Uma ação de improbidade proposta pelo Ministério Público Federal de Alagoas (MPF/AL) pretende reaver cerca de R$ 1,3 milhão em recursos federais desviados de um convênio firmado entre a ONG Instituto Oceanus e a Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República.
Segundo a ação, Daniel Lima Costa, Andréa Cristina Künzler Nogueira Costa, Everilda Brandão Guilhermino, Kátia Ferreira Esteves Lima e Marcello Gomes Nascimento foram beneficiados pelo desvio dos recursos públicos obtidos fraudulentamente.
A ONG passou a ser investigada pelo MPF no ano passado, depois de não ter prestado contas do convênio firmado em 2005, que previa a aplicação de R$ 1.435.751,10 no Projeto de Desenvolvimento da Maricultura Sustentável no Litoral de Alagoas. A investigação revelou que além do não cumprimento do objeto do convênio, os dirigentes da Oceanus desviaram recursos que deveriam ser utilizados para propiciar a inclusão socioeconômica de comunidades litorâneas de pescadores artesanais, para acrescer seus patrimônios pessoais e os de seus amigos e familiares. Pai, mãe, irmã, esposa, cunhado e sobrinhos de Daniel Lima – responsável pela gestão da entidade e movimentação dos recursos financeiros – sempre ocuparam os cargos majoritários dentro da ONG e, segundo as investigações, na prática, serviam apenas para referendar suas decisões.
O desvio de recursos se deu através de fraudes à lei de licitações, uso de notas fiscais irregulares, apropriação indevida de bens pertencentes à União e realização de gastos indevidos com combustível, pagamento de diárias, passagens aéreas, locação de veículos e remuneração dos integrantes do instituto. Também foram detectados saques indevidos da conta-corrente do convênio, pagamentos de contas pessoais e a realização de inúmeras despesas não previstas no plano de trabalho.
Como resultado disso, apesar de todo o recurso federal ter sido repassado, estima-se que apenas 20% do projeto tenha sido realizado, frustrando desse modo todo o objetivo do convênio.
Um restaurante denominado "Maria Vai com as Ostras" foi adquirido pelo Instituto Oceanus, o qual tentou caracterizar a aquisição como uma "unidade operativa de escoamento e venda de produtos". Posteriormente, o "Maria Vai com as Ostras" se transformou em uma microempresa registrada em nome de Daniel Lima Costa Filho. O bar teve até os equipamentos de som comprados com dinheiro do governo federal.
"Recursos públicos foram utilizados como capital inicial para abertura e aparelhamento de um bar que movimenta as noites da orla de Maceió, de modo que, com o ‘patrocínio’ do Estado, aufere lucros pessoais consideráveis, em detrimento dos produtores de ostras que deveriam estar sendo beneficiados com o projeto objeto do convênio com a SEAP", observa na ação o procurador da República, Paulo Olegário de Sousa.
A pedido do MPF, a Secretaria de Controle Interno da Casa Civil da Presidência da República, órgão ao qual a Secretaria de Pesca está vinculada, analisou toda a documentação relativa à execução do convênio. Segundo o relatório apresentado, o Instituto Oceanus contratou os serviços de consultoria dos institutos Ibradim, Exato e ADS Corais, sem obedecer às exigências da Lei das Licitações; apenas com registro em ata, sem que houvesse apresentação de atestado de exclusividade de serviços e a publicidade do ato.
Além disso, ficou comprovado na investigação que o Ibradim é uma associação criada e administrada de fato por Daniel Lima Costa, que já foi, inclusive, presidente da mesma, junto com a irmã, esposa e pai, que ocuparam cargos na entidade.
O mesmo se aplica à contratação do Instituto Exato, que é gerenciado por amigos íntimos de Daniel Lima, alguns deles que já ocuparam cargos executivos na ONG Oceanus. Em relação ao outro instituto, o ADS Corais, além da irregularidade em sua seleção, depoimentos colhidos pelo MPF/AL por técnicos que trabalharam no projeto afirmaram que a ADS não tem nenhuma relação com o projeto de maricultura e não conseguiam imaginar a que se referiam os pagamentos feitos a eles. Juntas, as três entidades receberam R$ 310.120,00.
Operação semelhante ocorreu em relação a supostas despesas com locação de veículos. A Oceanus apresentou notas fiscais comprovando o pagamento de R$ 39.350,00 à AM Locadora de Veículos Ltda. A fiscalização feita nos documentos e depoimentos colhidos pelo MPF/AL descobriram que os serviços jamais foram prestados – já que os técnicos usavam os próprios veículos e disseram nunca ter visto os carros – e que a empresa, também contratada sem licitação, na verdade foi aberta por Daniel Lima em nome de Alberto e Mara Rúbia Künzler Ribeiro, seus cunhado e concunhada.
Ostras – Em depoimentos prestados ao MPF/AL, técnicos que trabalharam no projeto estimaram que apenas 20% do dinheiro que foi liberado pela Secretaria de Pesca tenha sido utilizado pelo Oceanus no desenvolvimento do objeto do convênio. Um parecer técnico da coordenadoria de Maricultura da Secretaria de Pesca constatou que as Unidades Demonstrativas de cultivo de ostras foram implantadas em apenas parte dos dez municípios previstos e de algas, em dois deles. Segundo depoimentos dos técnicos, continuam em atividade as unidades de Barra de São Miguel, Coruripe e Passo de Camaragibe, cujos trabalhos foram iniciados pelo Sebrae, e de Ipioca, devido à iniciativa da comunidade.
Também foi constatado que não foram elaboradas as cinco mil cartilhas sobre o cultivo de ostras e algas, para as quais foram disponibilizados R$ 35 mil, nem realizadas as atividades de incentivo a comercialização da produção previstas no convênio, para as quais foram disponibilizados R$ 110.084,00. Outros pontos do convênio que não foram cumpridos são a viabilização de pontos de vendas da produção e a aquisição de um veículo para transporte da produção, e de carrinhos de vendas de ostras. "O projeto Oceanus tem intermediado o comércio de ostras, auferindo lucro com o comércio da produção por meio do restaurante de propriedade dos coordenadores do projeto, e o que é mais grave, deixando de quitar as dívidas assumidas junto aos produtores que venderam suas ostras", diz o parecer técnico.
Segundo o mesmo documento, com exceção do comparecimento da direção do Projeto Oceanus e montagem de stand do projeto na Feira Nacional da Ostras, não foram realizadas viagens de intercâmbio nacionais e internacionais para divulgação e aprimoramento tecnológico.
Pedidos – Foi pedido que os réus sejam condenados à perda dos bens acrescidos ao patrimônio; ao ressarcimento integral dos danos materiais causados à União, à suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos; ao pagamento de multa civil de até três vezes do valor do acréscimo patrimonial; e à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios pelo prazo de dez anos. Uutra ação, no âmbito criminal, deverá ser ajuizada nos próximos dias pelo MPF/AL.
A ação de improbidade nº 2008.80.00.001275-4 foi distribuída para a 7ª Vara Federal.