Um mestrado na Inglaterra rendeu prestígio hollywoodiano à montadora Lívia Serpa, de 32 anos. Ela fez a edição de "Boogaloo and Graham", curta-metragem britânico que concorre ao Oscar 2015 (assista ao trailer acima). "Vai ser uma experiência um pouco surreal estar lá depois de ver tanto pela TV. Vou ter que me beliscar algumas vezes", diz, ao G1, sobre ir à cerimônia de premiação, que acontece no dia 22 de fevereiro.
Nascida em Petrópolis e formada em cinema pela Universidade Federal Fluminense, Lívia mudou-se para Londres em 2010, onde estudou montagem na National Film and Television School. Lá, ela conheceu o diretor Michael Lennox, que a chamou para a equipe de "Boogaloo and Graham". "Ele me mostrou o roteiro desse curta quando a gente ainda estava no mestrado, há uns três anos. E, há um ano, ele me mandou um e-mail falando que tinha conseguido investimento da Northern Ireland Screen [agência de cinema da Irlanda do Norte]", conta.
Lívia conta que tudo aconteceu bem rápido. "Michael filmou em três dias em Belfast e mandou os HDs para minha casa por correio. Passou uma semana e mandei de volta os HDs, e, em um mês, o filme já estava estreando no festival da Irlanda. A gente não esperava que as pessoas fossem gostar tanto da história. A gente nunca imaginou que fosse tão longe". Eles ficaram sabendo da indicação ao Oscar durante as filmagens do primeiro longa de Lennox, que Lívia está montando. "É um thriller que se passa em Belfast, com atmosfera diferente do curta e se chama ‘A Patch of Fog’. É um ótimo momento para o Michael", diz.
"Boogaloo and Graham", que será exibido no festival de Berlim deste ano, se passa em Belfast nos anos 1970 e conta a história de dois irmãos que têm galinhas como animais de estimação. A montadora acredita que foi a "mensagem superbonita e as crianças incríveis, que nunca tinham atuado" que cativaram a Academia de Hollywood. "Não tem ninguém por trás nem existiu lobby nenhum. E os outros curtas são bem maiores, mas o nosso é o único que é uma comédia". O curta britânico desbancou o brasileiro "O caminhão do meu pai", que só chegou entre os dez finalistas ao Oscar.
Experiência com os irmãos Salles
Após se formar na UFF, Lívia foi trabalhar na produtora VideoFilmes, dos irmãos Walter e João Moreira Salles. Em 2004, sua primeira função foi ser estagiária do documentarista Eduardo Coutinho, morto em fevereiro do ano passado. "Meu trabalho era só transcrever todo o material de ‘Peões’". Ela também fez decupagem de "Entreatos" e foi assistente de montagem de Jordana Berg no documentário "Travessia da dor", de Dorrit Harazim; e de Isabela Monteiro de Castro em "Cidade baixa", de Sérgio Machado.
"Era uma maravilha estar na VideoFilmes naquela época. Tinha várias coisas muito legais acontecendo. O Coutinho estava sempre por lá. Foi muita sorte", lembra. Ela também considera que foi sorte estar presente quando João Moreira Salles e Eduardo Escorel começaram a reunir o material de "Santiago" (2007), do qual foi coeditora. O primeiro serviço com o "Waltinho" foi um vídeo de dez minutos para promover "Na estrada", que viria a estrear em 2012, no exterior. "Logo depois ele me chamou para montar o ‘Linha de passe’. Eu tinha 25 anos e foi um desafio muito maior do que eu imaginava".
Mas Lívia diz que não tem muita ambição pela indústria americana. "Quero trabalhar com filmes que eu gosto, que eu possa escolher, não importa onde seja. Me interesso por filmes independentes por ter mais controle criativo", diz. Em Hollywood, Daniel Rezende foi o montador brasileiro que mais se consagrou. Após ser indicado ao Oscar por "Cidade de Deus", em 2004, foi chamado por Terrence Malick para editar "A árvore da vida" (2011).
"A indicação do Dani foi 1 milhão de vezes mais importante e significativa do que a indicação para melhor curta de um filme que eu montei. Já vou ficar muito feliz em continuar trabalhando com cinema, que é o que eu amo. Mas para chegar onde o Daniel chegou eu ainda tenho muito, muito chão pela frente", afirma.