Em um livro de memórias sobre sua carreira como jogador de futebol americano, Nate Jackson, que foi um “tight end” do Denver Broncos por seis temporadas, relembra qual era o maior desafio que enfrentava: basicamente, conseguir ficar um dia sem sentir dores. Para ele, o corpo humano nunca vai estar preparado para assimilares os rigores físicos da modalidade. “Não há um modo seguro para ser acertado por um caminhão”, ele resume em entrevista ao jornal “The Guardian”. “Você está sempre batalhando contra alguma dor.”
Um estudo de 2011 feito por pesquisadores da Washington University aponta que a probabilidade de ex-jogadores da NFL usarem analgésicos é quatro vezes maior do que o cidadão comum. Além disso, mais de sete em cada dez jogadores que usaram esse tipo de remédio durante a carreira passou a consumi-los em excesso.
Em sua publicação, Jackson, então, levanta uma questão que causa polêmica nos Estados Unidos, seja em público ou nos bastidores. Como lidar com tantas lesões? Qual a melhor forma de medicar os jogadores? Ele pensa que a solução seria a liberação da maconha medicinal para o tratamento dos atletas.
“Sinto que posso comentar sobre isso porque já testei de tudo. Eu tomei hormônio de crescimento, injeções, tentei as pítulos, tentei maconha. Não sou muito fã de maconha, mas ela realmente era a que mais ajudava meu corpo”, afirmou.
Hoje, a maconha consta na lista de substâncias proibidas, que configuram doping para a NFL, independentemente da intenção do uso, medicinal ou não. Mas, segundo Jackson, os jogadores são examinados apenas uma vez durante a pré-temporada. “Se você passar por esse teste, você pode se medicar com maconha o ano inteiro”, disse.
Em sua estimativa e de outros atletas, pelo menos metade da liga já usa a cannabis para se medicar. A discussão vira, então, a seguinte: estariam os jogadores usando as lesões como pretexto para poder comprar maconha legalmente? “Não é que eu fumava e achava que ia arrassar na cidade. Era mais porque queria fumar um pouco e desmaiar no sofá, por estar me sentindo um lixo depois do treino”, defendeu o ex-jogador Chris Kluwe, em documentário da HBO.
Hoje, Jackson faz parte de um grupo chamado Coalizão Gridiron Cannabis, com ex-jogadores que compartilham suas experiências com o uso da maconha medicinal e agora fazem lobby para que ela seja permitida pela NFL. Ou que, pelo menos, a liga ajude a financiar uma pesquisa para se identificar os reais benefícios do tratamento para a recuperação de atletas. Um professor emérito de Harvard, Lester Grinspoon, entrou na causa e mandou uma carta aberta ao comissário Roger Goodell a respeito.
No ano passado, 1.300 jogadores aposentados entraram com uma ação contra a liga alegando que os médicos das equipes os forçavam ilegalmente a tomar analgésicos, causando danos de longo prazo a sua saúde.
Em janeiro de 2014, ao falar sobre a eventualidade do uso de maconha medicinal, Goodell afirmou que “se os médicos determinassem que a utilização poderia ser apropriada, então consideraremos o assunto”. “Mas nossos médicos especialistas não estão dizendo isso agora”, assinalou.
“Os jogadores precisam de medicação, goste ou não, para voltar ao campo a toda semana. A maconha já está ajudando o jogo a sobreviver. A metade desses caras já a estão usando semanalmente. É que eles só precisam manter isso em segredo”, disse Jackson.