Na quinta-feira, 08, o juiz James Magalhães se tornou imortal. Magalhães – que ocupou um posto polêmico nas eleições passadas, sendo inclusive afastado da Vara Eleitoral que era titular – entrou para Academia Alagoana de Letras, o que segundo ele mesmo é uma “honra sem comparação”. Em entrevista, antes da solenidade de posse, o juiz falou sobre política, os bastidores do Judiciário e avaliou o processo de inelegibilidade do ex-governador Ronaldo Lessa (PDT), que acarretou no afastamento dele no último pleito.
O juiz James Magalhães foi afastado por uma ação do Pleno do Tribunal Eleitoral Regional (TRE), presidido pelo desembargador José Fernando Lima e Souza, o Fernando Tourinho. O desembargador moveu uma ação de suspeita sob Magalhães, que o tirou da Vara Eleitoral. Motivo: Magalhães foi considerado suspeito por ter decidido pela inelegibilidade do governador. James Magalhães não esconde a mágoa: “este é o único processo que respondo em toda a minha carreira, que sempre foi pautada pela ética e pela seriedade. O Tourinho sim, era mais suspeito que eu naquele pleito, pois até o cargo de governador ele chegou a assumir”.
Bem humorado, porém cauteloso, James Magalhães fala sobre sua vida no Poder Judiciário e sobre os planos para o futuro. Declara um amor incondicional a Literatura. “È coisa de família, vem desde meus antepassados e já escrevi bastante, como jornalista. Mas livro, propriamente dito, este é o primeiro”, explica. “Antes de lançar o livro Inelegibilidade, já coordenei os Anais do Cinqüentenário da Justiça Militar e depois os Anais do Congresso Nacional da Justiça Militar. Já tenho estas duas publicações, mais este livro e agora pretendo seguir a carreira de escritor”, destacou.
Indagado sobre a motivação para falar sobre inelegibilidade, após o “entrave jurídico” com o governador Ronaldo Lessa (PDT), Magalhães responde: “O próprio título do livro já diz a sua razão. Uma sentença que foi dada numa ação de investigação judicial, como já foi dada em tantas outras. Todavia, os pólos ativos e passivos da ação representam dois grandes grupos políticos em Alagoas. Por isto nasceu este interesse maior. Principalmente quando saiu perdedor o grupo do governador da época (Ronaldo Lessa). Por esta razão, houve o rebuliço na imprensa de uma forma geral”.
De acordo com Magalhães, o livro mostra, sob aspectos técnicos, os detalhes da sentença que foi mantida por unanimidade pelo Superior Tribunal Federal (STF). “Então, como se vê, houve uma uniformização do pensamento jurídico. Daí nasceu à jurisprudência que hoje temos firmada, que é este fato aqui de Alagoas”. Engana-se quem pensa que a obra de Magalhães, por tratar de uma questão polêmica, se rende aos interesses escusos que possam ter movido o seu afastamento da Vara Eleitoral. No entanto, em entrevista, James Magalhães – ainda que com poucas palavras – não se nega a falar no assunto.
O juiz não explicita os motivos, mas crer que houve mais que o tecnicismo das decisões judiciárias. Ao falar do ex-governador Lessa, por exemplo, Magalhães diz que as declarações do governador sobre o Poder Judiciário, alegando há “questões decididas no tapetão”, se referindo a inelegibilidade, foram demais pesadas. “Foi a partir daí que houve a grande repercussão, inclusive internacional. As declarações dele, acusando o judiciário, levantaram uma grande expectativa. Por isto, achei necessário condensar estas decisões em um livro para servir de pesquisa e ajuda aos futuros estudantes de Direito”.
“Afastamento injusto”
“O livro traz a lei, doutrina e jurisprudência do caso. Ele condensa um fato importante da história recente do Direito Eleitoral”, coloca. Questionado sobre o seu afastamento da Vara Eleitoral ter sido ou não justo devido à decisão contra o ex-governador Ronaldo Lessa, o juiz James Magalhães responde: “O afastamento foi posterior. Eu pessoalmente acho que não foi legal. Foi injusto e havia interesses disto. Mas eu pretendo entrar em detalhes sobre isto, em um outro livro chamado Honrando a Toga, que pretendo lançar de forma póstuma”.
Na obra Inelegibilidade, Magalhães resolve não entrar nos bastidores da questão. Em entrevista, afirma diversas vezes que houve outros interesses que não somente a Justiça, mas evita também os detalhes. “Eu ainda cheguei a entrar com recurso para não ser afastado, mas o entendimento sempre foi contrário, mesmo diante de o fato ser totalmente inconsistente”, colocou. Para Magalhães, o presidente do Tribunal Eleitoral, Fernando Tourinho, era “mais suspeito” para estar trabalhando no processo eleitoral.
“Se eu fui afastado por ser suspeito, o senhor Fernando Tourinho era muito mais suspeito que eu para presidir o Tribunal Regional Eleitoral, porque inclusive foi governador por várias oportunidades. E o governador da época era um dos candidatos do pleito. Então ele tinha mais suspensão que a minha pessoa”, destacou Magalhães.
Urnas eletrônicas
Durante a entrevista, o juiz James Magalhães não se prende apenas aos assuntos do passado. Magalhães reconhece a relação árdua entre os candidatos e a Justiça Eleitoral e emite sua opinião sobre a recente polêmica da suposta fraude das urnas eletrônicas em Alagoas, levantada pelo ex-deputado federal João Lyra, seguida por Ronaldo Lessa. O fato culminou em trocas de farpas entre Tourinho e Lyra na imprensa alagoana.
