O crescimento acelerado do sistema particular de ensino superior registrado no final da década de 90 e que dá mostras de ter chegado próximo ao limite está levando as instituições a entrar em um processo de readequação de gestão. Os primeiros sinais se traduzem em demissão de professores, reestruturação de programas de pós-graduação, enxugamento dos gastos e até fusões.
Uma das tendências apontadas por consultores especializados em ensino superior é que entre 400 e 500 instituições consideradas pequenas (com menos de 500 alunos) "desapareçam" nos próximos três a quatro anos caso não consigam encontrar um público-alvo e melhorar a administração para atendê-lo. Atualmente, o universo de instituições já chega a cerca de 2.000 no país.
Para o consultor Ryon Braga, da Hoper Educacional, há, por outro lado, a tendência de consolidação dos grandes grupos, com aquisições e fusões. "O que está acontecendo é reflexo da falta de profissionalização do mercado. O amadorismo foi o grande vilão, que levou a um crescimento de vagas acima da demanda", disse.
O próprio Censo da Educação Superior de 2004, último disponível, mostra que a abertura de cursos ainda continua numa média de seis ao dia. Em contrapartida, a demanda cai. Um exemplo é o crescimento da taxa de matrículas do ensino médio, que foi de 11% em 1999 para 0,4% em 2004. Aliado a isso está o esgotamento da camada com condições de pagar o atual valor das mensalidades das instituições, avalia Hoper.
Resultado: as instituições particulares viram em 2004 mais de 40% de suas vagas oferecidas ficarem ociosas. Cerca de 72% dos 4,16 milhões de alunos matriculados no ensino superior no Brasil estão no setor privado.
Má notícia
A má notícia é que, mesmo com esses dados, o país tem apenas 1 em cada 10 jovens de 18 a 24 anos matriculado no ensino superior. Precisa chegar a 3 a cada 10 até 2011 se quiser cumprir o Plano Nacional de Educação.
Segundo Braga, mesmo o Prouni (Programa Universidade para Todos) não significa muito mais dinheiro para as instituições. O programa, lançado pelo governo federal no ano passado, concede bolsas de estudo parciais e integrais a alunos com renda de até três salários mínimos. Já concedeu mais de 112 mil bolsas e tem outras 90 mil para este semestre.
Em contrapartida, as instituições têm isenção fiscal, que no primeiro ano de funcionamento ficou em cerca de R$ 92 milhões.
O aumento da concorrência no setor privado aconteceu a partir de 1995, quando o então ministro da Educação do governo Fernando Henrique Cardoso, Paulo Renato Souza, facilitou o processo de abertura de cursos e novas instituições. O efeito: de 1980 até 1994, o setor privado cresceu apenas 9,7%. De 1994 a 2004, o crescimento aumentou vertiginosamente, para 208%.
"As instituições mais antigas se consolidaram em um mercado em que a competição por alunos praticamente inexistia e não se prepararam para a grande oferta de cursos e instituições oferecendo preços competitivos", diz o presidente do Conselho Nacional de Educação, Edson Nunes.
O consultor Roberto Leal Lobo, ex-reitor da USP, afirma que, por atuarem com um perfil de aluno parecido com o das públicas, instituições como a PUC acabaram copiando a estrutura dessas universidades. O risco nesse processo de readaptação, diz, é essas instituições abrirem mão da qualidade. "As universidades mais tradicionais precisam ser mais eficientes sem deixar de valorizar os professores que realizam pesquisas."
Já Carlos Monteiro, da CM Consultoria, diz existir dentro das próprias instituições pessoas "refratárias" a mudanças, o que dificulta a readequação.
"As mudanças deveriam começar pela atividade-fim, que é o ensino. Mas acabam sendo feitas pelas atividades-meio", diz Monteiro. Cita como exemplo o caso da PUC (Pontifícia Universidade Católica) de São Paulo, que reduziu folha de pagamento e número de funcionários para tentar adequar as receitas. "Ninguém fala em discutir tempo de curso e carga horária dos professores."