“É como se alguém invadisse sua casa, e ditasse regras e ordens. Esse projeto de lei vai trazer apenas retrocessos para os povos originários” , disse o cacique Arapowanã, da aldeia Xucuru Kariri Arapowã Kakiá, ao falar sobre o marco temporal.
O povo dele é nômade e há poucos meses chegou a Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Por causa disso, a situação da aldeia é dramática.
O projeto de demarcação de terras indígenas prevê que só podem ser preservadas as terras que já eram tradicionalmente ocupadas por povos indígenas no dia da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988. O caso é julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Na prática, o marco temporal permite que indígenas sejam expulsos de terras que ocupam, caso não se comprove que estavam lá antes de 1988, e não autoriza que os povos que foram forçados a sair de seus locais de origem retornem.
“Querem mexer onde estão nossas nascentes, na preservação da natureza. Passam por cima até mesmo da nossa espiritualidade. Isso é genocídio. São piratas de gravata do século XXI, mas nossa resistência existe desde os anos 1.500”, afirmou o cacique que está em Brasília para acompanhar a votação.
Terras ocupadas
Há 16 famílias da comunidade índigena Xucuru Kariri vivendo em Brumadinho. O grupo veio do interior do estado há pouco mais de um ano, quando ocupou as terras que hoje são de domínio da mineradora Vale.
A empresa move ação judicial contra os indígenas, pedindo a desocupação da área. Na época, a Vale afirmou que as áreas eram destinadas à compensação ambiental. A Justiça de Brumadinho encaminhou o processo à Vara de Conflitos Agrários, em Belo Horizonte, onde segue em andamento.
Segundo o cacique, a demarcação é a única forma de preservar moradia, acesso à saúde e educação das famílias da aldeia. Além disso, a comunidade precisa do espaço para perpetuar os ensinamentos dos povos originários, fazendo o que o Arapowanã diz ser a preservação da história do país.
“Quem nos guiou para esse espaço foi a espiritualidade. Quando chegamos, não tinha nada aqui, e o local não cumpria o papel social dele. Hoje, construímos nossas escolas e casas de reza. Estamos cuidando do que a natureza nos deu”, disse.