Boca da Mata é uma das raras cidades de Alagoas, que a sua ascendência de artistas no mundo da cultura, tem sido uma constante nesses últimos anos. Razão que motivou no final do ano passado, o prefeito José Tenório a criar a Casa da Cultura, justamente com a finalidade de incentivar essa legião de pessoas talentosas, que orgulhosamente têm se destacado em eventos nacionais e internacionais, através de seus artesanatos e folguedos populares. “Já temos pouco mais de 60 artesãos cadastrados em nossa cidade”, é o que afirma a secretaria de Cultura, Rosa Melo, acreditando que esse numero poderá chegar aos 80.
Entre uma infinidade de trabalhos artesãos que reinam em Boca da Mata, o grande destaque fica por conta da família do velho Manuel da Marinheira,91, seu Mane como é conhecido, que além de ser um dos primeiros moradores da região; é detentor da escultura de madeira. Hoje debilitado e em cima de uma cadeira de rodas, seu Manuel ficou viúvo logo após dois anos que Boca da Mata se tornou município, (há 46 anos) trazendo em sua bagagem, uma ruma de dez filhos para enfrentar um segundo casamento, onde com dona Nancir Peixoto “fabricou” mais dez. De seus vinte filhos, apenas quinze estão vivos. E foi desse segundo casamento, que quatro dos sete vivos herdaram a sua profissão.
“O seu Mané da Marinheira é uma história viva de Boca da Mata”, compara o empresário Jorge Tenório, considerado o maior colecionador do Brasil de peças de animais esculpidas em madeiras. E todas, segundo ele, encomendadas junto a família Marinheira. Basta dizer, que o empresário construiu um museu em sua propriedade, na fazenda Bento, lá em Boca da Mata, que hoje concentra mais de 500 peças. O museu é visitado por turistas principalmente aos finais de semanas. O local, inclusive fica num balneário considerado cartão postal do município, que por sinal está sendo preparado para ser um hotel fazenda.
Nas vitrines
Há um ano, por exemplo, durante a ARTNOR, Feira Internacional de Artesanato no Nordeste, realizada em Maceió, no Centro de Convenções, o artesão André da Marinheira,37, recebeu o título de “Mestre” pela comissão organizadora do evento. “O meu trabalho já pode ser visto hoje, em ateliês do Rio, São Paulo, Recife, Brasília, Belo Horizonte e em Maceió; sem falar em clientes espalhados pela Europa e os Estados Unidos”, orgulha-se o Mestre André, considerado em 2006, pelo o Sebrae, como um dos mais conceituados artistas do Brasil, na confecção de animais silvestres esculpidos em madeira.
Os trabalhos do Mestre André não param; graças, segundo ele, aos constantes eventos que ocorrem pelo Brasil afora. Além é claro: dos atravessadores, que insistentemente estão encomendando peças para abastecer o mercado do gênero nacional e internacional.
“Hoje tenho uma vida bonita e saudável. E o que faturo como artesão, dá muito bem para viver com a minha família” garante o artista, ressaltando com otimismo o dom que adquiriu do pai, Mané da Marinheira, quando tudo começou aos 10 anos de idade; e que por conta disso habitualmente hospeda-se gratuitamente em famosos hotéis do país, ancorado pela fama que obteve na arte que o destino lhe programou.
“A gente está ramificando esse belo trabalho para os nossos filhos e outros parentes, e até mesmo para as crianças interessadas em aprender a nossa arte, através de oficinas que semanalmente fazemos aqui em nossa casa”, conclui o artista.
Outra Fera
“O nosso trabalho é aquele que por sua criatividade, originalidade, graciosidade e perícia produz peças que provocam profundo sentimento de admiração naqueles que as observam”, é o que relata outra fera vinda de seu Mané da Marinheira, o Manoel Filho, 32, que recentemente chegou do Recife-PE, depois de uma longa temporada de 12 anos na capital pernambucana.
No Recife, o Galego como é conhecido Manoel Filho, em Boca da Mata, esteve atrelado a Fundação Joaquim Nabuco, onde deixou um arquivo de suas peças e ensinava arte a um grupo de 60 crianças de ruas, patrocinado pelo governo do Estado.
Antes do Recife, o Galego esteve no eixo Rio / São Paulo, onde foi até cognominado, segundo ele, de o Aleijadinho contemporâneo. “Foi um apelido que ganhei durante uma exposição que fiz de meus trabalhos no Museu imperial do Rio de Janeiro”, justifica. Como se sabe, o Aleijadinho foi aquele que o Brasil teve como um gênio renascentista desgarrado em plena efervescência de Minas colonial, esculpindo e talhando com o espírito, o fulgor e a grandiosidade dos artistas iluminados.
“Estou entusiasmado agora aqui em Alagoas, principalmente pelo apoio que venho recebendo da nossa Prefeitura, que tem valorizado acima e tudo a nossa categoria” comenta vaidoso, adiantando que será a capa da 4ª edição da revista “Art Alagoana” da artista plástica Tânia Pedrosa, programada para sair por esses dias.