Um minuto de silêncio: o cometa 73P/Schwassmann-Wachmann 3 está clinicamente morto. O diagnóstico é unânime entre os muitos astrônomos que o têm observado ao longo dos últimos dias. Causa da morte: despedaçamento. O objeto está se esfarelando conforme aumenta sua aproximação com o Sol, e passará de "raspão" pela Terra neste domingo, no que pode ser até sua última passagem pelas redondezas. Vale a pena tentar vê-lo, ainda que o esforço exija o auxílio de um binóculo ou uma luneta.
Embora despedaçamentos e mortes de cometas já tenham sido vistos antes (caso clássico é o do P/Shoemaker-Levy 9, que se quebrou em pedaços e colidiu com o planeta Júpiter, em 1994), essa é a primeira vez que os cientistas podem acompanhar o processo de perto. No domingo, os pedaços do 73P/Schwassmann-Wachmann 3 passarão a 10 milhões de quilômetros daqui –uma ninharia em termos astronômicos.
A proximidade chegou até a motivar a Nasa, agência espacial americana, a divulgar uma nota, informando que não havia risco de colisão com o planeta -a aproximação máxima equivale a 26 vezes o trajeto Terra-Lua.
A fragmentação do cometa, que dá uma volta ao redor do Sol a cada 5,4 anos, foi detectada pela primeira vez em 1995, quando se viu o objeto se quebrar em quatro. Na observação seguinte, em 2001, o astro passou longe da Terra e só dois pedaços puderam ser vistos.
Agora, o processo de morte lenta do cometa se revela em todo o seu esplendor. "Pelo menos 65 fragmentos já foram observados", diz Cássio Leandro Barbosa, astrônomo da Univap (Universidade do Vale do Paraíba) que participou da sessão nacional de observações do cometa, idealizada por seus colegas Gabriel Hickel e Wilton Dias. Eles usaram o Observatório do Pico dos Dias, instalação do LNA (Laboratório Nacional de Astrofísica) localizada no interior de Minas Gerais.
Os cometas são interessantes porque se trata de objetos surgidos nos primórdios da formação do Sol e seus planetas e, portanto, guardam consigo os segredos desse processo. "A fragmentação pode dar pistas de como ocorreu a aglutinação dos grãos de poeira e gelo primordiais que formaram o núcleo cometário", diz Barbosa. "Imagens e espectros desse material podem também revelar detalhes da constituição química inicial do Sistema Solar."
Para observar o cometa (sobretudo o chamado fragmento C, que é o mais brilhante) nos próximos dias, deve-se olhar para a direção nordeste durante a madrugada. "É necessário estar longe de grandes centros urbanos, em locais escuros. Além disso, é essencial utilizar um pequeno binóculo ou telescópio, pois o cometa terá um brilho fraco, no limiar da visão humana", explica Barbosa, realçando que a observação será facilitada mais perto do dia 20 de maio, quando a Lua não estiver cheia.
Quanto ao futuro do cometa, o astrônomo estima que seus pedaços maiores ainda possam sobreviver a mais uma ou duas voltas ao redor do Sol. "Mas a tendência é que ele vire apenas uma nuvem de poeira, sendo uma futura fonte de chuvas de meteoros", diz.