"Será que eu errei tudo?" O tombo feio diante dos cubanos na Liga Mundial, em julho, fez a pergunta martelar na cabeça de Bernardinho pela primeira vez. No dia seguinte, a derrota para a Polônia tirou o Brasil do torneio e enfiou uma dose extra de angústia na bagagem que a seleção masculina de vôlei carregou para Londres. Mas será que ele tinha errado tudo? Ao longo do caminho na Inglaterra, o time cresceu, derrubou adversários de peso e, sem americanos e poloneses pela frente, avançou feroz até a disputa do ouro. Neste domingo, a equipe se agigantou nos dois primeiros sete contra a Rússia. E quando a coroa parecia estar de volta, tudo mudou de novo, com os europeus arrancando um empate heroico, forçando o tie-break e sacramentando uma virada que parecia impossível. Com suados 3 a 2 (19/25, 20/25, 29/27, 25/22, 15/9), a Rússia é campeã olímpica pela primeira vez desde o fim da União Soviética. E a seleção de Bernardinho, prata pela segunda vez seguida, carrega suas dúvidas na volta para casa.
Primeiro set arrasador
Quando a bola subiu para o primeiro saque, ainda dava para encontrar um bocado de cadeiras vazias na Arena de Vôlei, mas foi por pouco tempo. Logo o ginásio estava lotado e, como de hábito, com as arquibancadas tomadas pelo amarelo. A torcida russa fazia barulho, mas logo era abafada pela brasileira, que desde o início do torneio apoiou as seleções masculina e feminina.
Havia uma expectativa de que a Rússia da final não seria a mesma presa frágil da primeira fase, mas o Brasil não quis nem saber. Abriu logo 3/0 como se estivesse treinando em Saquarema e, na primeira parada técnica, já vencia por 8/5, com três pontos de Murilo. Wallace também conseguia virar com facilidade, ao contrário do temido Mikhaylov, que não conseguia se encontrar. Sem sustos, a seleção de Bernardinho fechou o primeiro set em 25/19.
No segundo, opa, os russos se engraçaram e abriram 2/0. Mas foi só um blefe. Na parada técnica, já era o Brasil que vencia por 8/4, com o pé nas costas. O placar não chegou a deslanchar, mas Wallace cresceu na hora certa e manteve a vantagem. Com um bloqueio simples de Lucão, o placar chegou a 19/15 e deu à equipe verde-amarela o conforto necessário para se manter à frente. Bastou controlar o ritmo para fechar a tampa da parcial em 25/20.
Na história do vôlei nas Olimpíadas, nunca aconteceu de um país abrir 2 a 0 na final e sair derrotado. No terceiro set, a Rússia acordou e pareceu disposta a quebrar o tabu. Vencia por 8/7 na primeira parada, mas já perdia por 16/15 na segunda. A vantagem se ampliou, e a torcida não parava de cantar.
No 23/22, Giba tirou o agasalho e, com seu cavanhaque da sorte, foi à quadra para sentir o gosto de mais um ouro. A torcida veio abaixo, mas o atacante jogou apenas um ponto, viu a Rússia empatar e voltou para o banco com um sorriso amarelo, porque a festa virou preocupação. Os russos salvaram um match point, arrancaram uma reação inesperada e calaram a torcida brasileira. Venceram o terceiro set por 29/27 e jogaram a tensão para o outro lado da rede.
Bernardinho voltou com Giba para o quarto set. O sistema já parecia não funcionar tão bem, e os russos venciam na primeira parada técnica por 8/7. Mikhaylov, que dormia desde o primeiro set, estava de volta ao jogo, mas era o gigante Muserskyi, de 2,18m, que continuava puxando o ataque. Giba virou alvo na defesa e não conseguia virar uma bola sequer no ataque. Assim, a diferença chegou a 18/13 e, quando Giba voltou para o banco, o estrago já estava feito. A Rússia abriu meia dúzia de pontos e só controlou até o fim: 25/22. Tudo igual na arena, e um ouro que parecia certo foi para a disputa do tie-break.
Abatido, foi o Brasil que virou presa fácil no tie-brek. O ouro que estava na mão parecia cada vez mais distantes. Com os russos soltando o braço, a diferença foi subindo até chegar a 9/4. Bernardinho parou o jogo, conversou com o time, mas não adiantou. O momento era todo russo. Com o gigante Muserskiy martelando uma atrás da outra, o jogo voltou a parecer um treino em Saquarema, mas o treino ruim, daqueles em que nada dá certo. O líbero Obmochaev já pulava pela quadra quando o placar estava em 12/6. Terminou em 15/9. E a alegria de sábado com as meninas virou uma tristeza sem fim no domingo com os rapazes.