O então garoto do placar do charmoso estádio de Moça Bonita, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, não tem como esquecer aquele 22 de junho de 1991. Se os dias modificando o marcador da bucólica arena eram por vezes monótonos, aquele foi seu auge profissional: fora exigido por dezoito vezes em apenas noventa minutos. Naquela data, o Bangu obtivera a maior goleada de sua história. Contra um dos maiores clubes do mundo. Ou, faça-se o rigor da História, algo semelhante a isso.
Primeira, terceira ou nenhuma?
“Temos que manter o bom nível das atuações e este amistoso será muito importante. Afinal, são duas escolas diferentes de futebol.”
Quando o técnico Paulo Massa disse estas palavras ao finado Jornal dos Sports pelos idos de junho de 1991, não imaginava o que estava para acontecer na história do Bangu Atlético Clube. A notícia do periódico era taxativa: no próximo dia 22, o gramado de Moça Bonita seria palco de um amistoso contra um poderoso time inglês.
“O Bangu pretende apresentar algumas novidades em seu time no amistoso de amanhã, contra o Manchester United, às 15h30, em Moça Bonita [..] O presidente Rubens Lopes da Costa acredita numa boa renda e por isso fez um apelo à torcida para lotar Moça Bonita amanhã à tarde. O time inglês está excursionando pela América do Sul com relativo sucesso e será uma grande atração”, escreveu o mesmo jornal.
No dia marcado para o jogo, um susto coletivo. O adversário que veio a campo pouco se assemelhava ao time multi-campeão do futebol britânico. De fato, o que os jogadores do Bangu encontraram sequer parecia uma equipe de futebol.
“O que nos foi passado é que iríamos jogar contra o Manchester. A gente não sabe se foi uma decisão política, se tinha dinheiro envolvido… mas você, dentro de campo, não tinha como não notar. Você abafa, não conta nada”, desconfia Serginho, ex-atacante do Bangu que balançou três vezes as redes do que seriam os Red Devils.
“A gente estranhou, porque foi muito fácil. Jogamos contra pessoas que sequer podem ser caracterizadas como atletas”, depõe ele, que hoje se ocupa como profissional de Educação Física em Uberlândia-MG.
A dificuldade de obtenção de material sobre campeonatos europeus da época embaralhou até mesmo o lendário Jornal dos Sports, principal fonte documental sobre a misteriosa partida. Na edição do dia seguinte do jogo, é possível encontrar informações contraditórias: o Manchester goleado pelo Bangu seria, agora, um time de outra divisão.
“O Bangu, mesmo jogando com um time misto, não tomou conhecimento do Manchester, equipe da terceira divisão do futebol inglês, e aplicou uma goleada histórica de 18 a 0 ontem, em Moça Bonita”, relata o periódico, adotando um tom diferente e retirando o “United” do complemento.
Uma pesquisa rápida, no entanto, elimina esta hipótese. Entre os anos de 1989 e 1991, nenhuma equipe da cidade disputou a terceira divisão do futebol inglês. Além disso, nem United nem City, os dois maiores clubes de Manchester, realizaram amistosos na América do Sul naquele ano.
A farsa dos turistas ingleses
“O que entrou para a história é que eram turistas. Os caras estavam completamente fora de forma, barrigudos, alguns aparentavam quarenta anos”, relata Carlos Molinari, pesquisador e autor de livros como o Almanaque do Bangu.
“É difícil encontrar informações sobre esse jogo, porque os atletas em geral não têm essa memória toda. O próprio Rubinho (Rubens Lopes, presidente do Bangu na época e, hoje, mandatário da Federação Carioca de Futebol) não tem essa recordação”, lamenta.
Mesmo sem saber exatamente contra quem o Bangu jogou no fatídico 22 de junho, a partida ficou na história do clube como sua maior goleada em todos os tempos. No acervo oficial, consta um registro de “Bangu 18×0 Combinado de Manchester”. Na memória popular, a gravação é mais charmosa: “O dia em que o Bangu tomou um balão e, sem saber, jogou contra um grupo de turistas ingleses com a camisa do Manchester United”.