O primeiro relatório parcial apresentado conjuntamente pelas comissões parlamentares mistas de inquérito (CPMI) dos Correios e da Compra de Votos pede a abertura de processos por quebra de decoro parlamentar de sete deputados federais do PT. A maior parte desses parlamentares é citada por ter recebido dinheiro das contas do empresário Marcos Valério para supostamente pagarem dívidas de campanhas eleitorais.
A quebra dos sigilos bancários do Banco do Brasil e do Banco Rural mostra que o deputado João Magno (MG) teria recebido R$ 126.915,00 em saques efetuados por ele próprio, assessores e parentes dele. O relatório das CPMIs cita ainda a lista fornecida por Marcos Valério pela qual João Magno teria sido beneficiado com R$ 250 mil.
No plenário da Câmara, o parlamentar mineiro disse tratar-se de caixa 2 de sua campanha eleitoral, em 2004, para a prefeitura de Ipatinga (MG). Quanto ao fato de seu nome constar da agenda de Fernanda Karina Somagio, ex-secretária de Marcos Valério, João Magno disse que é cliente da empresa SMP&B. Além disso, argumenta que "nunca recebeu vantagens indevidas no cargo de deputado federal".
Já o ex-presidente da Câmara, João Paulo Cunha (SP), recebeu, por intermédio de sua esposa Márcia Regina, R$ 50 mil sacados em espécie na agência do Banco Rural de Brasília. Segundo o relatório, o parlamentar inicialmente entregou à CPMI ofício informando que sua esposa havia ido ao banco para pagar fatura de serviços de uma TV a cabo.
Em sua defesa, João Paulo Cunha disse que o dinheiro foi usado para pesquisas eleitorais a pedido do coordenador do PT em Osasco (SP), "face a dificuldades financeiras partidárias". Segundo ele, os R$ 50 mil foram utilizados justamente para cobrir esses gastos. "Todo recurso sacado foi investido na execução de quatro pesquisas", afirma o deputado na defesa escrita entregue à CPMI.
O deputado José Mentor (SP) recebeu, por intermédio de seu escritório de advocacia, R$ 120 mil da empresa 2S Participações, que pertence a Marcos Valério. Segundo o relatório, o parlamentar alega que o pagamento foi feito pelo escritório Tolentino, Melo & Associados por conta da elaboração de parececeres jurídicos do escritório do qual é sócio. O relatório destaca que "não foi esclarecido que matéria jurídica teria sido objeto de pareceres".
Os relatores das CPMIs dos Correios, Osmar Serraglio (PMDB-PR), e da Compra de Votos, Ibrahim Abi-Ackel (PP-MG), dão destaque ao depoimento prestado pela ex-secretária da SMP&B, Fernanda Karina. Segundo ela, o deputado José Mentor e o ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares, eram os principais contatos com os dirigentes do Banco Rural. A secretária afirmou que "destruiu 25 pastas com documentos da empresa publicitária SMP&B depois que o deputado José Mentor telefonou a Marcos Valério no período em que corria a CPMI do Banestado". Mentor foi relator desta comissão.
O deputado Josias Gomes (BA) sacou R$ 100 mil na agência do Banco Rural de Brasília. Em sua defesa, Gomes afirma que os recursos foram destinados "a companheiros de partido para que saudassem seus compromissos financeiros assumidos na última campanha eleitoral". Ele disse ainda que "a maior prova" de sua boa-fé foi o fato de ter ido pessoalmente à agência do Banco Rural sacar o dinheiro e deixar cópia de sua identidade parlamentar.
O ex-líder do PT, Paulo Rocha (PA), sacou da agência do Banco Rural de Brasília R$ 420 mil por meio de sua assessora Anita Leocádia Pereira da Costa, como demonstram os documentos em poder da CPMI dos Correios. No depoimento à Polícia Federal, Marcos Valério afirmou que Paulo Rocha teria recebido, em espécie, das contas da empresa SMP&B a quantia de R$ 920 mil, por intermédio dos assessores Anita Leocádia e Charles Santos Dias.
À comissão, o ex-líder confirmou ter recebido dinheiro do esquema montado por Valério e Delúbio Soares. Ele disse, entretanto, que os recursos destinaram-se ao pagamento de dívidas do PT no estado do Pará onde é presidente do Diretório Regional. Na sua defesa, Paulo Rocha disse que R$ 300 mil foram sacados por um emissário do PSB e entregue ao partido.
O ex-líder do governo na Câmara, deputado Professor Luizinho (SP), aparece no relatório como beneficiário de R$ 20 mil sacados por seu assessor José Nilson dos Santos na agência do Banco Rural de São Paulo. "Inicialmente, o deputado negou o fato, aludindo a falsidade de documentos e a homonímia uma vez que supunha tratar-se de saque em agência de Brasília e não em São Paulo", diz o relatório.
Na sua defesa, o parlamentar confirma ter consultado o então tesoureiro do PT, Delúbio Soares, sobre a possibilidade de ajuda financeira para a campanha de vereadores em municípios paulistas. Ele disse ter repassado as informações obtidas desta conversa ao assessor José Nilson. "Em dezembro de 2003 o referido militante entrou em contato com Delúbio por sua própria iniciativa para tratar da ajuda financeira e, seguindo a orientação recebida, retirou da agência do Banco Rural na Avenida Paulista a quantia de R$ 20 mil", afirmou Luizinho à CPMI.
O relatório das CPMIs também cita o ex-ministro da Casa Civil e deputado José Dirceu (SP). A CPI não encontrou nas contas de Marcos Valério indícios contra Dirceu. As citações do relatório referem-se ao depoimento do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) que apontou o ex-ministro como conhecedor do esquema de pagamento de mesadas, pelo PT, a partidos da base aliada em troca de apoio político.