Nem na comunidade que leva o nome da presidente Dilma Rousseff há consenso sobre o impeachment, que ganha neste domingo um dos principais capítulos: a votação na Câmara dos Deputados, que vai aprovar ou não a abertura do processo de impedimento. Às margens da Estrada Rio-São Paulo, em Campo Grande, na Zona Oeste do Rio, a pequena favela, que reúne cerca de 250 famílias, está dividida.
Presidente da associação de moradores, o pastor Vagner Gonzaga dos Santos, de 38 anos, é contra o impeachment e tem fé que a presidente não sairá derrotada hoje.
— O país está enfrentando problemas, mas não foi comandado só pela Dilma. Sempre houve corrupção. Eu passei os oito anos do governo Fernando Henrique Cardoso desempregado. Havia programas sociais, mas eles não chegavam às comunidades – afirmou Vagner, que hoje trabalha como pedreiro autônomo.
Em julho do ano passado, insatisfeita com a crise econômica, a comunidade havia decidido mudar de nome. Mas voltou atrás na decisão, segundo Vagner, para dar apoio à presidente Dilma nesse momento difícil.
— A comunidade está abandonada, mas se nós chegamos até aqui, foi por causa da Dilma. A gente começou a ser visto. Agora, começamos a brigar pela energia elétrica. A gente acredita que o projeto Luz para Todos vai chegar aqui.
Para as casas da comunidade – feitas basicamente de tijolo e telha de amianto e, em geral, com três ou quatro cômodos – terem luz, os moradores puxam energia da rede pública, que passa pela estrada. Hoje, o que a favela mais precisa é de energia elétrica e de uma creche, diz o pastor.
— As crianças vão à creche, mas é meio distante. A mais próxima, no Bairro 32, em Nova Iguaçu, fica a uns cinco quilômetros daqui. Elas vão a pé.
Ao contrário do pastor e de outros moradores da comunidade, a vendedora ambulante Priscila Michele Rodrigues, de 24 anos, é a favor do impeachment. E é objetiva ao justificar:
— Eu quero que ela saia porque o país está muito em crise. As coisas estão muito caras. Os preços da fralda, do leite, do arroz, do feijão, do óleo… está tudo um absurdo. O óleo mais barato é R$ 4.
A reclamação é de uma jovem com dois filhos pequenos e que já espera o terceiro. Vendendo água, balas e amendoim na estrada, Priscila e o marido, que exerce a mesma atividade, conseguem, por mês, de R$ 300 a R$ 400. A renda que só dá, basicamente, para a alimentação das filhas Graciany, de 5 anos, e Arian, de 1 ano e sete meses.
Grávida de oito meses, Priscila ainda terá mais uma boca para alimentar. A jovem ainda não sabe se o bebê é menino ou menina. Ela conta que já tentou várias vezes se cadastrar para receber o Bolsa Família, mas até hoje não conseguiu porque é sempre informada que “a fila está muito grande”, com muitas pessoas que também estão à espera do benefício.
— Eu acho que as coisas vão melhorar se não entrar alguém mais corrupto do que ela. Mas eu não queria que fosse o Temer porque ele é do mesmo grupo. Não vai mudar. Acho que a melhor opção seriam novas eleições. O povo está sofrendo. Eu seria a primeira a ir votar — disse Priscila, que estudou até o quinto ano do Ensino Fundamental e tinha voltado à escola, mas teve que parar por conta da gravidez.
Há, ainda, os moradores que se dizem neutros sobre o impeachment, como o casal Marisa de Lima, de 62 anos, e Aureliano de Lima, de 66. Há três meses na comunidade, os dois vivem com dois dos sete netos, que ficaram órfãos após a morte da filha, em 2007. A pensionista e o açougueiro aposentado sustentam as crianças Iolanda, de 9 anos, e Denilson, de 11, com dois salários mínimos, além de uma Bolsa Família de R$ 180, que recebem há cinco anos. Confira, no vídeo, os argumentos do casal para não serem contra e nem a favor impeachment:
Vagner conta que a comunidade não vai fazer campanha hoje, nem a favor e nem contra o impeachment. Apesar da sua convicção de que Dilma deve continuar no poder, o presidente da associação de moradores diz que todos na comunidade são lives para adotarem a postura que quiserem. Mas faz questão de sustentar a sua defesa pela presidente homenageada e pelo antecessor, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva:
— Essa insatisfação do colarinho branco é porque eles não aceitam muito bem o salário mínimo chegar a mil reais, o filho do pobre fazer faculdade… Houve roubo? Houve. Mas o Lula roubou para beneficiar o país. O país cresceu. Me mostre o quanto o país cresceu com Lula e o quanto cresceu no governo FHC. Esse agravante todo agora é porque a oposição tem medo de o Lula vir para a presidência. Eles sabem que o pobre vai votar nele de novo.