‘Um dos mais radicais’ e ‘ponto focal’ com manifestantes: quem é o ex-auxiliar de Bolsonaro, preso em operação da PF

Mario Fernandes é general da reserva — Foto: Marcelo Camargo/Agência BrasilMario Fernandes é general da reserva — Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

A investigação da Polícia Federal que levou à prisão nesta terça-feira (19) de quatro militares do Exército e um policial federal descreve o general de brigada Mário Fernandes, um dos alvos da operação, como “um dos militares mais radicais” e influente nos acampamentos golpistas montados após a derrota de Jair Bolsonaro na eleição de 2022.

As informações constam da representação feita pela Polícia Federal ao Supremo Tribunal Federal (STF) para pedir a prisão dos suspeitos, que além de planejar um golpe de Estado para impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) também são suspeitos de tramar um atentado.

As investigações apontam que eles arquitetaram o assassinato de Lula, do seu vice Geraldo Alckmin e do ministro Alexandre de Moraes, que à época presidia o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Fernandes, que chegou a exercer o cargo de ministro interino do governo do ex-presidente Bolsonaro, é apontado pelas investigações como um dos responsáveis diretos por elaborar o plano.

O plano previa envenenar Lula e Moraes e, em seguida, instituir o “Gabinete Institucional de Gestão da Crise”, que deveria ser ativado em 16 de dezembro de 2022.

Havia, inclusive, uma minuta pronta para a sua criação – documento encontrado com o general Mário Fernandes.

O arquivo define a estrutura do gabinete que passaria a funcionar após o golpe, com o general Augusto Heleno como “chefe de gabinete” e o general Braga Netto como “coordenador-geral”. Heleno e Braga foram ministros de Bolsonaro.

Fernandes, conforme a minuta, ficaria na assessoria estratégica do órgão, que deveria “proporcionar ao Presidente da República maior consciência situacional das ações em curso a fim de apoiar o processo de tomada de decisão”.

Mário Fernandes em visitas ao acampamento do QG do Exército. — Foto: ReproduçãoMário Fernandes em visitas ao acampamento do QG do Exército. — Foto: Reprodução

Mensagens com integrantes de acampamento

Os policiais tiveram acesso a mensagens trocadas entre Fernandes e integrantes do acampamento instalado em Brasília, em frente ao Quartel General do Exército, o que reforçou a tese da influência do militar.

Segundo a PF, Fernandes “era o ponto focal do governo de Jair Bolsonaro com os manifestantes golpistas”. Recebia informações e provia material financeiro e orientações aos extremistas acampados.

“Ressalta a autoridade policial que os contatos com pessoas radicalizadas acampadas no QG do Exército reforça que o general Mario Fernandes possuía influência sobre pessoas radicais acampadas no QG-Ex, inclusive com indicativos de que passava orientações de como proceder e, ainda fornecia suporte material e/ou financeiro para os turbadores antidemocráticos”, menciona um dos trechos do documento do Supremo.

Diante disso, ele é descrito com “elevado grau de influência e liderança do intento golpista”. Outro ponto mencionado na investigação é o viés radical de Mario Fernandes.

“As provas trazidas pela autoridade policial apontam que Mário Fernandes (…) se trata, de fato, de um dos militares mais radicais que integrava o mencionado núcleo militar, fato que foi ressaltado pelo colaborador Mauro César Barbosa Cid em seu acordo de colaboração premiada”, cita.

 

A investigação identificou que, além de ir até o acampamento em Brasília, Fernandes trocava mensagens com outros militares, entre os quais Mauro Cid, ajudante de ordens de Bolsonaro, a fim de instigar o plano golpista.

Em dezembro, segundo a PF, Fernandes procurou o então ministro da Secretaria-Geral, general Luiz Eduardo Ramos, para que o chefe tentasse blindar Bolsonaro “contra qualquer desestímulo, qualquer assessoramento diferente”.

“Será possível que nós vamos atrasar 10 anos? O senhor tá vendo as coisas que tão acontecendo aí? Nós vamos atrasar 10 anos? Vocês não vão fazer nada? Não é possível, eu não acredito. Não tem condição”, afirmou Fernandes.

Punhal Verde e Amarelo

 

Segundo a PF, o documento de texto com o plano para executar Lula, Alckmin e Moraes foi criado por Fernandes em 9 de novembro de 2022. A investigação aponta que o militar, possivelmente, imprimiu o plano no Palácio do Planalto e, em seguida, foi até o Palácio da Alvorada.

O arquivo de Word, inicialmente denominado “Fox_2017.docx”, detalhou “Planejamento – Punhal Verde e Amarelo”, com informações diversas em tópicos para executar o plano golpista, entre as quais, armamento necessário e a ideia de envenenar Lula identificado com o codinome “Jeca” — Alckmin foi citado como “Joca”.

“Trata-se, a rigor, de um verdadeiro planejamento com características terroristas, no qual constam descritos todos os dados necessários para a execução de uma operação de alto risco”, descreveu a PF.

Reunião com estratégia golpista

 

Como ministro-substituto da Secretaria-Geral da Presidência, Fernandes participou de uma reunião no Palácio do Planalto, em 5 de julho de 2022, que discutiu estratégias golpistas para viabilizar a permanência de Bolsonaro no governo.

O militar foi uma das autoridades que falou no encontro, que teve a presença de Bolsonaro, ministros, assessores e cúpula militar. Ele defendeu ações antes das eleições, que seria realizada em outubro.

“No momento que acontecer, é 64 de novo? É uma junta de governo? É um governo militar? É um atraso de tudo o que se avançou no país? Porque isso vai acontecer. O país vai ser todo desarticulado”, disse.

“Então, tem que ser antes. Tem que acontecer antes. Como nós queremos. Dentro de um estado de normalidade. Mas é muito melhor assumir um pequeno risco de conturbar o país pensando assim, pra que aconteça antes, do que assumir um risco muito maior da conturbação no ‘the day after’, né? Quando a fotografia lá for de quem a fraude determinar”, acrescentou.

Carreira militar

 

Segundo dados do Exército, Fernandes, natural de Brasília, iniciou a carreira militar em 1983, na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), e foi promovido em 2016 a general de brigada (duas estrelas), o primeiro dos três postos da carreira de oficial general.

Ele comandou de 2018 a 2020 o Comando de Operações Especiais, localizado em Goiânia, responsável por formar os militares chamados de “kids pretos”. Esse grupo de elite do Exército tem integrantes envolvidos na trama investigada pela PF.

Em 2020, Fernandes passou para a reserva do Exército e assumiu cargos o governo de Jair Bolsonaro, entre os quais, o de secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência, o segundo posto na hierarquia da pasta.

Foi nesse meio-tempo, em algumas ocasiões, que ele exerceu a função de ministro interino.

Fonte: G1

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