Kléber Malaquias: TJ/AL nega habeas corpus e delegado acusado de forjar provas segue preso

O Tribunal de Justiça de Alagoas negou, esta semana, o habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado pela defesa do delegado Daniel José Galvão Mayer, que é acusado de manipular provas sobre a autoria do homicídio do empresário Kleber Malaquias para acusar uma pessoa já falecida. Com isso, Mayer continua preso.

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Kleber Malaquias

Consta nos autos que o advogado de Daniel Mayer recorreu ao Tribunal de Justiça após a juíza da 3ª Vara Criminal de Rio Largo, Eliana Augusta Acioly Machado de Oliveira, decidir manter a prisão do acusado na semana passada. Em sua decisão, publicada no dia 18 deste mês, a magistrada diz que a manutenção da prisão se faz necessária para resguardar a ordem pública diante da possibilidade de descrédito ao sistema de Justiça uma vez que o acusado é delegado da Polícia Civil de Alagoas.

“Conforme mencionado na decisão proferida por este juízo, a manutenção da cautelar máxima é medida que se impõe, haja vista a necessidade de salvaguardar a ordem pública, ante a possibilidade de descrédito do sistema de justiça, por se tratar de Delegado da Polícia Civil que faz parte da cúpula desta, a qual deveria zelar e resguardar; a conveniência da instrução criminal, ante os indícios de manipulação de inquéritos policiais findos e em andamento e, com a sua soltura, a possibilidade concreta de manipular dados de procedimentos criminais e (…) o suposto vazamento de peças sigilosas para Eudson Matos, denunciado em outro processo criminal, quando deveria preservar pelo sigilo, em razão do cargo que exerce. (…) Impossível, assim, a substituição da medida cautelar extrema por outra de menor onerosidade. Ante tais considerações, mantenho a prisão preventiva em desfavor de Daniel José Galvão Mayer, nos moldes já proferidos em decisão anterior deste Juízo”, resolve a juíza na ocasião.

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Pedido da defesa

Diante da negativa de substituição da prisão preventiva por medidas cautelares, a defesa impetrou com o pedido de habeas corpus no Tribunal de Justiça. Para isso, os advogados dizem que é desnecessária a prisão neste momento já que o delegado agiu no exercício de suas funções após provocação dos advogados das partes uma vez que o caso não estava sob sigilo. Além disso, ressaltam que o delegado é réu primário, tem bons antecedentes, residência fixa e ocupação lícita. A defesa também cita que não há no processo fundamentos que justifiquem a ‘federalização’ na investigação e pede o afastamento da Polícia Federal no caso.

No entanto, o juiz convocado Alberto Jorge Correia de Barros Lima, relator do processo, ratificou a decisão da magistrada de primeira instância e manteve o acusado preso.

Como justificativa, o juiz ressaltou que a conduta do delegado foi grave uma vez que incriminou o sargento Alessandro Fábio da Silva, assassinado pela esposa em 2022, para inocentar uma pessoa já pronunciada e às vésperas do julgamento.

“Ademais, considerando a cronologia dos fatos narrados, é de se inferir que essa suposta manipulação estaria sendo coordenada por outra(s) pessoa(s),possivelmente dotada(s) de alguma ingerência sobre o Delegado de Polícia, aqui paciente. (…) Ademais, a suposta conduta do denunciado, na condição de Diretor de Polícia Judiciária, um dos cargos mais importantes da Polícia Civil do Estado de Alagoas, coloca em dúvida, diante de toda a sociedade, o regular funcionamento e a lisura da Administração da Justiça, haja vista que o representado teria a pretensão de inserir elemento de informação abarcado pela chancela pública estatal com o fito de atingir outras instituições, imbuído de, pelo subterfúgio do cargo exercido, induzir a erro julgadores togados, juízes de fato e toda a população alagoana. (…) Diante do exposto, indefiro a liminar pretendida”, decide o magistrado.

Início das suspeitas

Cinco dias antes do julgamento de Fredson José dos Santos, José Mário de Lima Silva e Edinaldo Estêvão de Lima, três dos seis suspeitos de autoria do crime, na data de 12 de julho de 2024, o delegado Daniel Mayer juntou ao processo novas coletas de documentos e oitivas sem comunicar o Ministério Público Estadual.

“Isso porque o Delegado de Polícia Civil, ora investigado, Daniel José Galvão Mayer, juntou aos autos principais do caso termos de declarações em total inobservância ao tríduo legal e sem qualquer comunicação às autoridades ministeriais e judiciais acerca da coleta de tais depoimentos”, diz o processo.

Isto gerou um tumulto processual uma vez que a defesa dos réus, com o suposto suporte do delegado, passou a subsidiar a história de que o crime tinha sido cometido pelo sargento Fábio.

Assim sendo, o Ministério Público e Polícia Federal, durante as investigações, verificaram a existência de uma proximidade do delegado e um dos acusados, Eudson Matos. “Foi confirmado da extração de dados telefônicos do último ,assinalando que no dia 10 de julho de 2024, a autoridade policial encaminhou informações oficiais (saliente-se forjadas) para o sicário Eudson Matos. (…) Não obstante o aporte de elemento novo nos autos, favorecendo a criação de uma versão fictícia, o delegado Daniel Mayer entrou em contato com o algoz (Eudson Matos) via aplicativo WhatsApp, encaminhando-lhe os termos de depoimento de Josefa acerca dos novos elementos que viriam a ser carreados nos autos do júri apenas nas vésperas deste, fora inclusive, do tríduo legal. Por conseguinte, no dia 12 de julho de 2024, cinco dias antes do Júri que aconteceria no dia 17 de julho de 2024, em relação aos imputados Fredson Dos Santos, José Mário e Edinaldo Estevão, o réu Daniel Mayer juntou os 3 (três) depoimentos nos autos criminais relacionados ao assassinato do ativista político Kleber Malaquias.”, relatou o MP na denúncia.

