Pelo prejuízo de R$ 15.744.846,31 causado ao erário estadual e aos serviços de educação, o Ministério Público do Estado de Alagoas (MPE/AL) ajuizou, na sexta-feira (21), uma ação civil pública por ato de improbidade administrativa, com pedido de liminar, em desfavor do ex-governador do Estado, Teotônio Brandão Vilela Filho, e dos ex-titulares da Secretaria Estadual da Educação e do Esporte (SEE/AL), Adriano Soares da Costa e Josicleide Maria Pereira de Souza. A 19ª Promotoria de Justiça da Capital e o Núcleo de Defesa do Patrimônio Público estão à frente do procedimento.
Também são alvos da ação as empresas ABR Engenharia Ltda., Somma Quality Construções Ltda., CRC Engenharia Ltda. e Construtora Confiança Ltda., com seus respectivos sócios administradores José Abelardo Bulhões da Rocha, Gabriela Mota Gama, Carlos André de Mendonça Melo e Ricardo Edmundo Cintra Ezequiel. O MPE/AL responsabilizou ainda o então coordenador especial da Infraestrutura da SEE/AL, Aluísio Aragão dos Anjos Sobrinho, que foi gestor dos contratos firmados com as construtoras à época.
A ação do órgão ministerial teve como referência um relatório elaborado pela Controladoria Geral da União em Alagoas (CGU/AL), que descreveu a situação de cinco unidades de ensino da rede pública estadual, após inspeção no período de 19 de maio de 2014 a 08 de abril de 2015. Tratam-se das escolas Dr. Júlio Auto, Padre Francisco Correia, Dom Constantino Lüers, Rosalvo Lobo e Cyro Accioly, sendo esta destinada a estudantes cegos. Na ocasião, a CGU/AL apurou o conjunto de obras de reformas realizadas nos prédios em destaque com base no Decreto Estadual nº 15.845/11, que estabeleceu administrativa na SEE/AL.
Segundo a promotora de Justiça Cecília Carnaúba, o valor do dano causado ao erário quantificado neste primeiro levantamento corresponde a R$ 15.744.846,31, que é o resultado da soma dos valores efetivamente pagos às empresas contratadas para fiscalização e reforma das escolas inspecionadas pela Controladoria Geral da União. No montante, estão inclusos os valores que resultam de prejuízos ocasionados por superfaturamento na aquisição de bens, por falhas na prestação dos serviços avençados e inexecução de diversas obras, já comprovados pelo órgão federal.
“Os réus são agentes diretamente responsáveis pelos atos de improbidade a seguir discriminados, uns em função do cargo público que exerciam e outros em decorrência da condição de eventuais contratantes com a Administração Pública, razão pela qual devem responder civil e administrativamente por suas condutas ímprobas”, explica a titular da 19ª Promotoria de Justiça da Capital, que atua em assuntos relacionados à Fazenda Estadual, em especial, na área de educação.
Denúncia motivou investigação
A investigação da Controladoria Geral da União foi motivada por denúncia do Sindicato dos Trabalhadores da Educação em Alagoas (SINTEAL). A entidade classista noticiou situações irregulares a respeito do comprometimento da estrutura física das escolas estaduais da capital e do interior, ocasionando riscos à integridade da comunidade escolar e até mesmo acidentes. Além disso, o trabalho da CGU/AL examinou atrasos na execução das obras de reformas, com sucessivas prorrogações de prazos e consequentes atrasos e perdas nos anos letivos, o que acarretou na redução de estudantes matriculados.
O trabalho empreendido pela CGU/AL pautou-se em três focos: identificação de irregularidades na execução de obras de reforma em escolas estaduais; verificação da aplicação dos recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) em tais obras; e responsabilidade da SEE/AL quanto à manutenção periódica das unidades escolares fiscalizadas. O órgão federal também avaliou o resultado das atividades que deveriam ser prestadas pela ABR Engenharia Ltda., responsável pela supervisão das obras de reforma executadas pelas demais empresas. O resultado do trabalho foi entregue ao MPE/AL, que instaurou o procedimento administrativo nº 106/2015.
Na constatação de dano ao erário e atentado a princípios da administração pública, o MPE/AL considerou a indevida dispensa do necessário processo licitatório para contratação de empresas com o objetivo de realizar obras de reformas nas escolas e ausência de manutenção periódica, fiscalização e monitoramento destes trabalhos nas unidades de ensino. Foram verificadas ainda falhas na execução do objeto contratual, serviços não efetuados e materiais não fornecidos, além do descumprimento do dever de continuidade da prestação do serviço de educação causado pelo Governo do Estado de Alagoas.
Liminar
No pedido de liminar, o Ministério Público solicita que o Poder Judiciário do Estado de Alagoas determine a quebra dos sigilos bancários e fiscais dos réus e a indisponibilidade dos bens deles até o montante que some o valor total do prejuízo ao erário, além da cifra correspondente à possível multa civil, que deverá ser imposta judicialmente ao final do processo. Os réus também deverão ser proibidos de receber recursos públicos, contratar com o poder público e receber benefícios ou incentivos fiscais e creditícios.
