Ocultas quilômetros abaixo da superfície de uma placa de gelo, as chamadas montanhas fantasmas localizadas no centro da Antártida estão finalmente se tornando visíveis, anunciaram pesquisadores no mês passado. Resultados de observações conduzidas por meio de radar de penetração subterrânea em 2008 e 2009 tornaram possível obter as mais detalhadas imagens já registradas das Montanhas Gamburtsev – e elas apresentam um relevo surpreendentemente acidentado, de acordo com os especialistas.
As imagens obtidas por meio de radar apresentam uma visão ligeiramente exagerada dos picos irregulares, com altura de cerca de 2,6 mil m. A serra provavelmente se formou milhões de anos atrás, e só posteriormente terminou recoberta pelo gelo da Antártida, disse a geofísica Robin Bell, do Observatório Terrestre Lamont-Doherty, parte da Universidade Colúmbia, líder do projeto conduzido pelos Estados Unidos na província antártica de Gamburtsev, como parte do programa científico do Ano Polar Internacional de 2007/08.
Em termos de tamanho e de forma, disse Bell, as montanhas Gamburtsev se assemelham à Cascade Range, no noroeste dos Estados Unidos, que abriga o Mount Rainier. Em 2008 e 2009, uma equipe internacional de pesquisadores viajou extensamente pela região de Gamburtsev – uma área mais ou menos equivalente à do Estado de Nova York -, utilizando um avião equipado com radar, o que permitia aos cientistas observar o que existe por baixo do gelo e "ver" o terreno subjacente.
O radar também revelou bolsões de água por sob o gelo, de acordo com Bell. Isso é importante, porque compreender como funcionam os sistemas hídricos por sob a camada de gelo ajuda os cientistas a determinar o que pode acontecer com a camada de gelo antártica à medida que o aquecimento global se intensifica. Eis as legendas para as fotos obtidas pela expedição:
Preparativos para a decolagem
Um pesquisador prepara um avião para uma jornada de exploração via radar, em uma expedição conduzida em 2008 sobre as Montanhas Gamburtsev, uma região recoberta de gelo na Antártida. Na superfície, o gelo muitas vezes é liso como uma pista de decolagem, e nada revela sobre o terreno subjacente, que pode atingir profundidades de até 4,8 mil m.
Observar o que existe por sob o gelo requer que o avião seja modificado com antenas para radar montadas nas asas, um trabalho que causa calafrios mesmo que as condições sejam as melhores possíveis em termos antárticos.
Caverna de gelo
Na superfície, a Antártida pode se assemelhar a uma terra encantada marcada por formações complexas como essa caverna de gelo, fotografada durante uma expedição às Montanhas Gamburtsev, em 2008. Mas a paisagem que existe por sob o gelo é um mistério muito antigo, e desvendá-la foi um processo muito trabalhoso.
"Nós realizamos muitos voos", disse Robin Bell, a líder da expedição, em mensagem de e-mail à National Geographic. "Há 12 meses, o mapa ainda era bastante indistinto", ela revelou. Mas depois da realização de múltiplos voos ao longo de uma região com 70 km de comprimento e 250 km de largura, os detalhes geográficos começaram a surgir. "Nós lentamente fomos preenchendo o mapa", disse Bell, "e vimos a cadeia de montanhas se estendendo lentamente em nossas imagens".
Dia de nevasca
Os ventos fortes encontrados em determinado dia de 2009 confinaram os membros da expedição ao seu acampamento e retardaram os voos de observação por radar que terminaram por revelar os picos, vales e correntezas ocultos das Montanhas Gamburtsev. Em alguns locais, por sob o gelo da Antártida, disse Bell, a diretora científica da expedição, parece que água em forma líquida continua a fluir por alguns dos antigos vales da cordilheira.
"Mas existem outros locais nos quais a plataforma (móvel) de gelo simplesmente puxa a água e a arrasta por sobre as encostas, lançando-a da ponta oposta", ela afirmou, "por sobre os mais altos picos".
Panorama inestimável
Em imagem que Michael Studiger, um dos membros da expedição, definiu como "visão milionária", o Monte Erebus, um vulcão ativo da Antártida, surge por trás de uma colina perto da Prateleira de Gelo de Ross (mapa interativo da Antártida), em 2008 – bem distante das Montanhas Gamburtsev. Membros da equipe se encaminham a um acampamento provisório distante para participação em um curso obrigatório de sobrevivência com duração de dois dias, perto do vulcão – conhecido em termos jocosos como "escola da neve" ou "escola do campista feliz".
Robin Bell, a líder da expedição, acredita que as Montanhas Gamburtsev sejam muito mais antigas que o Monte Erebus. Podem ter se formado 250 milhões de anos atrás, quando a Antártida já se havia acomodado à sua atual posição, acima do Polo Sul.
Era um período mais quente, diz Bell, e a erosão deve ter produzido os vales agora divisados nas imagens obtidas pelo radar de penetração subterrânea. Depois veio o gelo, soterrando os vales, assim como os picos que os cercavam, o que fez da cordilheira antártica, até recentemente, a última cadeia de montanhas inexplorada do planeta.