Alessandra dos Santos Silva, a trancista e passista da Acadêmicos do Grande Rio que teve o braço amputado e o útero retirado após complicações em uma cirurgia para a retirada de mioma, no primeiro semestre, faz 36 anos nesta sexta-feira (22). Apesar do ano difícil, ela tenta manter o otimismo para reconstruir a vida, deixar a tristeza de lado e buscar por justiça.
“Eu passei por todo um processo de luta. Hoje eu gosto de ver o carinho das pessoas comigo nas ruas, desde crianças até idosos. Os deficientes vêm muito falar comigo”, contou Alessandra.
O aniversário é o primeiro após as operações pelas quais passou. Ela conta que sobreviveu graças ao apoio dos pais, dos amigos e da escola de samba do coração.
“Estar viva para comemorar o meu aniversário é como se fosse um filme.”
Meses depois, ela ainda está lendo e respondendo as mensagens de carinho que recebeu nas redes sociais após a história que viveu ter se tornado pública.
Passista da Grande Rio se interna para retirar miomas no útero e volta para casa com braço amputado
Alessandra tenta lidar com otimismo ao falar da expectativa para o futuro. O único assunto que a deixa para baixo é o fato de que, ao perder parte de um dos braços, ela também perdeu o próprio sustento. Quando foi operada, ela trabalhava fazendo cabelos há pelo menos duas décadas.
“Eu não estou trabalhando mais. Eu estou desempregada. Eu era trancista e implantista e a minha mãe e meu pai me ajudam como podem.”
Alessandra vive com a mãe em São João de Meriti e conta que, como sempre foi independente, depender financeiramente de alguém é algo com o qual não está acostumada.
“Eu fico mal com isso pois a minha mãe tem 63 anos e meu pai 68 anos. Era para eu estar dando suporte para eles e não o contrário. A vida virou uma loucura. Essa é uma época que mexe muito comigo, pois é um período em que eu trabalhava muito, uma cliente após a outra. Eu ganhava meu dinheiro e ajudava a minha mãe em casa, pagava uma conta, fazia uma compra. É complicado”, explica.
Prótese
Além dos familiares, Alessandra conta que o apoio recebeu da escola do coração, a Acadêmicos do Grande Rio, também a ajudou a se reerguer ao longo de um ano muito tumultuado. Ela ganhou da direção da escola uma prótese que ainda está na fase de ajustes.
“Eu provei e fiquei toda boba. Eu até chorei. Ela mexe a mão, ela mexe o braço. Chorei muito. Parece que eu estou mexendo o braço de novo. Eu falei para a minha mãe que eu estou igual um transformer”, brinca.
Ela destaca que a escola sempre está em contato com ela: “Perguntam sempre se eu estou precisando de algo, como está a minha saúde”.
A relação com a Grande Rio começou aos 19 anos, quando passou a frequentar a quadra com um amigo e se encantou com a escola.
Barbie do samba
Outro sonho de Alessandra é voltar a pisar na Marquês de Sapucaí. Ela voltou a participar dos ensaios da Grande Rio, mas com parcimônia dentro dos limites da recuperação.
O último desfile em que a passista, que é conhecida como a Barbie do Samba, esteve presente foi o que tornou a escola campeã pela primeira vez, em 2022.
“Eu vou desfilar, estou indo para a quadra ensaiar, vou para os ensaios de rua. Não consigo fazer tanto esforço, estou ensaiando na medida do possível. Estou amando a comunidade me abraçando do jeito que era.”
Amputação do braço e retirada do útero
Alessandra dos Santos Silva e a mãe — Foto: Reprodução/TV Globo
O drama de Alessandra começou em agosto do ano passado, quando sentiu dores e descobriu os miomas. A cirurgia só viria no Hospital da Mulher Heloneida Studart em 3 de fevereiro deste ano.
Horas depois do procedimento, médicos detectaram uma hemorragia e, no dia seguinte, decidiram retirar o útero.
Em 5 de fevereiro, parentes foram visitar Alessandra, que estava em coma e com as pontas dos dedos esquerdo escurecidas. Braços e pernas estavam enfaixados. Para a família, era o começo da necrose.
No dia 6 de fevereiro, com uma piora do quadro de Alessandra, o Heloneida Studart a transferiu para o Instituto Estadual de Cardiologia Aloysio de Castro (Iecac), em Botafogo.
Lá, um médico disse que iria drenar o braço. O procedimento não deu resultado e, no dia 10 de fevereiro, o Iecac informou que “ou era a vida de Alessandra, ou era o braço”, porque a necrose poderia se alastrar. A família autorizou a amputação.
A cirurgia foi feita, mas o estado da mulher se agravou, com o rim e o fígado quase parando e com risco de uma infecção generalizada.
Alessandra saiu do coma no dia 12 de fevereiro.
A passista recebeu alta no dia 15, mas, segundo Ana Maria, dias depois a barriga estava necrosando.
Em 28 de fevereiro, a mulher voltou ao Iecac para a revisão da cirurgia de amputação. Segundo a mãe, o médico se assustou com o estado dos pontos no braço e na barriga e recomendou que elas voltassem ao Heloneida Studart. A família, porém, decidiu não retornar à unidade e passou a buscar alternativas.
Somente em 4 de março Alessandra foi internada no Hospital Maternidade Fernando Magalhães e transferida para o Hospital Municipal Souza Aguiar, por causa das suturas, e só recebeu alta em 4 de abril.