A Fazenda Santa Adelaide, a cerca de 100 km da capital paulista, segundo o Le Monde, é uma gota orgânica em um oceano de plantações regadas a pesticidas e transgênicos. O jornal destaca estatísticas recentes que apontam que 31% das frutas e legumes comercializadas no Estado de São Paulo estão contaminados por pesticidas, chegando a 90% do caso dos pimentões. Já nas lavouras industriais de soja – um dos motores do crescimento do PIB na última década – 94,2% das sementes são do tipo transgênico.
“Mas o Brasil, que optou pela agricultura intensiva e autorizou os transgênicos em 2003, parece estar se dando conta aos poucos dos malefícios dessa escolha”, diz a repórter Claire Gatinois. “Na época, a cultura dos transgênicos e dos pesticidas era vista como o futuro”, explica ao jornal Cassio Trovato, funcionário do Ministério do Desenvolvimento Agrário, em Brasília.
Apesar dos números alarmantes de produtos químicos, “as autoridades não fazem nada ou fazem muito pouco”, segundo o jornal, que destaca o fato de que nenhuma multa foi aplicada desde 2002. O Monde também cita entrevista do engenheiro agrônomo Marco Antonio Moraes à Folha de S. Paulo em que ele diz que “a repressão não dá resultados e é aleatória, é quase uma ficção”. Segundo o jornal francês, dizer que “o tempero preferido dos brasileiros são os pesticidas” vidou uma piada comum no país.
Rainha do Agrobusiness
Outra fonte ouvida pelo jornal francês é Josiana Aripol, da ONG Ética da Terra, que avalia que “os brasileiros estão se envenenando” e para quem a progressão dos casos de câncer está ligada ao uso desmoderado de pesticidas. A aposta na agricultura industrial ao longo dos últimos 15 anos elevou o Brasil ao posto de maior importador e maior consumidor de pesticidas do mundo.
Segundo o Le Monde, a postura do governo brasileiro diante desse problema de saúde pública é “esquizofrênica”. “Em Brasília cohabitam uma ministra da Agricultura, Katia Abreu, chamada de ‘Rainha do Agrobusiness’, e um ministro do desenvolvimento agrário ligado aos pequenos produtores”.
Mas nem tudo são trevas: o jornal francês destaca a política que obriga escolas públicas e universidades a utilizar 30% de alimentos da agricultura familiar em suas cantinas. “O Brasil é a fazenda do mundo, com clima e terra extremamente propícios para a cultura. Nós devemos nos tornar o maior produtor de alimentos saudáveis do planeta”, afirma ao jornal o especialista em pesticidas Cleber Folgado.