FMI alerta para bolhas imobiliárias em países ricos e emergentes

Fundo vê alta no mercado imobiliário e destaca avanço de 7,4% no Brasil.

Kostas Tsironis / BloombergMansão em ruínas à venda em Atenas. Na Grécia, o preço dos imóveis caiu 7%

Mansão em ruínas à venda em Atenas. Na Grécia, o preço dos imóveis caiu 7%

O fantasma de uma bolha imobiliária global começa a preocupar o Fundo Monetário Internacional (FMI). A instituição lançou ontem na internet uma compilação de dados do setor, o Observatório Imobiliário Global. Ao apresentar a página, o assessor do Departamento de Pesquisa do Fundo, Prakash Loungani, explicou que a ferramenta, que terá atualizações trimestrais, poderá servir de alerta para os governos. A bolha imobiliária também foi abordada pelo vice-diretor-gerente do FMI, Min Zhu.

Em seu blog, ele observa que os preços dos imóveis voltaram a subir, depois de recuarem em meio à crise financeira global de 2008, e faz um alerta: “É preciso nos resguardarmos contra outra alta insustentável”. O Fundo verificou que os preços de imóveis subiram em vários países, tanto ricos, como Austrália e Estados Unidos (ambos em 6,6%) quanto emergentes, como Brasil (7,4%) e China (9%). Analistas ouvidos pelo GLOBO, porém, minimizam os riscos de uma bolha no país.

Otaviano Canuto, consultor sênior para os Brics (grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) no Departamento de Desenvolvimento Econômico do Banco Mundial, diz que não vislumbra no Brasil formação de bolha imobiliária. Para ele, houve ajuste de preços relativos, que devem se estabilizar em patamares elevados.

— Já começa a haver uma reversão, algum declínio, mas não vejo um derrame de imóveis no mercado que vai derrubar os preços — assegura.

Canuto afirma que, na verdade, o FMI criou parâmetros para acompanhar o mercado imobiliário, a ponto de prever bolhas que antecederam crises econômicas de grandes proporções.

— Eles criaram um termômetro para estabelecer comparações, num campo em que havia dificuldade para conseguir os dados.

JUROS BAIXOS ALIMENTARAM CRISE NOS EUA
Zhu havia abordado o tema na semana passada em uma conferência no Bundesbank, o banco central alemão. O texto, no entanto, não foi divulgado na ocasião. Segundo o jornal britânico “Financial Times”, o adiamento foi para evitar um conflito com a decisão do Banco Central Europeu (BCE) de deixar a taxa básica de juros da zona do euro em patamar negativo. Um dos fatores a alimentar a bolha imobiliária nos Estados Unidos, que levou à crise de 2008, foi a política de juros baixíssimos adotada pelo Federal Reserve (Fed, o BC americano) para estimular a economia após os atentados de 11 de setembro de 2001.

Para o diretor de Centro de Economia Mundial da Fundação Getulio Vargas (FGV) e ex-presidente do Banco Central Carlos Langoni, não há risco de bolha no horizonte, nem na Europa, nem nos Estados Unidos e, muito menos, no Brasil.

— No caso brasileiro, a valorização dos imóveis é muito diferente das bolhas nos Estados Unidos, na Espanha e no Japão. Nesses países, as bolhas foram consequência de juros reais (descontando a inflação) muito baixos e até negativos (menor que a inflação) por longo período de tempo. Isso é uma anomalia e não deve ser observada em uma economia equilibrada.

Já o Brasil sofre da doença “ao contrário”, com juros reais entre os maiores do mundo, diante da nossa necessidade de consolidar a estabilidade após décadas de inflação explosiva. Para Langoni, a valorização vem do déficit crônico habitacional brasileiro, da falta de estímulo à construção civil e da renda estagnada.

— A expansão da renda alimentou a demanda por novos imóveis. E a oferta respondeu com defasagem, como sempre acontece. Também apareceram nesse mercado novos atores, com os bancos privados oferecendo crédito habitacional, além da mobilidade social, com a classe média tendo acesso à casa própria — explica Langoni.

Ele chama a atenção para o fato de as altas mais fortes no mercado imobiliário brasileiro estarem concentradas nas grandes metrópoles, citando a Zona Sul do Rio e os Jardins, em São Paulo.

— No resto do país, esse avanço é menor — afirma o economista. — A situação no Brasil se encaminha para uma normalização. A oferta de imóveis está maior e o crédito, mais seletivo.

Nos Estados Unidos, os preços, segundo ele, ainda estão em recuperação. Não voltaram aos patamares de antes da crise de 2008. A Europa, que está com juros negativos — exibindo, portanto, uma das condições para formar uma bolha imobiliária —, também não preocupa Langoni. Na opinião do economista, os Estados Unidos já avisaram que vão começar a subir a taxa básica de juros no ano que vem, e a Europa deve começar esse processo em 2017.

DISPARIDADE ENTRE PREÇO E RENDA
Um dos critérios usados pelo FMI para apurar uma possível bolha imobiliária foi o valor dos imóveis em relação à renda do país. Nesse caso, as maiores disparidades são observadas em Bélgica, Canadá e Austrália. Quando se considera a proporção entre os valores do imóvel e os de aluguel, as maiores diferenças estão em Canadá, Nova Zelândia e Noruega.

Essa diferença entre alta do rendimento e preço dos imóveis chama a atenção do professor de Economia Internacional da UFRJ Luiz Carlos Prado, por ser uma situação observada no Brasil. Para ele, há uma alta generalizada nos preços de imóveis no país:

— Tecnicamente, os riscos não aparecem no Brasil, mas esses preços não são sustentáveis a longo prazo. A renda média não está subindo na mesma velocidade. Não quer dizer necessariamente que isso leve a uma queda súbita de preços, mas, se houver um aperto monetário muito forte, o proprietário pode se ver obrigado a queimar suas reservas e provocar uma queda mais rápida nos preços.

Zhu, do FMI, reconhece que as ferramentas para controlar a disparada dos preços dos imóveis ainda estão sendo desenvolvidas, mas ressalta que isso não pode ser uma desculpa para não agir. “Precisamos passar da fase da ‘negligência benigna’ para uma abordagem abrangente no que diz respeito à escolha de políticas econômicas”, afirma em seu blog.

Fonte: O Globo

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