A blogueira cubana Yoani Sánchez fez uma crítica ao governo brasileiro nesta quinta-feira (21) durante palestra no auditório do jornal “O Estado de S. Paulo”, em seu primeiro evento oficial na capital paulista. Questionada sobre a relação do governo brasileiro com Cuba, ela disse que houve um estreitamento nos laços nos mandatos de Lula e de Dilma Rousseff, mas que “falta dureza para o tema dos direitos humanos”.
“No caso do Brasil, há existido muitos silêncios. Recomendaria um posicionamento mais enérgico, pois o povo não esquece”, disse Yoani.
A blogueira cubana chegou a São Paulo após ficar um dia em Brasília, onde teve uma passagem tumultuada nesta quarta-feira (20) pelo Congresso Nacional. Sobre isso, ela disse que foi sua primeira visita a um Congresso em outro país e que observou que há entre os políticos brasileiros uma dualidade entre a seriedade e a informalidade. "Não imaginava que me dariam tanta repercussão", disse ela.
Ao longo das cerca de três horas em que esteve na casa legislativa, houve empurra-empurra, discussões acaloradas entre parlamentares e até mesmo uma confusão envolvendo um deputado e manifestantes que protestavam contra a visita da blogueira cubana.
Na palestra em São Paulo, ela falou sobre os protestos (que também sofreu em Feira de Santana, na Bahia) e afirmou que já sabia que poderia enfrentar tais situações, pois havia lido ameaças na Internet. Para Yoani, qualquer um pode manifestar sua opinião, “mas quando se passa do limite do protesto não é democracia, é fanatismo.”
Yoani disse que não imagina uma possível transição de poder ocorrendo em meio a essa "situação de enfrentamento" entre os EUA e a ilha.
"Acho que Cuba, em 2015, vai ser uma Cuba bem melhor, mais inclusiva e mais plural. Mas imagino que será uma nação difícil de governar", disse. A blogueira acredita que as reformas econômicas introduzidas pelo presidente Raúl Castro, irmão mais novo de Fidel, "vão num ritmo muito lento". "Mas essas reformas eram impensáveis sob Fidel, pois se queria controlar cada aspecto da vida social", disse.
"Eu não acho que em Cuba há um socialismo, nem se chegou ao comunismo", afirmou. "Eu acho que em Cuba se vive um capitalismo de Estado, em que o patrão é o governo."
Questionada sobre a "diferença de estilo" entre Fidel e Raúl, Yoani afirmou que Fidel "gostava da repressão como um show", mas seu irmão "gosta de não deixar rastro".
A blogueira cubana também comentou sobre seu blog, que tem tradução para mais de 20 línguas – todas feitas por voluntários. "Minha rotina é a anti-rotina. Desde que abri o blog, minha vida virou ao contrário. Antes meus amigos me diziam que eu tinha o dom da invisibilidade", disse. "O blog me trouxe repercussão, as pessoas me reconhecem na rua. A fama é um efeito colateral do meu trabalho."
Questionada a respeito de um suposto documento vazado pelo site Wikileaks que a ligaria à agência de inteligência americana, a CIA, ela negou a autenicidade. "Isso não é verdade. Nenhum documento fala isso. Nem poderia, pois eu não sou da CIA."
Yoani também falou da sua relação com o senador Eduardo Suplicy (PT-SP). "Suplicy é uma das razões pelas quais estou aqui. [Minha vinda] se tornou uma batalha pessoal para ele […] e nos momentos de maior intolerância, se comportou à altura do respeito às diferenças."
Depois do Brasil, Yoani irá para a República Tcheca e Alemanha. Ela pretende ainda ir aos Estados Unidos em março, onde terá uma programação em universidades e irá visitar parte da família que mora lá.