Considerado um dos maiores golpistas do país, Marcelo Nascimento da Rocha, cuja história inspirou o filme “VIPs – Histórias Reais de um Mentiroso”, vive atualmente de palestras e treinamentos sobre técnicas de vendas e como usar o poder de persuasão. O cachê varia entre R$ 6 mil para eventos em Mato Grosso e R$ 8,5 mil para outros estados. Aos 38 anos, ele vive em Cuiabá com a mulher e a enteada de 15 anos, e diz que não se arrepende dos crimes que cometeu. "Não faria de novo, mas seria hipócrita em dizer que me arrependo. Porque vivi muitas coisas bacanas. Mas, descobri que ter uma vida decente é imensamente mais prazeroso do que ficar sofrendo na prisão. Não vale a pena isso", diz Marcelo Nascimento.
Entre outras coisas, Marcelo é acusado de aplicar golpes em pelo menos quatro estados, incluindo comercializar coisas inexistentes. "Eu vendia coisas absurdamente incríveis e que nenhuma pessoa compraria, em sã consciência. Tipo terreno no mar. Cheguei a vender vários, um condomínio quase", conta. Mas o episódio mais famoso envolvendo o falsário foi quando fingiu ser o filho do dono de uma das maiores companhias aéreas do país durante entrevista a um programa veiculado em rede nacional.
Condenado por crimes como associação ao tráfico, roubo de avião, estelionato e falsidade ideológica, ele foi preso em 12 estados diferentes e fugiu nove vezes. Mas garante que não quer mais viver daquela maneira. "A vida de um foragido não é fácil. Eu tive que abrir mão de viver, de ver meu filho crescer. Hoje ele tem 14 anos. Então, todas essas coisas me levaram a querer uma mudança de vida", justifica.
Marcelo Nascimento saiu há aproximadamente seis meses da Penitenciária Central do estado (PCE), após conseguir progressão para o semiaberto. Como Mato Grosso não tem estrutura adequada para esse tipo de regime, ele acabou se beneficiando da prisão domiciliar, após comprovar que tinha trabalho. Mas, começou na quarta-feira (3) a usar tornozeleira eletrônica, pela qual é monitorado 24 horas por dia.
Hoje ele planeja as palestras e treinamentos em um pequeno escritório localizado numa avenida da capital, onde recebeu a reportagem do G1. "Na verdade, eu descobri que conseguia usar minha inteligência pra um lado positivo. Dou palestras no Brasil inteiro, com autorização da Justiça, porque é meu trabalho. São sobre técnicas de venda, o poder de persuasão usado de forma positiva, para se efetuar uma venda. Dou treinamento para líderes de equipe e presto consultoria de ação promocional, marketing", explica.
As dicas são baseadas na própria experiência de vida dele. No panfleto das palestras, ele é apresentado como Marcelo Nascimento VIP, e é classificado como uma pessoa com ‘alto índice de inteligência e dinamismo’.
Rotina e renda
A rotina atual é regrada, diz Marcelo, mas ele diz preferir assim. "Estou recuperando minha vida, que é extremamente pacata. Acordo às 6h pra trabalhar, gosto do meu dia a dia, não troco o crédito que tenho hoje por nada daquela vida antiga que eu tinha. Tenho contrato fechado de um ano para treinamento em Rondonópolis [a 210 km de Cuiabá], tenho empreendimento no interior às bases de fechar contrato. Está faltando Marcelo pra tanto trabalho", afirma.
Ele também recebeu parte do dinheiro pelo filme, direitos autorais, e complementa a renda com a locação de equipamentos para eventos. "Tenho uma renda bacana", reconhece. Marcelo Nascimento tem apartamento em Cuiabá, casa em Chapada dos Guimarães – distante 65 km da capital e um dos principais locais turísticos do estado – e paga escola particular para o filho e para a enteada. "E tenho também conta em banco e plano de saúde. Aliás, até meu cachorro tem plano de saúde", celebra.
Marcelo é reconhecido pelas ruas da cidade, garante. "Vou ao shopping e as pessoas pedem pra tirar foto. Sou reconhecido, mais até do que gostaria. Tenho legião de fãs, justamente pela inteligência, por conseguir sair de certas situações".
Crimes e condenações
As condenações somam 33 anos de prisão, dos quais Marcelo Nascimento já cumpriu 14 anos – se contadas todas as vezes em que esteve preso em diferentes locais do país. A última foi em Rondônia, de onde foi transferido para Mato Grosso, onde passou o maior período preso – cinco anos.
Entre as coisas que ele diz que não teria feito na vida estão as fugas. "Foi uma burrice. Uma das principais, talvez. Porque se eu não tivesse fugido, eu já teria cumprido a minha pena há muito tempo". E ficar preso, além do óbvio sofrimento por não se ter mais liberdade, também foi dolorido para ele por um motivo relacionado ao próprio ego.
"O processo de você pagar a pena quando você é uma pessoa extremamente conceituada dentro do crime, é uma coisa muito difícil, você tem que entrar em processo de resignação. Esse processo é uma coisa dolorosa, porque você tem que esquecer tudo e saber que está ali pagando uma coisa que fez, para sair de cabeça erguida", afirmou.