A senadora Damares Alves (Republicanos-DF) ingressou com uma ação na Justiça Federal nesta terça-feira (24) para anular a resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) sobre o aborto legal em crianças e adolescentes.
Na segunda-feira (23), o conselho, ligado ao Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, aprovou por 15 votos a 13 as diretrizes para a realização do atendimento humanizado e especializado para menores de idade com direito ao procedimento para interromper a gestação. Representantes do governo votaram contra a resolução.
No pedido, protocolado na 20ª Vara Federal Cível, a senadora pede que a resolução seja impedida de ser publicada no Diário Oficial da União (DOU). A parlamentar ainda requer a nulidade da 4ª Assembleia Geral do Conanda, que aprovou as diretrizes.
Ex-ministro das Mulheres, Família e Direitos Humanos do governo de Jair Bolsonaro (PL), Damares alega atropelo regimental diante do pedido de vista apresentado pela Casa Civil para suspender a análise da proposta, o que foi rejeitado pela presidente do Conanda, Marina De Pol Poniwas.
“Nós acompanhamos a reunião e nós vimos que teve divergência. Por exemplo, o governo inteiro se absteve de votar e o governo pediu vista da minuta. Tem uma nota da Conjur do Ministério de Direitos Humanos apontando irregularidades na minuta. Então, por conta disso, é que eu gostaria que a resolução não fosse publicada sem antes haver o debate jurídico considerando parecer do Ministério de Direitos Humanos”, disse a senadora à CNN.
A resolução do Conada possibilita acesso ao aborto a crianças e adolescentes grávidas que relatarem gestação “resultante de abuso sexual ou em caso de risco de vida da gestante ou anencefalia do feto”.
Entre as diretrizes, estão:
- Encaminhamento direto aos serviços de saúde sem necessidade de autorização prévia de responsáveis; _Escuta especializada para vítimas de violência sexual, garantindo um ambiente respeitoso e seguro;
- Prioridade ao desejo da criança ou adolescente em casos de divergência com os responsáveis legais, com suporte da Defensoria Pública ou Ministério Público;
- Obrigatoriedade de comunicação de casos ao Conselho Tutelar, à autoridade sanitária e à polícia, sem que isso condicione a realização do procedimento.
Em nota, o Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania informou que “questionou insistentemente” os termos da resolução e fez um pedido de vista — que suspende a discussão por alguns dias.
“Em seguida, [o governo] solicitou parecer da Consultoria Jurídica do Ministério. O parecer indicou, entre outros aspectos, que a minuta de Resolução apresentava definições que só poderiam ser dispostas em Leis – a serem aprovadas pelo Congresso Nacional, indicando a necessidade de aperfeiçoamento e revisão de texto, garantindo maior alinhamento ao arcabouço legal brasileiro”, alegou a pasta.
O argumento, no entanto, acabou derrotado.
Como mostrou o âncora Gustavo Uribe, a deputada federal Júlia Zanatta (PL-SC) informou à CNN que apresentará um projeto de decreto legislativo para cancelar a resolução.
O aborto é legal no Brasil em casos de estupro, quando a gestação oferece risco à mulher e em casos de fetos com anencefalia.
Nesses casos, não há na legislação brasileira limite máximo de tempo para a interrupção da gravidez.
DIVERGÊNCIA
Na tarde desta terça-feira, representantes da sociedade civil no Conanda divulgaram uma nota acusando o Ministério dos Direitos Humanos de usar “estratégias de atraso” na elaboração da resolução em questão.
“A aprovação ocorreu democraticamente por maioria, evidenciando a legitimidade da resolução. Durante as discussões, a sociedade civil se empenhou em garantir a construção coletiva, porém, enfrentou estratégias de atraso por parte do governo”, diz a nota.
De acordo com os representantes, a resolução era debatida desde setembro de 2024 em reuniões que envolviam conselheiros e especialistas, conduzidas por uma comissão do Conanda. No entanto, o processo teria sido marcado por diversas ausências de conselheiros governamentais em encontros decisivos.
A nota afirma ainda que o governo fez intervenções pontuais só na fase final da discussão. Anteriormente, o governo teria reafirmado a necessidade da medida, sem propor qualquer ajuste concreto.