Você já comeu rápido fugindo de críticas quanto à qualidade do que ingere e a velocidade com que o faz? Ou sentiu necessidade de comer com mais frequência, pois a falta de comida criou um vazio emocional? E a sensação de culpa chegou após um episódio de descontrole diante de uma panela de brigadeiro?
Em busca de aliviar situações que causam sentimentos negativos ou muito positivos, cada vez mais pessoas têm se tornado vítimas do chamado transtorno da compulsão alimentar periódica (TCAP). Uma doença que pode evoluir para quadros graves de saúde, se não for tratada corretamente.
De acordo com a psicóloga da Secretaria de Estado da Saúde (Sesau), Alzira Moraes, o transtorno da compulsão alimentar periódica é caracterizado pela ingestão, em um período limitado de tempo, de uma quantidade de alimentos definitivamente maior do que a maioria das pessoas consumiria num período similar, sob circunstância de perda de controle sobre o quê ou o quanto se come.
“Elas comem para preencher algum vazio. As mudanças emocionais desses indivíduos são como um gatilho, pois tudo que acontece na esfera psicológica é uma justificativa para comer”, explicou Alzira Moraes.
O principal diagnóstico diferencial a ser feito é com a bulimia nervosa. A compulsão alimentar ocorre em ambos os casos, embora as bulímicas sejam ainda mais preocupadas com o peso e, em geral, o mantém dentro dos limites da normalidade.
Bulímicas tendem a compensar o excesso alimentar imediatamente após o episódio, com métodos purgativos, especialmente vômitos, laxantes e diuréticos. Com isso, os episódios de bulímicas costumam ser mais facilmente identificados, pois geralmente são marcados pela purgação. Pacientes com TCAP até podem fazer uso de métodos purgativos, mas não costumam fazê-lo com tanta frequência e regularidade.
“Para quem sofre de TCAP, comer escondido é uma válvula de escape para fugir dos julgamentos dos outros e da própria pessoa”, disse Moraes, explicando que o transtorno compulsivo não pode ser confundido com um estado de sonambulismo, em que a pessoa come de madrugada, mas não se recorda de ter o feito.
Outro sinal de alerta é a depressão atípica que, em geral, envolve hiperfagia (aumento anormal do apetite ou ingestão excessiva de alimento) e ganho de peso.
Episódios de TCAP são caracterizados por ambos os seguintes critérios: comer muito e mais rapidamente do que o normal; comer até sentir-se incomodado; comer grandes quantidades de alimentos quando não está fisicamente faminto; comer sozinho por embaraço, devido à quantidade de alimentos que consome e sentir repulsa por si mesmo, depressão ou demasiada culpa após comer excessivamente.
Portanto, é necessário que a compulsão alimentar se dê em um período de tempo delimitado, o que exclui, por exemplo, indivíduos que “beliscam” o dia todo, pequenas quantidades de alimento.
É importante deixar claro que nem todo obeso sofre de transtorno compulsivo alimentar. “Há pessoas obesas que, por conta dos transtornos da glândula tireoide, podem aumentar o volume corporal”, explicou Lúcia Maria, nutricionista da Sesau.
Mas fica o alerta: qualquer indivíduo obeso ou acima do peso que come mais do que às suas necessidades diárias e não prática atividade física para queima do alimento ingerido irá desenvolver, em pouco tempo, uma obesidade acentuada, além de doenças cardiovasculares, diabetes, hipertensão, problemas articulares e colesterol alto.
Nesse caso, atividade física pode ser uma aliada importante no combate ao TCAP. Além de seus efeitos no corpo – como controle de peso e evolução no quadro clínico de diversas doenças -, a prática regular de atividade física possui benefícios psicossociais e contribui para a diminuição do estresse, melhora do humor, aumento da autoestima e da sensação de bem-estar.
“A prática esportiva evita inúmeras doenças e, consequentemente, diminui a quantidade de alimento que o compulsivo alimentar ingere diariamente. Assim, as energias dele são direcionadas para outras atividades”, avaliou a nutricionista.
Lúcia Maria enfatiza, ainda, que o transtorno compulsivo alimentar é uma configuração hereditária, cultural e hormonal. “Numa família onde os pais são obesos e as comidas gordurosas são uma constante, a criança estará condicionada à obesidade infantil”.
E a nutricionista vai além na discussão. “Vivemos numa sociedade que, quanto maior às porções, quanto mais salgado ou mais doce for o alimento, melhor. E pensar dessa forma é errado”, diz Lúcia Maria, que recomenda aos pais diálogo e hábitos saudáveis para diminuir riscos de TCAPs.
“O cérebro de pessoas com desordem alimentar compulsória não recebe mais o comando de que está saciado. O estômago desses indivíduos está muito dilatado. É como se fosse um poço sem fundo.”