No dia em que o júri deveria acontecer, a defesa de um dos acusados pediu adiamento e foi atendida pelo juiz José Braga Neto, da 8ª Vara Criminal de Maceió, sendo remarcado para 19 de Setembro.

Declarações forjadas

Ainda de acordo com o MPE/AL, o processo relativo a morte de Kléber Malaquias antes era encabeçado pelo delegado Lucimério Campos, mas Mayer assumiu a presidência do inquérito em 08 de março de 2024. Desde então, não teria mais havido interação investigativa entre a Polícia Civil do Estado de Alagoas, o Ministério Público Estadual e a Polícia Federal, que coopera tecnicamente com a apuração desde o início do procedimento. O afastamento das instituições no caso causou estranheza.

“Dessa forma, o primeiro ato de polícia judiciária conhecido de Daniel Mayer à frente da investigação envolveu uma situação que, consoante descrito em sede relatório da Polícia Federal, de forma estarrecedora, saltou aos olhos: “oficializado” por uma petição assinada, mas sem data, de uma advogada. O referido delegado, no dia 29 de maio de 2024, ouviu, às escondidas, uma vez que sequer foi comunicado, formal ou informalmente, ao Ministério Público ou à Justiça, um dos principais investigados no caso do assassinato do ativista político Kleber Malaquias: o Sargento da Polícia Militar do Estado de Alagoas Marcelo José Souza Da Silva”, diz o processo.

As novas declarações do sargento Souza colocavam no local do crime o sargento já falecido Alessandro Fábio e inocentava o principal autor do crime, o ex-policial Fredson dos Santos, que está sendo apontado pelo MPE/AL como o autor dos disparos que culminaram na morte da vítima. Desde o início das investigações, Marcelo Souza se dizia inocente, mas no depoimento a Mayer, ele também se colocava na cena do crime. Sargento Souza, no depoimento supostamente forjado, imputava os disparos ao sargento Alessandro Fábio. Ele também isentava de culpa outros dois envolvidos, o sargento da PM/ AL, José Mário De Lima Silva e Edinaldo Estevão De Lima, ambos peças-chave da ação criminosa.

A Justiça decidiu levar a Júri, de maneira separada, os réus no caso: Fredson José dos Santos, José Mário de Lima Silva e Edinaldo Estêvão de Lima; e Eudson Oliveira de Matos, Marcelo José Souza Da Silva e Marcos Maurício Francisco dos Santos. 

Outro depoimento realizado às escuras foi o de Josefa Nunes Flores, autora do assassinato do sargento Alessandro Fábio. Ao delegado Mayer, ela teria confirmado a tese de que seu marido tinha sido o autor do crime do ativista político.

“No dia 05 de junho de 2024, sem acompanhamento formal de qualquer advogado, também às escondidas, ouviu, no cartório da Delegacia Geral de Polícia Civil, Josefa Flores. E, a partir desse termo de declaração realizado às escondidas por Daniel Mayer, de Josefa Cícera Nunes Flores, entre outras informações, corroborou-se a fantasiosa tese do Sargento Souza e sugeriu-se que o executor de Kleber Malaquias teria sido seu falecido marido, o Policial Militar Alessandro Fábio da Silva. (…) Nesse viés, o Delegado de Polícia Daniel Mayer, ainda, na tentativa de dar ares de regularidade à sua manobra artificiosa iniciada no dia 29 de maio de 2024, ouviu, no dia 09 de julho de 2024, outro acusado do crime de Kleber Malaquias: o ex-policial militar Marcos Maurício Francisco dos Santos, principal interlocutor do também investigado, Jefferson Roberto Serafim Da Rocha, que, até àquele momento, ocupava o protagonismo na trama criminosa montada para dar cabo à vida da referida vítima. Cabe pontuar que, foi Jefferson quem serviu de elo entre os outros autores materiais e o intermediário do autor intelectual, o investigador da Polícia Civil do Estado de Alagoas Eudson Oliveira de Matos”.

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Prisão

O delegado Daniel Mayer foi preso na terça-feira, 17 de setembro, dois dias antes do julgamento de três dos seis acusados de envolvimento na morte do empresário Kleber Malaquias, assassinado a tiros em julho de 2020 em um bar em Rio Largo. A acusação seria o fato de Mayer usar sua posição de diretor da Polícia Judiciária da 1ª Região para inserir provas forjadas e produzidas em combinação com outros envolvidos para acusar o sargento Alessandro Fábio, morto pela esposa Josefa Cícera Nunes em março de 2022, do assassinato de Malaquias e inocentar um dos autores já pronunciado.

Daniel Mayer está respondendo por violação de sigilo profissional e fraude processual além dos delitos de inovação processual/investigativa por meio fraudulento, a obtenção de provas mediante métodos inidôneos e a dilação injustificada de procedimentos investigativos. Após a prisão do delegado, o julgamento dos réus foi adiado e deve acontecer em 17 de fevereiro de 2025.

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