A morte de Abinoão Soares de Oliveira, policial militar de Alagoas, no dia 24 de abril, durante um treinamento do 4º Curso de Tripulante Operacional Multimissão (TOM-M), realizado pelo Centro Integrado de Operações Aéreas (Ciopaer), gerou um conflito no meio jurídico, no que tange à competência para analisar e julgar o caso: se cabe à Justiça Militar ou à Justiça Comum.
Logo após o incidente, dois inquéritos foram instaurados para apurar a morte de Abinoão, sendo um militar e outro civil. Em seguida, o defensor público Ademar Monteiro da Silva ingressou, na Justiça Militar, com pedido um habeas corpus para "trancar" as investigações feitas pela Polícia Civil, por entender que se trata de um crime militar.
No dia 10 de maio, a juíza Lúcia Peruffo, da 11ª Vara Criminal Especializada Justiça Militar de Cuiabá, declinou da competência para julgar o caso, que, por sua vez, foi encaminhado para a Justiça Comum.
Ontem (24), a juíza Monica Perri deu parecer favorável ao trancamento do inquérito civil. No entanto, a decisão se tornou sem efeito, uma vez que o inquérito foi concluído e apresentado, na terça-feira (25), pela delegada Ana Cristina Feldner.
Em entrevista coletiva, Feldner explicou que não cabe à Polícia Civil a definição de competência para julgar o caso. No entanto, defendeu que o crime é de natureza comum, e não militar.
Dessa forma, os tenentes do Batalhão de Operações Especiais (Bope), Carlos Evane Augusto e Dulcézio Barros de Oliveira, foram indiciados por homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, tortura e impossibilidade de defesa) pela morte de Abinoão.
No relatório final do inquérito, a delegada argumentou que se trata de um crime comum. Ela explicou que os oficiais que atuaram como instrutores do curso, no dia da morte de Abinoão, estavam ministrando o treinamento na condição de professores; tanto que receberam para tal instrução. Em depoimento a Polícia Civil, o coordenador do Ciopaer, capitão Thomas, afirmou que a instrução é de natureza policial especializada, e não militar.
"Os instrutores do dia fatídico, por acaso, são policiais militares. No entanto, não estavam ministrando instrução como tais. Tanto que, conforme depoimento dos coordenadores do Ciopaer, o critério para escolha dos mesmos se dá em razão de conhecimentos. Inclusive, há policiais civis e mesmo civis que são instrutores deste curso", afirmou a delegada.
Segundo Ana Cristina Feldner, o curso era ministrado a policiais civis, e não militares. Ela destacou que Abinoão era policial militar no Estado de Alagoas, mas estava à disposição da Força Nacional de Segurança Pública.
Dessa forma, estaria desenvolvendo atividade em decorrência de uma "cooperação", recebendo diárias do Governo Federal, podendo ser equiparado como servidor público federal.
"Assim, asseveramos que o fato ocorreu em um curso (que não é militar, vez que estava sob a administração do Ciopaer, um órgão integrado), sendo que, apenas por coincidência, vítima e suspeitos são profissionais militares, não estando em situação de atividade ou assemelhado", diz um trecho do relatório do inquérito que apurou a morte do soldado alagoano.
Outro ponto destacado pela delegada são os princípios basilares das instruções militares – hierarquia e disciplina -, que, segundo ela, não havia no curso ministrado Ciopaer.
"Conforme depoimento dos alunos, a ordem na formação do turno se dava por altura ou numeração, e não por graduação. Por exemplo: no início da fila ficava um soldado, enquanto havia cabo no final, algo inadmissível em formações militares. Lembrando, novamente, que havia alunos policiais civis, os quais não são subordinados a nenhuma hierarquia militar", retrata outro trecho do relatório.
Para a delegada, a argumentação de crime militar é "simplista e superficial, não atendendo os anseios da doutrina moderna e nem tendência jurisprudencial".