Estatuto do Desarmamento é apontado por grupos de defesa dos direitos humanos como um passo positivo no combate à violência, mas uma outra corrente de especialistas no assunto critica a legislação como estratégia para a redução da criminalidade.
Tim Cahill, representante da Anistia Internacional para o Brasil, diz que o projeto de desarmamento é uma medida importante para o país.
"Este é um passo, mas é um pequeno passo que precisa ser feito junto com outras questões", afirma. "Não é suficiente o controle de porte de armas se não se controla o tráfico de armas."
Já o americano John Lott, professor da Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, afirma que o Estatuto do Desarmamento em vigor no Brasil não vai trazer benefícios para a população e, sim, torná-la mais vulnerável.
"O problema do Brasil é o mesmo de muitos outros países.
Quando você faz com que a posse de armas seja extremamente difícil e transforma em ilegal ter sua própria arma, o risco que você corre é se você desarma o cidadão", diz Lott. "Com isso, você pode ver o crescimento da violência em vez da queda."
Polícia
Para Miguel Malo, consultor da Organização Mundial de Saúde (OMS) no Brasil, o desarmamento é fundamental para a diminuição da violência porque ajuda a impedir crimes que envolvem crianças e famílias.
"A proibição do uso de armas por civis não vai funcionar mais do que a antiga legislação estava funcionando", discorda Lott, autor do livro More Guns, Less Crime: Understanding Crime and Gun Control Laws (Mais Armas, Menos Crimes: Entendendo o Crime e as Leis de Controle de Armas).
"Já era ilegal ter armas em vários aspectos no Brasil. Os crimes no Brasil são realizados com armas ilegais. Ao proibir o uso de armas, o que eles vão fazer é tirar as armas da população."
Lott diz que o Brasil só vai conseguir combater a violência com a ação eficaz da polícia. Para isso, afirma, é preciso melhorar salários e fornecer treinamento e equipamento para as forças policiais.
O também americano Jeffrey Miron, professor da Universidade de Boston, reforça o argumento de que menos armas no mercado não são uma garantia de diminuição da violência.
"Proibir armas não significa necessariamente diminuir o número de armas, mas você aumenta o mercado negro. É uma questão empírica", afirma Miron.
Para o acadêmico, outras medidas – como a descriminação das drogas e a reforma do sistema judiciário – poderiam gerar resultados mais efetivos para a redução da violência.
Lobby
O cientista político Paulo Sérgio Pinheiro, da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, defende a proposta de desarmamento da população civil.
"Não há nenhum sentido de particulares terem armas", afirma Pinheiro. O brasileiro lembra que que a comercialização de armas também deveria ter sido proibida, mas a proposta foi derrubada pelo Supremo Tribunal Federal.
O obstáculo, de acordo com Pinheiro, foi o lobby das empresas do setor junto a senadores e a deputados.
Apesar do apoio de Paulo Sérgio Pinheiro, o desarmamento também tem seus críticos dentro do Brasil. O economista Luiz Tadeu Viapiana diz que não adianta proibir a posse de armas sem combater o contrabando.
"Durante os anos 90, houve uma mudança substancial nos padrões da criminalidade, especialmente nos grandes centros urbanos", afirma Viapiana. "A criminalidade passou a estar intimamente ligada ao crescimento das redes de tráfico de drogas, notadamente no Rio de Janeiro e em São Paulo."
"Esse tipo de crime usa armas ilegais, armas de calibres cuja venda não é permitida ao mercado civil brasileiro", acrescenta o economista, autor do livro Brasil Acossado pelo Crime.
"Portanto, qualquer restrição à venda de armas ao mercado civil teria pouco impacto no arsenal que esses marginais possuem", conclui Viapiana.