O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, afirmou, na segunda-feira (9), que a Corte estuda duas exceções à atual regra de imunidade das plataformas digitais, determinada pelo Marco Civil da Internet, que regula a rede de computadores no Brasil.
De acordo com a legislação atual, plataformas como Facebook, X (antigo Twitter), YouTube, dentre outras, só podem ser responsabilizadas civilmente caso não cumpram ordens judiciais visando remoção de conteúdo.
Conforme declarou Barroso, as empresas deveriam ser obrigadas a remover conteúdos criminosos, de ofício – ou seja, sem a necessidade de iniciativa ou participação de terceiros.
A segunda exceção ocorreria no caso de violações de direitos fundamentais. Assim, bastaria uma notificação privada, como observado hoje com o compartilhamento de imagens íntimas ou violação de direitos autorais.
O Supremo se prepara para julgar nos próximos meses dois recursos que flexibilizam o Marco Civil da Internet.
“Tem que ter um algoritmo programado para enfrentar comportamentos criminosos e tem que ser algoritmo, porque não há controle humano possível sobre o volume de postagens que existe”, defendeu Barroso durante a conferência “Digitalização e Democracia”, realizada na Universidade Goethe, em Frankfurt, na Alemanha.
A fala de Barroso foi divulgada anteriormente pelo jornal Folha de S. Paulo. Na ocasião, o ministro declarou ainda que a regulação das redes é “imperativa e imprescindível”.
A CNN ouviu especialistas que avaliaram a ideia proposta pelo presidente do Supremo.
“Questão deve ser discutida e decidida pelo Legislativo”, defende advogado
Alexander Coelho, advogado especializado em Direito Digital e Proteção de Dados, reconhece a importância da regulamentação da internet no Brasil através do Marco Civil da Internet (Lei n.º 12.965/2014), mas pontua que não cabe ao STF “criar novas legislações”.
“A proposta de criar exceções ao Marco Civil para obrigar empresas a remover comportamentos e conteúdos criminosos, de ofício, assim como para casos de violações claras de direitos fundamentais, é uma questão que deve ser discutida e decidida pelo Legislativo”, destaca Alexander.
“A criação de novas leis e regulamentações, como a implementação de um algoritmo para monitorar comportamentos criminosos, está dentro da competência do Congresso Nacional”.
O especialista acrescenta ainda que os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário devem respeitar suas funções a fim de garantir a separação entre eles.
“Se há interesse em contribuir ou debater a criação de exceções ao Marco Civil da Internet, o caminho adequado é por meio do processo legislativo, com a participação dos representantes eleitos pelo povo no Congresso. É importante que a sociedade civil, especialistas sobre o tema e cidadãos estejam envolvidos no debate para garantir que as decisões tomadas sejam equilibradas e respeitem os princípios do Estado de Direito”, complementa o advogado.
Algoritmo pode gerar censura prévia, diz especialista
Na avaliação de Acacio Miranda da Silva Filho, doutor em Direito Constitucional pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP-DF), a discussão do tema se deve à omissão do Congresso Nacional em se debruçar sobre a questão.
Contudo, o especialista se mostra reticente quanto à criação de um algoritmo para monitorar conteúdos ofensivos.
“Se o algoritmo tivesse a finalidade de impedir uma publicação, então ele seria uma forma de censura prévia”.
“Hoje, a Meta [empresa dona do Facebook, Instagram e WhatsApp], breca várias publicações que eles classificam ofensivas, só que a forma deles é limitando o público”, avalia Acacio.
STF não pode determinar exceções à lei, avalia advogada
Segundo Priscila Pamela dos Santos, advogada criminalista do Prerrogativas, o STF pode, por exemplo, entender que houve danos à imagem de uma pessoa em razão de uma publicação nas redes sociais.
“Nesse caso, o STF pode julgar que, comprovado o dano à pessoa, ela deve ser ressarcida”, indica Priscila.
No entanto, “o que ele não pode é estender isso e dizer que há duas exceções à lei. Isso é extrapolar os limites”.
“Cada vez mais a gente vai dando poderes e municiando o Supremo para largar os poderes que foram constitucionalmente assegurados”.
Priscila Pamela dos Santos, advogada criminalista do Prerrogativas
“O STF pode julgar o caso concreto a partir disso, mas não estender esse efeito para todos os casos de forma indistinta. Aí tem que ser via Congresso”, completa a advogada.