz que uma praia perde a sua funcionalidade, inclusive dentro de concessões. “A praia, como bem de uso comum do povo, precisa estar acessível a toda a população, sem restrições”, diz.
Ela lembra o caso recente em que o Ministério Público Federal (MPF) obteve uma decisão liminar na Justiça que proíbe um empresário do Espírito Santo de impedir que a população utilize a praia situada na Ilha da Baleia, em Vila Velha.
Segundo o MPF, o empresário João Carlos Rodrigues Neto, que é o foreiro legal da ilha, estava utilizado “métodos ilegais — inclusive por meio de ameaças de seus funcionários e seguranças, uso de cães de grande porte, e até de atear fogo na ilha — para afastar banhistas, esportistas e a população em geral da praia”.
Não bastasse a necessidade de criar um arcabouço jurídico, seria necessário verificar o real interesse na concessão de praias.
Durante toda a campanha de 2018, o então candidato a presidente Jair Bolsonaro defendeu a exploração de áreas preservadas. Costumava dizer que o Brasil poderia transformar Angra dos Reis (RJ) em uma “nova Cancún” (México) para movimentar o turismo.