O drama vivenciado por algumas famílias alagoanas, diante do crescimento do tráfico do crack no Estado, é o enredo que tem transformado a história da dona-de-casa Sônia Máximo dos Santos, 49 anos. Ela é mãe do padeiro Gilmar dos Santos Costas, 24 anos, que até os 17 anos levava uma vida tranqüila, com família estabilizada e sonhos. No entanto, a trajetória de Gilmar dos Santos foi interrompida pelo crack.
Gilmar dos Santos não consegue mais trabalhar, é ameaçado de morte, já sofreu atentados, possui um projétil alojado no corpo e não consegue mais olhar nos olhos a filha de quatro anos de idade. Sem encontrar solução para o próprio problema, o padeiro – que atualmente se encontra sem emprego – pediu que a mãe o acorrentasse ao pé de uma mesa, para que não mais se envolvesse com “coisas erradas” por conta do vício.
“Eu quero sair desta vida”, destaca Gilmar dos Santos, que fala sempre com o olhar fixo no chão. O jovem diz ainda que tudo começou aos 17 anos de idade, quando fumou maconha pela primeira vez. Em seguida, entrou no mundo do crack. Há quatro dias acorrentados, o drama de Gilmar dos Santos se tornou o sofrimento de toda a família, que reside em uma casa humilde na região de Fernão Velho, mais precisamente na Vila Goiabeira.
De acordo com a tia de Gilmar dos Santos, Maria Gilvânia dos Santos Ferreira, são constantes as ameaças, carros com vidros escuros circulando a casa. Pelo menos duas pessoas já tentaram invadir a residência, com arma em punho para matar o jovem. Gilmar diz que não possui dívidas com os traficantes, mas ao mesmo tempo não sabe explicar o porquê das ameaças.
Apelo
Acorrentado na mesa, o jovem diz que já chegou a fumar entre quatro e cinco pedras de crack por dia. O fato de ser viciado fez com que Gilmar dos Santos ainda ganhasse a antipatia da comunidade. Mesmo preso dentro de casa, ele é acusado de diversos roubos na região.
“É impossível ele ter cometido isto, pois ele estava aqui nesta mesa acorrentado. O problema é que devido à situação dele ele ganhou fama. Pelo amor de Deus, que alguém nos ajude. O Gilmar precisa ser internado. Eu quero que ele vá para um hospital, para que mais tarde eu não tenha que ver o corpo do meu filho já sem vida, estendido no meio da rua”, disse a mãe, ciente do destino da maioria dos viciados que vivem na periferia da cidade.
“Ele nasceu e se criou aqui. É um menino bom, que nunca pegou nada de ninguém. Infelizmente se envolveu com coisa errada. Se mãe pudesse dar o coração ao filho, ele não estaria nesta situação. Depois que ele começou a usar o crack, foi ladeira abaixo”, complementa ainda Sônia Máximo, que não consegue segurar as lágrimas quando fala do filho e, por diversas vezes, é obrigada a se sentar por passar mal.
As apreensões de crack e prisões de traficantes passaram a ser constantes nas páginas policiais dos jornais alagoanos. “É uma desgraça que destrói toda a família. É uma situação que eu não desejo para ninguém. Quem tiver seus filhos que tenha muito cuidado com isto”, salientou a tia. A mãe de Gilmar dos Santos diz que já procurou diversos hospitais, entre eles o Portugal Ramalho. Ela relata que sempre conseguiu medicamentos, mas que nunca o filho foi internado. “Sempre foi alegado falta de vagas. Ele precisa urgente de tratamento, porque de uma forma ou de outra ele pode morrer”, desespera-se Sônia Máximo.
Família
Sônia Máximo já perdeu muito peso por conta do drama do filho. Ela teve que reduzir inclusive a jornada de trabalho como faxineira para cuidar do jovem. Toda vez que Sônia Máximo não segura a emoção, ao falar de Gilmar, e chora, quem a consola é a pequena filha do padeiro, de apenas quatro anos de idade. “Eu sequer agüento o fato da criança ter que presenciar esta cena”, diz ela.
“Ela é uma sofredora”, diz Maria Gilvânia, olhando a mãe e a filha de Gilmar dos Santos abraçadas. Na comunidade, a família é vitima dos mais variados julgamentos, mas o que eles menos querem são adjetivos, pois são todos uníssonos em pedir ajuda. “Eu não consigo mais dormir. Não posso ouvir um barulho dentro de casa, que tenho medo que seja alguém invadindo para matar meu filho”, coloca Sônia Máximo.
Na manhã desta sexta-feira, 9, Gilmar dos Santos completa quatro dias preso a mesa, mas – sem alternativas – a família julga que acorrentá-lo e atrair a atenção da sociedade e da imprensa seja a única forma de libertá-lo da prisão sem paredes erguida pelo mundo do crack. “Eu quero descanso. Ele não era assim e não tenho fé que ele possa voltar a ser quem era”, colocou.
Ainda de cabeça baixa, o padeiro finaliza a entrevista: “Eu já levei tiro porque não tinha dinheiro para comprar o crack e queria que o traficante me entregasse apulso”. Um outro parente – ao ouvir a frase – ainda complementa: “e só sobreviveu porque eu o coloquei nas costas e o socorri”. Por fim, a tia fala: “pois é, mas até quando ele vai sobreviver desta forma”.