Às vésperas do GP do Brasil de Fórmula 1, que será disputado no próximo domingo (7), em São Paulo, o mundo do automobilismo vive uma situação inédita: a possibilidade de pilotos e membros de equipes serem presos após a corrida. Isto é o que acredita o promotor Paulo Castilho, do Juizado Especial Criminal da capital paulista.
O Estatuto do Torcedor prevê a prisão por até seis anos para quem fraudar eventos esportivos. Segundo o promotor, um possível jogo de equipe da Ferrari para favorecer o espanhol Fernando Alonso – que tem chances de se sagrar campeão antecipado em Interlagos – se enquadraria na legislação. Com isso, a corrida poderia terminar com corredores e outros integrantes da escuderia algemados.
– No Brasil é considerado crime [jogo de equipe]. Não só para o Felipe Massa, mas para qualquer piloto e chefe de equipe. Se no resto do mundo essa prática odiosa frustra a expectativa do torcedor, aqui no Brasil não mais. Tem que sair preso de Interlagos se acontecer.
Castilho ganhou destaque ao fazer o projeto que alterou o Estatuto do Torcedor, que tornou crime as fraudes e a violência em jogos de futebol e outros eventos esportivos. O promotor destacou que a possibilidade de uma manipulação no resultado da corrida deste domingo deve ser coibida.
– Estatuto do Torcedor não se restringe ao futebol, é para qualquer modalidade esportiva. O torcedor está lá, torcendo pelo Felipe Massa, e ele simplesmente recebe uma ordem do engenheiro-chefe “deixa o Alonso passar”. Isso não é feito às escondidas, é escancarado. E configura crime. A autoridade policial tem o dever legal de agir.
A alteração no Estatuto entrou em vigor no dia 28 de julho deste ano. Para lembrar as autoridades sobre a nova legislação, Castilho promete conversar com os policiais que ficarão responsáveis pelo GP.
– Vou verificar quem é o delegado que estará de plantão para lembrá-lo dessa operação legislativa, que é recente. Tem que ter indícios de materialidade. Se o carro não quebrou, não teve falha e recebeu ordem da equipe para deixar passar, é flagrante.
A hipótese de ver um piloto estrangeiro preso na corrida do Brasil parece não intimidar o promotor.
– Se for estrangeiro, pior ainda, porque qual a garantia que ele vai voltar quando o processo terminar pra cumprir pena?
O assunto sobre a punição criminal para o jogo de equipe na F-1 veio à tona nesta quinta-feira (4) quando Castilho defendeu, em entrevista à colunista Mônica Bergamo, no jornal Folha de S. Paulo, que Felipe Massa e integrantes da Ferrari saiam algemados do circuito se repetirem a atitude do GP da Alemanha deste ano. Na ocasião, o brasileiro cedeu a posição para Alonso vencer a corrida.
"Estatuto é do futebol"
A opinião de Paulo Castilho, porém, não é unanimidade no mundo do Direito. O ex-presidente da Comissão de Direito Esportivo da OAB-SP, Domingos Zainaghi, reacendeu a polêmica sobre a autenticidade do jogo de equipe na F-1 e disse ser um “exagero” aplicar o Estatuto do Torcedor à categoria máxima do automobilismo.
– É uma visão muito autoritária aplicar o Estatuto ao jogo de equipe. Esse esporte [Fórmula 1] tem suas regras, e o piloto é obrigado a deixar passar, ganha milhões para isso. O problema é que o Estatuto foi feito para o torcedor do futebol. Ninguém pensou no vôlei, no basquete, menos na F-1.
Zainaghi participou da elaboração da primeira versão do Estatuto do Torcedor. Segundo ele, os pilotos receberem ordens da equipe é algo aceitável no automobilismo.
– A gente torce individualmente, mas é um esporte de equipe. Se torço pela Ferrari, vou torcer para o segundo piloto deixar o primeiro passar para o time ser campeão.
O advogado afirmou que teme pela continuidade da corrida em São Paulo nos próximos anos se realmente alguém por detido após a prova deste domingo.
– Mesmo tendo prova, é outro tipo de esporte. Fórmula 1 tem regras próprias e é um evento privado. O futebol também é, mas se o país quer sediar um evento internacional, temos que resolver nossa legislação para recebê-lo. Tenho medo que tirem até o GP daqui do Brasil. Vão falar “vamos sair do Brasil, porque lá os caras têm umas leis malucas”.