Um usuário do Facebook criou páginas na rede social que dão dicas sobre como abusar de mulheres no transporte público e incentiva o estupro, o ódio entre gêneros e a violência contra o sexo feminino. Ele se identifica como Magno Mendes, de Goiânia (GO), e é responsável pelo desenvolvimento e manutenção de ao menos duas comunidades voltadas para os abusos em ônibus e vagões de metrô – "Encochadores" (sic) e "A Arte de Encochar" (sic).
Com quase mil seguidores, a "Encochadores" traz em sua linha do tempo uma série de vídeos cujo conteúdo mostra homens roçando o pênis ereto em nádegas de mulheres dentro de algum transporte público. As chamadas para as mais recentes imagens são "Bundinha Perfeita da Novinha encochada (sic) no ônibus", "Delicia Novinha no Ônibus" e "Encochada numa Bundinha Perfeita". Na mesma página, o usuário anunciou, na madrugada desta sexta-feira (16), a criação da segunda comunidade voltada ao assunto.
"Ontem foi tudo de bom na (estação de metrô de São Paulo da) Sé. Essa (mulher) me fez gozar encoxando da Sé até o (metrô) Tatuapé. Que delícia de loira", escreveu um dos seguidores, identificado como estudante universitário de São Paulo. Na manhã desta sexta-feira (16), o mesmo usuário postou: "Alguma gata aqui de São Paulo que curta uma brincadeira no metrô está afim?"
Em sua página pessoal, o criador das comunidades faz questão de expor publicamente todo o seu "apreço" pelas mulheres. "Mulher é um lixo de merda que para nada serve, só para dar o cú", escreveu em caixa alta sob o post de um vídeo pornográfico de sexo anal, durante a semana. Confrontado por usuários da rede social, ele não demonstra temer punições.
"Leva pra polícia, então", postou em uma discussão que travava na tarde desta sexta-feira, marcada por imagens de mulheres amarradas em rituais sadomasoquistas com a frases como "mulher só serve para isto". "Eu, estuprador, e vocês, putas vadias"; "mulher é lixo" e "mulher é merda pura" estão entre as frases dos confrontos recentes.
Série de crimes
Informado sobre o conteúdo das comunidades por meio do iG, o promotor Alfonso Presti, especialista em crimes de intolerância do Ministério Público de São Paulo, garantiu que tomará medidas imediatas para investigar o usuário da rede social e, eventualmente, puni-lo. "Baixarei uma portaria para analisarmos isso. O material será baixado; o Facebook, comunicado para tirar as páginas do ar; e o responsável, identificado para o levarmos a julgamento", afirma Presti. "A princípio, o que temos é um ato criminoso que cria uma cultura de ódio de gêneros."
Além de apologia e incitação ao crime de estupro, classificado como hediondo pelo Código Penal brasileiro, Magno pode responder por uma série de outras infrações, como explica Luiz Cogan, advogado criminal e mestre em Direito Penal pela Pontífica Universidade Católica (PUC).
Caso seja comprovado, por exemplo, que os vídeos de encoxadas em transportes públicos tenham sido feitos pelo criador da página, o jovem poderá ser processado por "violação mediante fraude", que significa a prática de ato libidinoso contra manifestação de vontade da vítima, com pena de dois a seis anos em regime fechado.
E não para por aí. Caso uma das vítimas resolva prestar queixa contra o abuso e alegar que houve ameaça ou violência no ato, Magno pode responder por estupro, cuja pena chega a dez anos em regime fechado. Se a vítima for menor de 14 anos, então, não precisa nem haver a ameaça: automaticamente, o crime passa a ser chamado de "estupro de vulnerável", que pode lhe dar de oito a 15 anos de cadeia.
"A regra em crimes sexuais é que a ação penal seja condicionada à representação, ou seja, é preciso ir à delegacia para denunciar. Mas, de todo modo, ele deve responder pela apologia ao estupro", explica Cogan. "Além do incentivo à prática para milhares de seguidores, esse conteúdo demonstra a clara impunidade de um criminoso desse porte. Ele acha que ficará impune, provoca, desafia as autoridades. E a impunidade gera e prolifera a criminalidade."
Com mais de 1.400 amigos em sua página pessoal, Magno pode ainda responder pela postagem de vídeos e fotos pornográficas, os quais utiliza para proliferar suas ideias completamente distorcidas da sociedade. "Se comprovarmos que ele tem entre seus seguidores menores de 14 anos, isso baterá direto nas leis do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e as repercussões serão ainda mais graves em termos de pena", resume o promotor Presti.
Procurado pelo iG, o criador das páginas não se manifestou até o fechamento desta reportagem.