Mesmo com PEC “fura-teto”, investimento público em infraestrutura caiu no 1.° ano de Lula

Neno Canuto - Secom

Neno Canuto – Secom

Os investimentos em infraestrutura diminuíram no ano passado, primeiro ano do atual mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Eles recuaram de 1,84% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2022 para 1,79% do PIB em 2023, conforme levantamento da consultoria Inter.B, especializada no assunto.

A expectativa da Inter.B é de uma leve melhora neste ano, com os desembolsos chegando a 1,87% do PIB. Ainda longe, porém, do patamar ideal para a modernização da infraestrutura nacional – algo próximo de 4% do PIB a cada ano. “Há mais de três décadas não se investe o suficiente para atender às demandas do bem-estar da população e aos requisitos básicos de uma economia competitiva”, destaca o economista Cláudio Fritschak, sócio da Inter.B.

Conforme o levantamento, a retração de 2023 foi determinada pelo investimento público, que passou de 0,68% do PIB no ano anterior para 0,60% do PIB. O desembolso privado, por sua vez, aumentou de 1,16% para 1,19% do PIB, mas não foi o suficiente para compensar o encolhimento do setor público.

Em valores absolutos, a Inter.B calcula que a infraestrutura brasileira recebeu investimentos de R$ 194,5 bilhões no ano passado, sendo R$ 129,8 bilhões em recursos privados e R$ 64,7 bilhões, públicos.

O investimento público caiu mesmo com o aumento do espaço fiscal proporcionado pela PEC da Transição, a PEC “fura teto”. Lançado em agosto, o Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) também não foi suficiente para elevar o investimento.

“Os investimentos públicos em infraestrutura no âmbito federal não avançaram, com a significativa exceção das rodovias”, afirma Fritschak. Ele atribui esse comportamento à captação de recursos por emendas parlamentares, que, segundo o consultor, leva à fragmentação dos recursos e, potencialmente, à sua má alocação.

A modernização da infraestrutura, diz Frischtak, vai depender dos investimentos privados, dado o caráter estrutural das restrições fiscais e a efemeridade e limitação do espaço criado pela PEC da Transição e pelo novo arcabouço fiscal.

A consultoria prevê que o investimento público em infraestrutura vai subir um pouco neste ano, chegando a 0,64% do PIB – ainda abaixo, porém, do patamar de 2022. A projeção para o setor privado é de um novo avanço, também discreto, para 1,23% do PIB.

A Inter.B destaca que a agenda de modernização da infraestrutura precisa estar vinculada a uma maior segurança jurídica e previsibilidade regulatória, além de melhorias na governança dos investimentos públicos, com um planejamento mais eficiente e priorização, respeitando os limites da responsabilidade fiscal.

“O Brasil possui um potencial de primeira ordem para atrair investimentos e mobilizar recursos domésticos e externos, tornando a infraestrutura do país inclusiva e ambientalmente sustentável, promovendo a descarbonização e facilitando sua integração à economia internacional. O país necessita de marcos legais e regulatórios sólidos, políticas públicas fundamentadas em evidências, e persistência na busca de reformas que reduzam a desigualdade e impulsionem a produtividade”, enfatiza a consultoria.

Quais as expectativas para energia, telecom e saneamento

A Inter.B prevê que os investimentos em energia elétrica vão crescer em termos reais (acima da inflação) em 2024, sendo predominantemente privados, e ainda mais acentuados após as privatizações da Eletrobras em 2022 e da Copel em 2023. Nos últimos anos, os investimentos nesse setor foram impulsionados pelas energias renováveis, como a solar e a eólica, e pela demanda associada de transmissão e geração distribuída.

As telecomunicações enfrentaram uma redução nos investimentos em 2023, com uma diminuição de R$ 4,62 bilhões, representando uma queda de 16%. A reestruturação setorial foi o principal motivo. A Oi, que liderou as aplicações na década de 2010, fragilizou-se financeiramente nos últimos anos, transferindo seus ativos em telefonia para Claro, TIM e Vivo, passando a dedicar-se exclusivamente a serviços de fibra ótica.