“Toda denúncia que aparece tem que ser apurada com veemência e se houver culpados, eles têm que ser responsabilizados. Tem que saber se há culpados nesta história toda envolvendo as urnas eletrônicas. A apuração serve até para que a população tenha confiança no sistema eletrônico”, disse. Perguntado sobre se acha possível uma fraude, o juiz declara que “tudo é possível”.
“Estamos lidando com equipamentos que estão nas mãos dos homens. A urna é um produto de um criador. Nós criaturas somos seres imperfeitos. Nada do que a gente faça é uma perfeição. A denúncia tem que ser apurada”, avaliou. Indagado sobre uma possível conversa com Tourinho a respeito das urnas eletrônicas, Magalhães é mais enfático e demonstra uma certa mágoa do presidente do TRE: “Não. Eu não tenho interesse nenhum de conversar com este cidadão”.
Mágoa e perseguição
Magalhães assume a mágoa e fala inclusive em perseguição. “Mas é claro que há mágoa. Eu fui perseguido por ele. Você me pergunta os motivos da perseguição. Digo que não sei. Você deve perguntar isto a ele, porque na época eu cumpri com o meu dever e ele me afastou. Ele abriu um processo contra mim”, explicou o juiz James Magalhães.
“O meu problema é com o desembargador Fernando Tourinho é muito sério. Porque o senhor Ronaldo Lessa disse o que quis de mim e o Tourinho em seguida abre um processo contra mim. Pela decisão de inelegibilidade, quem deveria abrir era o governador e não ele. Ele de ofício deu abertura do processo e ainda achando pouco, ficou dando prazo para o Ronaldo Lessa provar alguma coisa. Isto magoa. Depois o processo foi arquivado porque não se provou nada do que foi levantado”, disse James Magalhães. Entre as declarações forte de Lessa na época está a insinuação de que havia uma espécie de “mensalão” no Poder Judiciário e um “grande corruptor” nunca citado nominalmente por Lessa, mas que o ex-governador sempre deixava implícito como sendo o ex-deputado federal João Lyra.
Magalhães – atualmente – move um processo contra o ex-governador Ronaldo Lessa e disse que ainda pensa em processar o presidente do Tribunal Regional Eleitoral, Fernando Tourinho. “Talvez eu processe os dois. Estou estudando isto com um grupo de advogados para ver o que vamos fazer. Ainda não houve prescrição”, revelou.
“O Estado precisa crescer com paz e tranqüilidade”
Sobre a atual conjuntura política e as crises enfrentadas pelo atual governador Teotonio Viela Filho, como a greve da Educação, James Magalhães faz parte do coro que vê em Alagoas um estado historicamente sacrificado. “Eu espero que o governador, passados estes noventa dias, verifique a situação real do Estado de Alagoas e parta para um rumo de paz e desenvolvimento, com tranqüilidade. O Estado precisa crescer, seja com recursos próprios ou do Governo Federal. O importante é que Alagoas cresça. Não pode é ficar só em greves. Acho que o governador tem que procurar dialogar diante destas polêmicas”.
Magalhães disse achar estranho os problemas financeiros não terem sido detectados com maior precisão antes, por conta da transição amigável entre o atual grupo e a equipe de Ronaldo Lessa. “Houve uma transição e antes não foi verificado nada, só agora que se viu. É preciso consertar isto e tocar o Estado para frente”, destacou. Sobre a Era Lessa – anterior ao governo de Téo Vilela – o juiz é sucinto: “Eu prefiro não analisar. Posso até dar a minha opinião como cidadão”.
Como cidadão, Magalhães diz que foi um dos piores momentos da História de Alagoas. “Tudo que está hoje acontecendo é conseqüência da época do senhor governador Ronaldo Lessa. Se não fosse o passado, nada disto estaria acontecendo. Se não fosse ele, haveria uma continuidade sem problemas”, sentenciou.
“Não posso afirmar uma coisa desta”
Indagado sobre a Justiça alagoana ser isenta, o juiz diz: “Não posso afirmar uma coisa desta. Agora, o judiciário alagoano está passando por uma melhora significativa. Na última década, a melhora é substancial, principalmente por conta da melhor comunicação e informatização. É isto que o povo quer. É você ter uma Justiça rápida que atenda a população”.
Para Magalhães, o que ainda falta no Poder Judiciário é juizes mais vocacionados, que “sintam o calor social e integrem o exercício da profissão ao atendimento ao cidadão alagoano”. “Acredito que a Justiça ainda está distante do povo, mas estamos melhorando muito. Não somos só nós juizes, em toda a profissão há diversos perfis de profissionais, alguns atrapalham. Por isto, só deve seguir a profissão quem tem vocação para o que faz. O profissional com vocação é quem faz a profissão melhorar”, declarou.
Mundo das Letras
“Entrei na Literatura por herança dos meus antepassados, muitos foram poetas, jornalistas, tanto na família da minha mãe, como um pouco na do meu pai. Minha mãe gostava muito de ler e era sábia, muito inteligente. Lembro ainda da forma como ela marcou o meu enxoval, quando entrei no seminário. Todo em letras góticas. De repente, depois da publicação dos anais e do livro, recebi convite para a Academia. Lógico que aceitei. É uma honra”, disse.
Magalhães colocou que os principais projetos futuros é chegar ao Tribunal de Justiça como desembargador e a partir daí lançar pelo menos um livro por ano. O juiz já possui três engatilhados: dois sobre a Justiça Militar e um que é Honrando a Toga, que conta os casos polêmicos e constrangedores do Poder Judiciário. Este último, conforme Magalhães será póstumo. “Nele eu vou contar fatos de bastidores do Judiciário. Então, talvez não o publique enquanto viver, porque vou narrar fatos de pessoas em situação constrangedora”, finalizou o juiz.