Com nova geração, PT e acenos a evangélicos, Paes entra em “ano-chave”

Tomaz Silva/Agência Brasil

Em um posto próximo à Praça da Cruz Vermelha, o frentista avisa: “estamos sem água, as torneiras foram arrancadas pelo dono”. A medida não foi consequência de um problema no abastecimento, mas da segurança. A água era usada por usuários de droga que circulam pelo centro da cidade na madrugada.

São quase 8 mil pessoas em situação de rua no Rio de Janeiro, segundo o censo da prefeitura. E esse número, divulgado em 2023, vem crescendo nos últimos anos, à medida que a sensação de insegurança ainda rouba o sono dos residentes da capital fluminense.

Embora não seja atribuição primária da Prefeitura, o prefeito Eduardo Paes (PSD) chega ao quarto mandato, agora em 2025, com a inevitável missão de enfrentar, como nunca antes, as questões relacionadas à segurança urbana. Oito fontes ouvidas pela CNN afirmam que esse será um dos pontos centrais da nova gestão, queira Paes ou não. São pessoas que compõe o governo e a base ou fazem parte da oposição, mas concordam com essa afirmação.

Entre outras medidas, as câmeras têm sido uma estratégia de enfrentamento do problema. Em janeiro do ano passado, Paes lançou o Civitas, um “cerco inteligente”, que nada mais é que uma central de monitoramento, 24 horas, das ruas da cidade. Com recursos de inteligência artificial, identifica atividades suspeitas e veículos roubados.

Ao longo do ano, a Secretaria de Ordem Pública ainda fez ações para desmontar feiras de rua em Acari, bairro da zona norte, e no centro, mais especificamente na rua Uruguaiana, próxima à Saara, tradicional ponto voltado ao comércio popular.

A motivação passa por um rosário de irregularidades, que vão desde fraude fiscal até comercialização dos produtos roubados e envolvimento com o crime organizado. O problema foi considerado resolvido nos dois locais, mas as fontes ouvidas pela CNN ainda apontam gargalos em outros bairros da zona oeste, como os calçadões de Campo Grande e Bangu.

PARCERIAS E DESAVENÇAS COM CASTRO

As ações em Acari e na Uruguaiana tiveram uma parceria firmada com o governo de Cláudio Castro (PL). Assim como operações contra o tráfico no Complexo da Maré, que envolveram a demolição de imóveis construídos irregularmente.

Paes e Castro, no entanto, entraram em rota de colisão na campanha eleitoral do ano passado. O candidato do governador e de Jair Bolsonaro (PL), ex-presidente, era Alexandre Ramagem, que pertence ao mesmo partido.

Eduardo Paes e Cláudio Castro se acusaram de “estelionatários”, num debate que passou por coligações partidárias e segurança pública, e atravessou a campanha. As principais críticas de Paes foram justamente às políticas e indicações para a gestão da segurança do estado. “Tragédia”, definiu o prefeito sobre a política do governador. “Extrapola a boa convivência”, respondeu Castro.

Adversários indiretos em 2024, Castro e Paes já têm um duelo encomendado para 2026. O governador não poderá tentar a reeleição, porque já está no segundo mandato, mas escolherá um sucessor do mesmo campo político.

Eduardo Paes será candidato ao governo, preveem adversários e aliados ouvidos pela CNN. Se confirmada a pretensão que o faria protagonizar uma disputa contra alguém escolhido por Castro, há um desafio político importante pela frente.

2025 COM UM PÉ EM 2026

“É prematuro pensar em um nome para o governo do Rio”, disse Paes em entrevista à CNN logo depois de ter sido reeleito para o quarto mandato. Ele afastou essa possibilidade, em linha com a declaração de que ser prefeito da cidade “é o melhor emprego do mundo”.

Na formação do novo governo, Paes – que tem 55 anos – privilegiou um grupo mais próximo, uma espécie de núcleo duro, políticos da nova geração, apelidados ironicamente, por opositores, como “menudos”.