“Considerando que já há comprovação de efetivo dano ao erário decorrente de superfaturamento no valor de R$ 1.115.534,58, que se determine a realização de perícia nas demais escolas objeto dos lotes correspondentes às empresas contratadas e referidas nestes autos, para que se possa aferir o real dano causado ao erário pela prática de superfaturamento e outras ilegalidades”, pediu a promotora de Justiça Cecília Carnaúba.
A representante do MPE/AL sugeriu que a empresa Serviços de Engenharia do Estado de Alagoas S/A realize a prestação de tais serviços e que, caso haja custos, eles sejam suportados pelos demandados.
Condenação
Junto ao Núcleo de Defesa do Patrimônio Público, a 19ª Promotoria de Justiça da Capital também pede a condenação de todos os réus ao ressarcimento do erário estadual, no valor de R$ 15.744.846,31, acrescido de juros, inclusive os moratórios, em proporção a ser fixada pelo Poder Judiciário.
Para o MPE/AL, a penalidade deve ser aplicada proporcionalmente a cada um dos réus, em medida a ser definida pelo magistrado responsável, com base no grau de culpabilidade dos demandados. Eles deverão ainda ser condenados ao pagamento de multa civil de duas vezes o valor do dano causado, a ser identificado em fase de liquidação de sentença, segundo a mesma lógica de proporcionalidade.
A fim de evitar desvio de finalidade e confusão patrimonial, o MPE/AL pede que seja determinada a desconsideração da personalidade jurídica das empresas ora demandadas, de sorte que a determinação para a reparação do dano causado e pagamento da multa civil também incidam, tanto quanto forem os valores necessários, subsidiariamente, sobre os bens dos sócios e administradores respectivos.
Tal como no pedido de liminar, as empresas acusadas deverão ficar proibidas de contratar com o poder público e receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócios majoritários.
Com base na Lei nº 8.429/92, o Ministério Público do Estado de Alagoas requer a perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos por, no mínimo, cinco anos dos denunciados Teotônio Brandão Vilela Filho, Adriano Soares da Costa, Josicleide Maria Pereira de Souza, José Abelardo Bulhões da Rocha, Gabriela Mota Gama, Carlos André de Mendonça Melo e Ricardo Edmundo Cintra Ezequiel.
Por fim, o MPE/AL pede que se declare ilegal os contratos firmados entre o Estado de Alagoas, por meio da Secretaria de Estado da Educação e do Esporte com as empresas denunciadas.
Alunos fora da sala de aula
O Ministério Público do Estado de Alagoas realizou inspeção em 102 escolas da rede estadual de ensino, localizadas na Capital, e identificou diversas ilegalidades que impediram o funcionamento minimamente adequado dessas unidades durante o ano letivo de 2012 e caracterizam interrupção da prestação do serviço de educação estadual no referido ano letivo. Nesse estudo, ficou demonstrado que aquele ano letivo foi perdido e causou um dano excessivo aos cofres do Poder Executivo, tendo prejudicado mais de 70 mil estudantes em cerca de 86% das escolas localizadas na capital.
A promotora Cecília Carnaúba também afirmou que 6% das escolas públicas da rede estadual na capital não ofertaram aulas em 2012, mesmo com os professores recebendo salários normalmente. “Os estudantes simplesmente ficaram em casa ou na rua sem poder frequentar a escola. Essa realidade ocorreu em sete unidades de ensino em Maceió. Tentamos descobrir o porquê dos colégios estarem fechados e, durante todo o ano, não conseguimos contato com os diretores. Ou as escolas estavam fechadas para reforma ou simplesmente ninguém aparecia”, informou.
O estudo mostrou que 82% das escolas começaram o ano letivo com atraso, sendo que, no primeiro semestre, 37% delas sequer abriram as portas. Mais da metade, 51%, não ofertou a grade curricular completa, com matérias como português e matemática. “Houve unidades que não tinham professores de seis disciplinas de uma só vez. Diante de um quadro como esse, não existia mesmo nenhuma possibilidade para o aluno concluir o ano letivo dentro do prazo normal. Aproximadamente 61 mil estudantes foram prejudicados por conta do atraso no calendário escolar”, destacou Cecília Carnaúba.
“Concluímos, portanto, que apenas 13,72% das escolas funcionaram de forma regular durante o ano de 2012. Os outros 86,27% não conseguiram prestar um bom serviço, dentro dos limites mínimos de qualidade instituídos pela Lei de Diretrizes de Base. Isso significa dizer que mais de 70 mil alunos, cerca de 86% do universo de estudantes, infelizmente, não conseguiram estudar de forma satisfatória”, lamentou a promotora titular da 19ª Promotoria de Justiça da Capital.