Outro fator que influenciou foi o período de transição das operadoras de telefonia celular, que estão implantando a tecnologia 5G. A expectativa para 2024 é de uma retomada parcial dos investimentos, impulsionada pelo cumprimento de obrigações relacionadas à nova tecnologia e pela expansão das pequenas provedoras de fibra e sinal.

O marco legal do saneamento, aprovado em 2020, é o principal fator responsável pelo crescimento dos investimentos nesse segmento. A expectativa é de um aumento de 11,1% nos desembolsos neste ano, atingindo R$ 30,47 bilhões, mesmo diante dos ruídos causados, no ano passado, pela tentativa do governo Lula de alterar por decreto o marco aprovado pelo Congresso

Um dos efeitos do novo marco legal foi a intensificação dos investimentos realizados por algumas estatais, devido ao aumento da concorrência com operadores privados. A presença destes no segmento tende a crescer com a privatização da paulista Sabesp, prevista para este ano, e com a ampliação de concessões e parcerias público-privadas (PPPs).

Investimentos em transportes devem crescer em 2024, mas estão abaixo do necessário

A projeção de investimentos em infraestrutura de transportes para 2024 é de R$ 75,3 bilhões, um crescimento de 7,77%, correspondendo a 0,65% do PIB. Os valores estão consideravelmente abaixo do necessário para a modernização do segmento, que seria de 2% do PIB ao ano.

As rodovias absorveram os maiores investimentos no ano passado, totalizando R$ 43,6 bilhões, um aumento de 5,6% em relação a 2022. A queda nos investimentos estaduais e municipais (33,1%) foi compensada pela expansão da destinação de recursos privados e federais. Para 2024, estão previstos R$ 47,05 bilhões em obras.

O maior crescimento foi registrado nos portos, que receberam R$ 4,9 bilhões em investimentos, um incremento de 28,9%. O desempenho está associado aos compromissos de investimento assumidos por terminais cujos contratos de arrendamento foram renovados; à licitação de novas áreas nos perímetros dos portos públicos; ao arrendamento de terminais subutilizados; e aos gastos de capital em instalações portuárias privadas.

O investimento em hidrovias também cresceu no ano passado, mas ficou restrito ao governo federal e a poucas empresas privadas. Foram destinados R$ 440 milhões, um aumento de 15,8% em relação a 2022. Contudo, a expansão não deve continuar neste ano, principalmente devido à falta de legislação e regulação que promovam a segurança jurídica e induzam a exploração desse modal por meio de concessões.

A destinação de recursos para ferrovias vem ganhando força, impulsionada por investimentos privados. Os investimentos foram de R$ 10,31 bilhões, um aumento de 5,2% em relação ao ano anterior. Para 2024, esse valor deve chegar a R$ 11,35 bilhões, sendo 93,8% privados.

Os investimentos são impulsionados pelos compromissos assumidos pelas empresas que operam no setor e negociaram a renovação antecipada de seus contratos, como Vale, MRS e Rumo Malha Paulista.

Os aeroportos receberam R$ 1,4 bilhão no ano passado, uma retração de 10%, devido à troca na administração de diversos terminais, com a saída da Infraero. A expectativa é de um cenário melhor para 2024, já que parte significativa dos contratos estará em fase de execução. A previsão é que sejam aplicados R$ 4,5 bilhões.

A Inter.B avalia que levará alguns anos para que haja um novo surto de investimentos no segmento, uma vez que as empresas aéreas se encontram em frágil situação financeira, e o sistema aeroportuário também apresenta capacidade ociosa.

Na mobilidade urbana, que recebeu R$ 6,6 bilhões em investimentos em 2023, a projeção da consultoria indica a aplicação de R$ 6,34 bilhões neste ano. Dois terços desses investimentos são de responsabilidade de estados e municípios.

Fonte: Gazeta do Povo

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