Deputados federais do PSD, Daniel Soranz e Renan Ferreirinha continuarão no comando das secretarias de Saúde e Educação. Soranz tem 45 anos e Ferreirinha, 31. O delegado Brenno Carnevale, 33, seguirá na Secretaria de Ordem Pública. Diego Vaz (PSD), 35, que foi subprefeito da zona norte, cuidará do setor de Conservação e Serviços Públicos.

Leandro Matieli, 43, que também foi subprefeito, comandará a Casa Civil. Aos 30 anos, o advogado Lucas Padilha será secretário de Cultura. Outro ex-subprefeito promovido foi Edson Menezes, que chefiava a administração da zona oeste e agora cuidará do departamento de Coordenação Governamental.

A conta fecha com um nome crucial para entender o perfil da quarta gestão Paes: Eduardo Cavalieri. Novo vice escolhido pelo prefeito, ele tem 30 anos de idade e assumirá a gestão da cidade caso Eduardo Paes decida tentar o governo.

Vereadores ouvidos pela CNN apontam que ele não deve ter essa mesma habilidade de Paes para aglutinar a base e manter uma relação confortável junto à Câmara.

O cenário transforma 2025 no ano-chave para Eduardo Paes, já que ele teria que deixar a prefeitura ao fim do primeiro trimestre de 2026 caso queira disputar o governo, tendo assim que garantir seus cartões de visita eleitorais ainda neste ano.

BALAIO DE IDEOLOGIAS

Os nomes mais próximos do prefeito, de confiança direta, são vistos como políticos sem ideologia marcada, que possuem pensamentos mais ao centro, e forte compromisso com entregas.

Esse perfil chamou atenção de políticos cariocas ouvidos pela CNN, que esperavam um rateio maior entre partidos, começando a construir uma base forte, pensando em eventual aliança nas eleições para o governo do próximo ano.

A coligação que elegeu Paes tem 12 partidos e vai da esquerda (de PT e PCdoB) à direita, do Democracia Cristã. Mas a base que sustenta o feito tem integrantes de todos os espectros políticos. Só do PT são pelo menos quatro secretários anunciados. Além dos “40 menos”, a lista tem políticos tradicionais, conservadores e progressistas, nomes de esquerda, centro e direita.

Os diálogos e movimentos sugerem que Paes poderá ser o candidato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao governo do Rio de Janeiro em 2026. O desafio para ele, no entanto, é que um avanço do conservadorismo pelo estado garantiu a expressiva reeleição de Cláudio Castro. Com mais de 58% dos votos logo no primeiro turno, conseguiu agregar diversas legendas da direita, que podem novamente se reunir em torno do nome para enfrentar Eduardo Paes. Em 2022, Bolsonaro venceu Lula em 72 das 92 cidades do estado.

ACENOS AOS EVANGÉLICOS

Os evangélicos foram contemplados, no novo governo, com a escolha de Otoni de Paula Neto, filho do deputado Otoni de Paula (MDB), que se voltou contra o partido que havia decidido apoiar Ramagem. Ele comandará a Secretaria de Cidadania e Família.

Mas não só. No meio de dezembro, Paes anunciou o “Parque Terra Prometida”, em Santa Cruz, na zona oeste, como promessa para turismo religioso. “Um lugar de congregação, peregrinação e para a realização de eventos religiosos, que fará bem ao corpo e à alma”, disse o prefeito no anúncio.

TRANSPORTE PÚBLICO

No fim do ano passado, o programa BRT Seguro bateu mais de 4 mil prisões. A estratégia também foi pela instalação de câmeras. O sistema sofreu intervenção da Prefeitura depois de problemas com a concessionária que administrava esse serviço. As pessoas presas cometeram crimes de vandalismo ou calote, entre outros.

Há, no entanto, uma meta de trocar o modelo de mobilidade, BRT por VLT, com as rodas dando lugar a trilhos. A licitação está prevista para este ano.

Hoje, o VLT funciona apenas em trajetos curtos no Centro do Rio de Janeiro.

A questão do transporte público também é citada por interlocutores de Paes como desafio importante, que se impõe logo no início desse quarto mandato.

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