Os votos anulados pelo eleitor, por vontade própria ou por erro, não se confundem com os votos anulados pela Justiça Eleitoral em decorrência de ilícitos – como falsididade, fraude, coação ou compra de votos. A distinção, feita pelo Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no julgamento de um recurso (Respe 25.937), esclarece as dúvidas sobre a aplicação do artigo 224 do Código Eleitoral (Lei 4.737/65).
O artigo dispõe que, se a nulidade atingir mais da metade dos votos em uma eleição, essa fica prejudicada e, então, nova eleição deve ser convocada dentro do prazo de 20 a 40 dias. Como os votos nulos (dos eleitores) são diferentes dos votos anulados (pela Justiça Eleitoral), as duas categorias não podem ser somadas, e, portanto, uma eleição só será invalidada se tiver mais de 50% de votos anulados somente pela Justiça Eleitoral.
Os fatos que ensejam a anulação de eleição estão previstos no artigo 222 do Código Eleitoral: falsidade; fraude; coação; interferência do poder econômico e desvio ou abuso do poder de autoridade em desfavor da liberdade do voto; emprego de processo de propaganda ou captação de sufrágios vedado por lei.
Recurso
O entendimento do Plenário do TSE foi fixado durante o julgamento de um recurso proveniente do município baiano de Ipecaetá. O prefeito e o vice-prefeito eleitos, respectivamente, Nivaldo dos Reis Nobre e Elcydes Piaggio de Oliveira Júnior, tiveram seus diplomas cassados, pelo juízo de primeira instância, em razão de comprovado abuso do poder econômico, configurado na compra de votos (artigo 41-A da Lei 9.504/97).
Os dois apelaram ao Tribunal Regional da Bahia (TRE-BA), que negou provimento aos recursos e determinou a diplomação dos segundos colocados, pelo fato de os candidatos que tiveram os diplomas cassados não terem obtido mais de 50% dos votos válidos.
Inconformados, recorreram ao TSE, por meio do Recurso Especial Eleitoral (Respe) 25.937. Alegaram, entre outros pontos, a necessidade de realizar-se nova eleição em vez de se proceder à diplomação dos segundos colocados. Argumentaram que a soma dos votos anulados por força do artigo 41-A da Lei 9.504/97 com os votos nulos, por manifestação da vontade do eleitor, seria superior a 50%, fato que justificaria a aplicação do artigo 224 do Código Eleitoral.
Ao analisar o caso, o ministro José Delgado, relator do recurso, explicou que, comprovada a captação ilícita de sufrágio (compra de votos), "anulam-se os votos obtidos pelo candidato que fez uso do expediente irregular e, se no cômputo desses votos atingir mais da metade dos votos válidos, aplica-se o comando do caput [cabeça] do artigo 224 do Código Eleitoral."
O ministro observou que a jurisprudência do TSE consagrou que os votos válidos anulados pela Justiça Eleitoral em decorrência de compra de votos não se incluem no "universo de votos nulos decorrentes de manifestação apolítica do eleitor, seja ela deliberada ou decorrente de erro. Citou, como precedentes, as decisões no Mandado de Segurança 3.387 (agravo regimental), Respe 19.845 e Respe 19.759.
Dessa forma, o ministro considerou correta a solução dada ao caso pelo TRE-BA, que determinou a posse dos segundos colocados nas eleições municipais e, não, a realização de novo pleito, "uma vez que não foram contaminados mais de 50% dos votos válidos". Por essa razão, negou provimento ao recurso, no que foi acompanhado pela maioria do Plenário.