As estatísticas oficiais a respeito da homofobia no Brasil convivem com números mascarados pela conivência policial e omissão dos poderes. Uma realidade que entidades promotoras de Direitos Humanos tentam reverter em todo país. Em Alagoas, o mais polêmico dos casos, aguarda por um desfecho há 12 anos.
O assassinato do vereador de Coqueiro Seco, Renildo José dos Santos, tornou-se um clássico da impunidade e violência homossexual no mundo. Executado com requintes de crueldade, após ter sido seqüestrado de sua casa na madrugada de 10 de março de 1993, Renildo teve o corpo encontrado além dos limites de Alagoas, sem impressões digitais, carbonizado e degolado, indicando o ritual de torturas que sofrera antes de morrer.
O vereador teve as orelhas, nariz e língua decepadas, unhas arrancadas e depois cortados os dedos; as pernas quebradas; foi castrado e teve o anus empalado. Foi esquartejado, levou tiros nos dois olhos e ouvidos, teve órgãos retirados do corpo, possivelmente com uma faca-peixeira. Para dificultar o reconhecimento do cadáver, atearam fogo a seu tronco, enterrando o corpo em cova rasa. Sua cabeça foi encontrada boiando no rio Una, próximo a Palmares, e o tronco, no município de Xexéu, ambos em Pernambuco.
A morte de Renildo ganhou destaque nos relatórios na Anistia Internacional, como um dos mais bárbaros crimes homofóbicos registrados no mundo. O vereador virou prêmio de Direitos Humanos, mas os suspeitos de seu assassinato permanecem em liberdade.
Um deles, o ex-prefeito de Coqueiro Seco, José Renato Oliveira e Silva, acusado de ser o mandante da execução, em 2006 completará 73 anos. A idade avançada, poderá influenciar na garantia de benefícios como o direito à prisão domiciliar, assegurado pela legislação processual penal brasileira.
Morte anunciada
O mais grave na história do vereador Renildo José dos Santos é que, antes de ser assassinado, ele documentou a própria morte. Durante quatro anos, foram inúmeras cartas endereçadas às autoridades de segurança pública do Estado, queixas-crimes e denúncias formalizadas pela ONG Fórum Permanente Contra a Violência, comunicando outros dois atentados sofridos pelo parlamentar e ameaças de morte.
O julgamento, adiado por sucessivas vezes, deveria ter ocorrido em maio deste ano, no Fórum Desembargador Jairon Maia Fernandes, em Maceió, mas permanece sem data prevista para ser realizado.
Para o presidente da ABGLT, Marcelo Nascimento, Alagoas ainda tem uma dívida de honra a pagar com suas dezenas de homossexuais violentados e mortos. “ É necessário coragem para enfrentar a discriminação que quase sempre começa dentro da própria casa, quando pais e familiares insultam, agridem e expulsam filhos que se assumem homossexuais”, dispara.
O racismo sexual que motiva os crimes de ódio apóia-se no anonimato das vítimas, por isso as organizações em defesa da comunidade GLBT conclamam o grito e a denúncia como principais armas na luta por respeito e igualdade aos que amam diferente.