Uma recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) representou um duro golpe no combate aos verdadeiros infratores do trânsito, aqueles motoristas imprudentes, que cometem infrações a todo instante e colocam em risco a vida de outras pessoas. Na súmula vinculante de número 21, os ministros consideraram inconstitucional a exigência de depósito ou pagamento prévio de dinheiro ou bens para recorrer administrativamente. Agora, em nenhuma instância é preciso pagar a multa para recorrer. No caso dos recursos de trânsito, a exigência valia para o motorista que pretendia apelar aos Conselhos Estaduais de Trânsito (Cetrans), entidade maior nos Estados quando o assunto é trânsito (está acima dos Detrans). Ou seja, aquele condutor que teve o recurso negado pela Jari (Junta Administrativa de Recurso de Infração), era obrigado a pagar a multa antes de apelar ao Cetran. Com a decisão do STF, isso não será mais necessário, contrariando o Artigo 288, paragráfo 2º, do Código de Trânsito Brasileiro (CTB).

Muita gente deve estar comemorando a decisão, que amplia o direito da defesa prévia do cidadão. Isso é fato, é correto e vai beneficiar os bons motoristas. Mas para as pessoas que vivem diariamente o trânsito, ela acendeu um sinal de alerta. Por dois motivos. O primeiro está relacionado ao estímulo ao mau motorista, que se sentirá impulsionado a recorrer contra qualquer infração, mesmo aquelas que sabe ter cometido. “Antes, o condutor que não tinha condições financeiras de pagar a multa se via obrigado a desistir de entrar com um recurso. Agora é diferente, não custará nada recorrer e as pessoas vão fazê-lo”, prevê a presidente do Cetran-PE, Simíramis Queiroz.

A afirmação da técnica, que comandou a diretoria de operações do Detran-PE por quase dez anos, é embasada no consenso entre os que lidam com o trânsito brasileiro de que a lei só é respeitada quando pesa no bolso do motorista. Caso contrário, ele faz pouco caso. A criação do CTB, em 1998, é prova disso. Foi com as multas caras previstas nele que boa parte da população passou a usar o cinto de segurança e a respeitar a faixa de pedestres, por exemplo.

O segundo ponto que deixou em alerta o setor é o fato de que os Cetrans não estão preparados para o aumento da demanda que virá. A realidade é nacional, bem exemplificada nos números de Pernambuco: são apenas seis funcionários no Cetran-PE, dos quais dois atuam fazendo a triagem dos recursos que chegam ao órgão. Depois de analisados, esses recursos são encaminhados para os 12 conselheiros que fazem o julgamento. Cada conselheiro tem uma média de 30 recursos para analisar por mês. “E isso porque recebemos uma quantidade pequena dos recursos. Extamente por ter que pagar antes de apelar ao Cetran, a maioria das pessoas desistia de recorrer quando perdia nas Jaris", explica Simíramis Queiroz. A decisão do STF vai afetar, entre outros processos, os que suspendem a permissão para dirigir dos motoristas flagrados pela lei seca dirigindo depois de beber. Em Pernambuco, devido ao trâmite burocrático e ao pequeno número de funcionários do Detran, se leva, em média, um ano e dois meses para concluir o processo de suspensão da CNH. Dos 8.328 condutores autuados desde que a lei seca entrou em vigor até janeiro passado, apenas 123 tiveram a habilitação suspensa, o que representa menos de 1,5%. E, pelo jeito, a demora vai ser ainda maior a partir de agora.

jconline

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