Dos 594 parlamentares que atuam no Congresso Nacional, 179 – 157 deputados e 22 senadores – estão sob investigação ou responderam a denúncias criminais durante a atual legislatura (período 2003/2007). Ou seja, quase um terço dos congressistas foi colocado sob suspeita pelo Ministério Público Federal, pela CPI dos Sanguessugas e por outros órgãos de fiscalização.
Incluindo ex-parlamentares que exerceram o mandato nos últimos anos (cassados, suplentes e aqueles que renunciaram), o número de acusados passa para 196: 172 deputados e 24 senadores. Há apenas 12 mulheres nesse grupo, isto é, somente 6% do total de envolvidos.
Em março de 2004, um levantamento apontou 46 parlamentares processados no Supremo Tribunal Federal.
Um ano depois, após mais de três meses de pesquisa no STF, uma apuração mais ampla demonstrou que 102 deputados e senadores respondiam a inquéritos ou processos criminais na mais alta corte judicial do país.
Hoje, todos os casos podem ser encontrados no portal, mas permanecem bastante restritos os dados divulgados a respeito de cada um deles. Até porque a grande maioria dos processos corre em segredo de justiça.
O que mudou e o que não mudou
O crescimento do número de parlamentares enrolados em acusações criminais decorreu, sobretudo, do envolvimento, de grande número de congressistas nos escândalos do mensalão e, principalmente, dos sanguessugas. Somente a CPI mista do Congresso que examina o assunto já formalizou acusações contra 72 parlamentares.
Eles respondem agora a processos nos Conselhos de Ética da Câmara e do Senado por quebra do decoro parlamentar (crime político). E foram denunciados ao STF, por prática de crimes comuns, pelo Ministério Público Federal, que também ofereceu denúncia contra outros parlamentares poupados pela CPI.
Manteve-se a tendência verificada nos levantamentos anteriores de predomínio de crimes contra a administração pública, como desvio de verbas públicas, peculato (apropriação de bens ou valores por servidor público em função do cargo), improbidade administrativa ou corrupção passiva (recolher ou solicitar vantagem indevida para si ou terceiros). Os demais crimes também se repetem: delitos tributários, formação de quadrilha, crimes eleitorais e lavagem de dinheiro estão entre os de maior incidência.
Outra constatação possível, quando se comparam os levantamentos, diz respeito à velocidade na tramitação dos processos. Em abril de 2005, havia 198 inquéritos em andamento no Supremo contra parlamentares. De lá para cá, apenas 36 tiveram as denúncias acatadas e foram transformados em processos de ação penal.
Das ações penais, cinco foram arquivadas por prescrição e três foram encerradas após a renúncia dos deputados investigados. Além disso, 48 denúncias foram arquivadas, acatando parecer da Procuradoria Geral da República. Com isso, 15 deputados e sete senadores foram inocentados e já não têm mais pendências com a Justiça. Nenhuma condenação ocorreu até o momento.
Como é da tradição institucional brasileira e de vários outros países, os parlamentares têm direito a foro privilegiado. Só podem ser julgados pelo STF. Para os juristas, contudo, o instrumento – criado com o objetivo de garantir o exercício democrático das prerrogativas inerentes à função parlamentar – terminou tendo o seu uso desvirtuado, contribuindo para a impunidade de maus políticos.
De acordo com a ordem constitucional e legal em vigor no Brasil, o parlamentar também não pode ser punido por exercer sua liberdade de opinião e expressão e só pode ser preso em flagrante de crime inafiançável. Mesmo assim, os autos precisam ser enviados em 24 horas ao Congresso, a quem cabe decidir, pelo voto da maioria de seus integrantes, sobre a manutenção da prisão.
Houve um período em que as regalias oferecidas aos parlamentares eram ainda maiores. Até a promulgação da Emenda Constitucional 35, em dezembro de 2001, o STF precisava pedir autorização à Câmara e ao Senado para abrir processo contra os congressistas.
Os campeões de ações
Os casos em andamento no Supremo dividem-se em três categorias: petições; inquéritos, que são processos criados para investigar preliminarmente denúncias; e as ações penais, que resultam dos inquéritos.
O campeão de ações penais é o deputado Jackson Barreto (PTB-SE). O parlamentar responde a quatro processos de crime contra a administração pública, envolvendo peculato e desvio de verbas. O ex-deputado Ronivon Santiago, que também respondia a quatro processos de crime eleitoral, foi cassado em dezembro.
O corregedor da Câmara, deputado Ciro Nogueira (PP-PI), os deputados Jader Barbalho (PMDB-PA) e Giacobo (PL-PR) e os senadores Leonel Pavan (PSDB-SC) e Valdir Raupp (PMDB-RO) respondem, cada um, a duas ações penais. Quando se trata de total de inquéritos, destacam-se os deputados José Janene (PP-PR), que há mais de um ano está para ser julgado por acusação de envolvimento com o mensalão; Tatico (PTB-DF); e, de novo, Jader. Janene responde a seis inquéritos no STF. Tatico, a cinco. Jader, a quatro.
O único parlamentar que optou por fazer um acordo com a Justiça para limpar o nome foi Eduardo Gomes (PSDB-TO). O deputado foi autuado em outubro de 2004 por crime eleitoral, após a constatação da omissão de documentos. Segundo ele, a denúncia foi fruto de uma armação de adversários políticos. "Ao se comprovar isso, o STF propôs o acordo", relata. Para encerrar o assunto e conseguir o nada consta em seu nome, Eduardo Gomes pagou uma multa de R$ 1 mil e se comprometeu a dar sete palestras gratuitas em escolas públicas.
O deputado também foi citado no relatório parcial da CPI dos Sanguessugas, mas não teve seu nome enviado para o Conselho de Ética da Câmara. "Fui citado em uma gravação telefônica de um dos sócios da Planam, mas só estava cobrando uma doação prometida para meu estado. Nunca apresentei emendas referentes à compra de ambulâncias e o próprio Luiz Antonio Vedoin me inocentou em seu depoimento", afirma Eduardo Gomes.
Essa foi a mesma explicação dada por outro deputado, José Militão (PTB-MG), também citado nas conversas telefônicas de Darci Vedoin, um dos sócios da Planam, gravadas pela Polícia Federal.