Manchester City 4 x 0 Fluminense. Barcelona 4 x 0 Santos. Barcelona 3 x 0 River Plate. Europa 16 x 4 América do Sul. O passado recente é muito claro e mostra que não há mais competitividade no Mundial de Clubes. Só um alinhamento muito grande e um tanto quanto improvável pode fazer o time europeu perder um jogo.
Mas, afinal, o que aconteceu para a diferença ficar tão grande?
A resposta tem nome: a Lei Bosman.
E o “responsável” atende pelo mesmo nome. Em 1990, o belga Jean-Marc Bosman recusou uma oferta de renovação de contrato com o RFC Liege que diminuiria seu salário em 75% e entrou com uma ação na Justiça cobrando o direito de poder escolher onde jogar após o final do seu contrato.
Naquela época, ao contrário do que acontece agora, o atleta continuava preso ao clube mesmo após o fim do período do vínculo acordado no papel.
Bosman recebeu uma proposta do Dunkerque, da França, mas ficou “preso”, sem poder atuar ou se transferir, porque o Liege não entrou em acordo com o clube francês.
O processo correu por cinco anos até ser vencido pelo jogador no Tribunal de Justiça da União Europeia, em dezembro de 1995. Foi criada, então, a Lei Bosman, que acabou também conhecida como “o fim da escravidão no futebol”.
O problema é que isso acabou também transformando todo o equilíbrio de forças no futebol mundial.
A partir de 1996, qualquer jogador passaria a ficar livre de seu clube com a expiração do contrato. Com seis meses ou menos para o fim do vínculo, também se tornou possível assinar com outra equipe sem a necessidade de qualquer pagamento pelo negócio.
Mais do que isso, na Europa, a lei fez com que jogadores de países pertencentes à Comunidade Europeia pudessem ser contratados por equipes de nações do bloco sem que fossem considerados estrangeiros.
Antes da aprovação da Lei de Bosman, os times tinham uma cota máxima de atletas de outras nações em seus elencos. Por exemplo: nas competições europeias, o regulamento da Uefa decretava que cada equipe poderia colocar em campo no máximo três estrangeiros, além de precisar escalar ao menos dois “assimilados” – jogadores que tinham jogado ininterruptamente durante cinco anos no país da associação nacional em questão, sendo três dessas temporadas nas categorias de base.
E tudo obviamente mudou com o fim dessas amarras todas somado também ao óbvio desequilíbrio econômico entre Europa e América do Sul.
Na prática, os clubes dos principais países europeus viraram potências globais.
Entre 1996 e 2004, os europeus venceram sete das nove Copas Intercontinentais. O Mundial com esse formato maior teve 20 edições, com 16 títulos europeus – e com uma crescente dificuldade das equipes sul-americanas até de chegar à grande decisão.
Na soma, o recorte a partir de 1996 dá 23 títulos para o Velho Continente e apenas seis para a América do Sul.
Antes de 1996, essa balança era favorável aos sul-americanos: 20 taças contra 14 dos europeus.
Até por isso, a Fifa busca maneiras de voltar a dar um pouco mais de importância ao seu torneio e criou um “Super Mundial” para começar em 2025, que reunirá mais times europeus e promete uma disputa mais competitiva.
Desequilíbrio também na Europa
Se causou o desequilíbrio de forças no futebol mundial, a Lei Bosman também mexeu com a competitividade dentro da Europa. A partir de 1996, só o Porto (em 2003-04) conseguiu quebrar a hegemonia dos países mais ricos (Inglaterra, Espanha, Itália e Alemanha) na Champions League.
Antes disso, o torneio teve campeões muito mais diversos: Portugal (Benfica e o próprio Porto), Escócia (Celtic), Holanda (Ajax, PSV e Feyenoord), Romênia (Steaua Bucareste), Sérvia (Estrela Vermelha) e França (Olympique de Marselha).